Crónicas do Brasil | 18-08-2023 09:36

A nova velha extrema-direita

Vinicius Todeschini

Esta semana houve um apagão no Brasil, muito embora exista sobra de energia no Sistema. A Eletrobrás foi privatizada e o governo tem 43% das ações, mas apenas 8% dos votos e se quiser comprá-la de volta pagará três vezes o valor que um comprador privado pagaria. Os diretores da empresa, assim que ela foi vendida, começaram as demissões e aumentaram seus salários de R$ 60 mil reais para R$ 360 mil reais.

A ascensão vertiginosa do candidato da extrema-direita argentina, vencedor das primárias com cerca de 30% do eleitorado, emitiu um alerta. Rapidamente o jornalismo das grandes mídias passou a traçar diferenças e semelhanças entre ele, Javier Milei, e o malfadado Jair Bolsonaro, inelegível e cada vez mais próximo da cadeia. As semelhanças são óbvias: os dois são representantes dos poderosos, que usam a política para manter o status quo e continuar enriquecendo a si e aos seus pares, porque ninguém faz nada sozinho neste mundo, nem mesmo enriquecer. A história mostra com clareza um fato recorrente nos perfis desses candidatos; eles sabem usar os contextos históricos e culturais dos seus países para, oportunamente, usá-los a seu favor. Bolsonaro explorou exaustivamente o segmento evangélico, porque existem dados confirmando o seu crescimento contínuo, segundo o Censo de 2020 eles são mais de 42 milhões e, em breve, se continuar assim, superarão os católicos. Milei não tem necessidade de explorar esse segmento porque na Argentina ele não é significativo. Objetivos iguais, estratégias diferentes.

Milei tem um visual muito parecido com o do jornalista Guga Chacra da famigerada Rede Globo, aquela que consegue desagradar a gregos e troianos, e fez a sua trajetória como economista prestando assessoria a políticos e a empresários. Durante a sanguinária ditadura argentina foi assessor do general Antonio Bussi, designado pelo regime para governar a sua província mais pobre, Tucumã, terra da grande Mercedes Sosa. Com um visual excêntrico e um discurso agressivo e confuso - ele se declara “anarcocapitalista”, por exemplo - faz jus ao apelido que ganhou ainda na escola, “o Louco”. Tentou ser goleiro do Chacarita Juniors, foi de uma banda cover dos Rolling Stones, mas só agora encontrou a sua verdadeira vocação, enganar o povo, sendo mais um personagem histriônico e bufão para povoar o imaginário naif de grande parte da população. Assim como Bolsonaro, Milei quer representar nesse imaginário popular, estruturado para ser maniqueísta, a figura que zomba da política e das instituições para ser o salvador do povo, quando na verdade é, justamente, o oposto, mais um candidato fascista a ditador.

Com a ascensão da burguesia e o enriquecimento das suas elites essa estratégia se tornou importante, porque o povo, que tem apenas a sua da força de trabalho, se organizou através de Sindicatos e Centrais Sindicais, no capitalismo o trabalho está submisso ao capital e por isso (:) Justiça do Trabalho, Sindicatos e Centrais Sindicais se tornaram arqui-inimigos dos defensores da antipolítica (leia-se política que interessa às elites). Não é à toa que os seus representantes sejam figuras esdrúxulas, porque assim, esses títeres recebem autonomia para irem, além do alcance normal dos cordões que os sustentam, e criarem uma zona de confusão - já que não existe nenhuma proposta plausível da extrema-direita (e nunca houve, a rigor), a não ser destruir qualquer possibilidade de humanismo e equidade social - e depois salvarem a sociedade. Depois da missão suicida devidamente cumprida eles voltam de onde saíram e os seus patrões se escusam de qualquer responsabilidade sobre tudo que patrocinaram.

Não chores por mim Argentina novamente, diria Evita Peron – a ‘mãe dos pobres’ – se voltasse dos mortos, pois, se acontecer esta tragédia los hermanos pagarão um preço muito alto e se arrependerão, como os brasileiros, pelos anos perdidos e pelos milhares de mortos a mais na pandemia pela negligência de Bolsonaro. O caso da privatização da Eletrobrás é bastante significativo, esta semana houve um apagão no Brasil, muito embora exista sobra de energia no Sistema. A Eletrobrás foi privatizada e o governo tem 43% das ações, mas apenas 8% dos votos e se quiser comprá-la de volta pagará três vezes o valor que um comprador privado pagaria. Os diretores da empresa, assim que ela foi vendida, começaram as demissões e aumentaram seus salários de R$ 60 mil reais para R$ 360 mil reais.

Assim age o grande capital para defender os seus interesses em qualquer região do planeta e por isso precisa de testas de ferro, como Bolsonaro e Milei, esse misto de Napoleão e Guga Chacra. O objetivo é tentar modernizar as velhas práticas contra as políticas públicas inclusivas, que tentam emancipar o povo da sua condição secular de pobreza e ignorância para que tenha autonomia e senso crítico. Milei tenta não criar uma relação direta com os militares, como Bolsonaro o fez, porque no Brasil os militares nunca foram julgados pelos seus crimes e muito menos punidos, como na Argentina, mas a sua vice, Victoria Villarruel, tem. Por aqui terceirizaram, muitas vezes, torturas e assassinatos, através de mecanismos como o DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), onde o famoso Delegado Fleury se tornou um dos maiores carrascos e assassinos deste país e depois morreu misteriosamente. Não há erro pior que aquele feito sem medir às consequências. Muitos países ainda pagam por isso e dariam tudo para voltar atrás, a Argentina ainda tem a chance de não o cometer, mas o inimigo ronda ao seu derredor.

Vinicius Todeschini 17-08-2023

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