Crónicas do Brasil | 30-03-2023 16:35

Um governo acossado

Vinicius Todeschini

Moro não saiu de um emprego estável por algum tipo de ideal e a sua própria ascensão ao cargo público, de juiz federal, é nebulosa. O seu ensaio para tentar a presidência acabou em nada, mas ele se elegeu senador e a sua voz de pato, que foi, especialmente, treinada para o seu ressurgimento como candidato à presidência não durou muito tempo e ele voltou a falar como sempre falou; com dificuldades na articulação e o indefectível som de “taquara rachada”.

O governo liderado pelo presidente Lula está cercado de inimigos por todos os lados, inclusive pelo lado de dentro. O Brasil mudou rapidamente, ou melhor: assumiu às suas faces recalcadas e não há mais pruridos, nem limites. O acesso às informações, com possibilidades infinitas de criação de fake news e mecanismos de disparos para divulgá-las, fez com que novos protagonistas surgissem e neste segmento não há regras, nem respeito. A falta de formação do povo brasileiro, de uma certa forma, estimulou a criação de estilos de música e de danças originais, fruto de uma mistura racial e social singular que deu ao mundo grandes artistas e talentos inumeráveis, mas agora o sonho de integração racial e da utopia tropical, imaginada por Darcy Ribeiro e tantos outros sonhadores, acabou. Diante da realidade assombrosa e assustadora que vivenciamos, onde a miséria difusa de um terço da população não causa mais comoção social e as gentrificações constantes da especulação imobiliária avançam sobre bairros populares bem localizados e expulsam os moradores empobrecidos para periferias distantes, onde desaparecerão do cenário idealizado pelo projeto estético neoliberal- tudo que restou foi a indiferença.

O presidente enfrenta a reação dos lava jatistas, agora incrustrados no Congresso Nacional, tendo à frente o ex-juiz Sergio Moro e o ex-procurador Deltan Dallagnol. A Lava Jato criou uma narrativa (palavra da moda) mitológica de como fazer justiça no país, que funcionou até a Vaza Jato mostrar o seu funcionamento real, mesmo que existissem alertas de vários juristas sobre os abusos e desvios da referida operação. Enfim, os meandros desse espetáculo mediático foram revelados e o que se viu foi uma quebra total de qualquer decoro e formalidade legal. Em 2022, os dois foram eleitos pelo Paraná, seu estado sede, como senador e deputado federal, respectivamente, confirmando o grande espaço político que conquistaram nesta região. Para os graves problemas do país, no entanto, não existem soluções maniqueístas e nada mudará para melhor dessa forma, mas milhões de pessoas continuam seguindo os novos messias da política. O senso crítico não existe neste nível, o que importa é o delírio.

Na semana passada esses senhores colocaram em prática um projeto para criminalizar o presidente e o seu partido ligando-os ao crime organizado e, como de praxe, sem provas. Moro não saiu de um emprego estável por algum tipo de ideal e a sua própria ascensão ao cargo público, de juiz federal, é nebulosa. O seu ensaio para tentar a presidência acabou em nada, mas ele se elegeu senador e a sua voz de pato, que foi, especialmente, treinada para o seu ressurgimento como candidato à presidência não durou muito tempo e ele voltou a falar como sempre falou; com dificuldades na articulação e o indefectível som de “taquara rachada”, que remonta ao quém, quém de um pato. As mensagens hackeadas e divulgadas pelo The Intercepte Brasil não deixaram nenhuma dúvida sobre o objetivo do grupo de procuradores federais que se intitulavam, “Filhos de Januário”, do qual o ex-procurador Deltan fazia parte: destruir a carreira política do presidente Lula e do PT e aliados. O uso da máquina pública em um projeto político não é novidade, mas uma articulação desse porte, entre juízes e procuradores federais de uma mesma comarca, nunca havia acontecido antes ou, pelo menos, que tenha sido descoberto e divulgado.

O projeto neoliberal no Brasil é segregar os mais pobres e erradicar a fome não encanta mais as classes intermediárias, que eram a base do PT e dos seus aliados e, também, por isso o novo governo precisa acordar para o fato que nada será como antes. O Congresso Nacional é governado pela Direita mais fisiológica dos últimos tempos e aumentou o seu poder de tal forma, que o seu presidente, um arremedo de coronel nordestino e político da Velha República, Arthur Lira (PP), manda e desmanda no país, criando uma espécie de parlamentarismo à brasileira. Setores dentro dos Órgãos de Estado, como o Judiciário e a Polícia Federal, que estão contaminados ideologicamente, atuam de forma tendenciosa quando surgem oportunidades, confundindo ainda mais o grave cenário nacional. O inquérito da Polícia Federal, pelo delegado Martin Pupper, e o manejo do caso pela juíza federal, Gabriela Hardt, aliada de Sergio Moro, sobre o suposto plano do PCC (Primeiro Comando da Capital) para eliminar o senador, reforça a sensação de tendenciosidade e de guerra permanente dentro desses Órgãos Federais. A Grande Mídia, por sua vez, voltou a apostar abertamente no ex-juiz, dando amplo espaço para ele espalhar a sua versão.

O advogado Rodrigo Tacla Duran voltou a acusar Sergio Moro e Deltan Dallagnol de venderem sentenças, nos tempos da Lava Jato, e implicou o advogado Carlos Zucolotto Júnior -sócio de Rosângela Moro- e o cabo eleitoral do senador, Fábio Aguayo. Ele entregou fotos e gravações, supostamente comprometedoras, na segunda feira, 27 de março de 2023, que foram preservadas sob sigilo (nível 4) a pedido do Ministério Público. Suas declarações foram feitas ao juiz federal da 13º Vara Federal de Curitiba (PR), Eduardo Appio. Pela prerrogativa de fórum privilegiado, de Moro e Deltan o juiz encaminhou o caso ao colega Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal. Águas turbulentas é tudo que pode esperar o presidente Lula e os seus argonautas nos próximos quatro anos, mas navegar é preciso. E governar?

Vinicius Todeschini 30-03-2023

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