Crónicas do Brasil | 29-04-2023 09:56

CPMI do Golpe nos tempos da Pós-Verdade

Vinicius Todeschini

A Era de grandes autores, de grandes intelectuais e de grandes compositores, enfim de tudo que representasse um paradigma para se guiar e, praticamente, impossível de nivelar acabou. A maioria não se importa com isso, ler e ouvir o que há de melhor se tornou algo segmentado e reservado ao público cult. Pelo bem e pelo mal, esta nova Era também traz coisas positivas: o técnico de futebol, Cuca, contratado recentemente pelo Corinthians, pediu demissão após uma pressão insuportável da própria torcida do clube, inconformada com a sua contratação. Ele e mais três jogadores do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense foram acusados de estupro de uma jovem de 13 anos.

O vídeo publicado pela CNN, mesmo editado, tornou inevitável o processo de instalação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) e a íntegra do vídeo não alterou isso. O Brasil em tempos de pós-verdade conseguiu alcançar um “alto padrão” nesta prática terrível e o Congresso Nacional será o palco para assistirmos a quantas anda a bipolaridade brasileira. O governo não desejava a CPMI, mas não pode se furtar a entrar com tudo, pois, a emenda seria pior que o soneto e já está mobilizando os seus melhores quadros para enfrentar os reis da fake news e a sua tropa de choque. Para o bolsonarismo é uma oportunidade para remobilizar as estratégias e táticas usuais que, embora já estejam manjadas, continuam sendo postas em prática, por falta absoluta falta de compromisso com os fatos.

Os representantes do governo têm uma boa experiência, adquirida durante a CPI da Pandemia, quando enfrentaram os quadros mais agressivos do bolsonarismo e conseguiram se sair bem, mas agora estamos diante de uma comissão mista, que envolve as duas casas do Congresso Nacional, que é bicameral. Certamente, pela movimentação demonstrada na grande mídia, haverá uma ampla cobertura e em tempo integral com amplos espaços para reverberar os acontecimentos. O interessante desta época é que os fatos ficam em segundo plano e a disputa de narrativas assume o protagonismo, ou seja: ‘conheceis as narrativas e escolha a que lhe serve mais e melhor’. Os interrogatórios, pela possibilidade de se conseguir, judicialmente, o direito de não falar nada ou só falar o que interessa a cada um dos interrogados, não serão páreos para os embates entre governistas e oposição, que prometem ser ferozes.

O senador Eduardo Girão protagonizou uma daquelas cenas patéticas que impressionam pela tentativa de superar os fatos e criar mais uma pós-verdade. Ele tentou entregar uma réplica de um feto feito de plástico ao ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, durante uma audiência no Senado, na última quinta-feira. O seu escopo era nítido, porque os políticos da 'Era Pós-Verdade' não debatem ideologicamente, mas, outrossim, se especializaram em criar estórias -as chamadas narrativas- para as suas redes sociais e com isso, além de garantir este público, atrair mais pessoas capazes de acreditar em suas criações. O ministro se negou a aceitar e, com palavras firmes, acabou por deixar o senador sem ação, taxando aquilo de escárnio. Aquele programa, famoso nas décadas de 80 e 90 do século passado, que tinha como apresentador o ator norte-americano Jack Palance, “Acredite se Quiser”, não teria mais como concorrer com a nossa realidade atual.

A Era de grandes autores, de grandes intelectuais e de grandes compositores, enfim de tudo que representasse um paradigma para se guiar e, praticamente, impossível de nivelar acabou. A maioria não se importa com isso, ler e ouvir o que há de melhor se tornou algo segmentado e reservado ao público cult. Pelo bem e pelo mal, esta nova Era também traz coisas positivas: o técnico de futebol, Cuca, contratado recentemente pelo Corinthians, pediu demissão após uma pressão insuportável da própria torcida do clube, inconformada com a sua contratação. Ele e mais três jogadores do Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense, clube de Porto Alegre onde ele jogou em 1989, foram acusados de estupro de uma jovem de 13 anos. Cuca afirmou em uma entrevista que não foi reconhecido pela vítima, mas o advogado da vítima o contestou com o fato que foi encontrado sêmen do ex-jogador na vítima. O crime aconteceu em Berna, Suíça, durante uma excursão do clube e depois de ficar preso por um mês ele foi condenado a 15 meses de prisão e multa de 8 mil dólares, mas não cumpriu a pena porque conseguiu sair daquele país e o Brasil não extradita seus cidadãos. O crime prescreveu em 2004, mas agora o passado retornou para atormentá-lo.

A CPMI está na fase da indicação dos componentes pelos partidos e será acompanhada passo a passo pelas mídias e redes sociais. O deputado federal do Maranhão pelos “Progressistas”, André Fufuca, muito próximo de Arthur Lira, presidente da Câmara Federal, desistiu da sua candidatura à presidência da CPMI, abrindo espaço para a indicação de Arthur Maia à presidência e Eduardo Braga à relatoria. No entanto, devemos nos lembrar que a CPI da Pandemia, apesar da enorme repercussão midiática não resultou em nada. Foram muitas acusações encaminhadas a quem de direito, mas que não obtiveram nenhum resultado, o que é recorrente no país, onde a máxima sobre CPIs é que acabam em pizza. Bolsonaro foi acusado de charlatanismo, prevaricação, infração de medida sanitária preventiva, emprego irregular de verba pública e epidemia com resultado de morte, mas continua por aí. O ex-ministro da Saúde, general Pazuello acusado pela CPI (:) de prevaricação, epidemia com resultado de morte, emprego irregular de verbas públicas, falsa comunicação de crime e crime contra a humanidade se elegeu deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro. Quando debocham da Justiça do Brasil em países estrangeiros, o que é recorrente diante da impunidade dos poderosos, mesmo tristes não podemos rebater, porque é verdade.

Vinicius Todeschini 28-04-2023

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