Crónicas do Brasil | 18-11-2023 13:58

Um país sem saída

Vinicius Todeschini

As igrejas evangélicas se tornaram um problema grave, porque o seu crescimento desgovernado estabeleceu uma forte base para a extrema-direita fazer o que sabe fazer de melhor: manipular. A bancada evangélica defende pautas de costumes dignas da Idade Média, mas negocia com argúcia tecnológica.

Todos os países que superaram os seus principais problemas aprenderam que, superar é mais menos difícil de que se manter neste novo nível, porque os tempos mudam, os desafios se renovam e não há nada consistente que se mantenha assim, indefinidamente, diante da impermanência das coisas. O Brasil está enfrentando, agora, um dos períodos mais difíceis da sua história, porque as forças reacionárias nunca estiveram tão despertas e prontas para atacar os pilares da nova democracia brasileira, que tem pouco mais de 30 anos. Temos agora um governo democrático que indica intenções de fazer melhorias, mas o governo é uma ilha cercada por incongruências. Além disso, o nível dos políticos atuais, que usam à política para resolver a sua vida e a dos seus apaniguados, cria o efeito de que os medíocres sejam considerados bons, quando, na verdade, são, apenas, menos ruins que os outros.

O “coroné” Arthur Lira, presidente da Câmara Federal dos Deputados, deu prosseguimento a um projeto do ex-prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, bispo licenciado da Igreja Universal, trata-se de uma Emenda Constitucional que amplia as isenções das igrejas para que continuem explorando ainda mais o povo e enriquecendo os pastores. O projeto é vergonhoso, mas eles o defendem com falsa seriedade, porque na verdade só trará mais vantagens e mais benefícios para os que já estão ricos e servirá de polo de atração para novos oportunistas entrarem no negócio mais rendoso do mundo: explorar a boa-fé das pessoas sem pagar impostos. O projeto quer aumentar as isenções e usa para isso o atrativo de incluir os prédios dos partidos políticos. A intenção e a falta de qualquer resquício de vergonha na cara são óbvias.

Marcelo Crivella foi preso durante o seu governo como prefeito do Rio de Janeiro e depois de perder as eleições para Eduardo Paes ficou sem mandato. O seu partido, “Republicanos”, retirou a candidatura do deputado Marcus Pereira à presidência da Câmara para apoiar o atual presidente, o “coroné” Arthur Lira, mas em troca haveria um cargo para Crivella, evidentemente. Bolsonaro perdeu as eleições, assim como Crivella, a única diferença é que Bolsonaro ainda não foi preso. Como se vê, o Brasil é um caso perdido para as gerações atuais, até porque as gerações que compõe o país, com menos de 40 anos, não cultuam o idealismo, se tornaram pragmáticas em uma escala nunca dantes vista no passado recente do país e tem como único ideal de vida cuidar apenas dos seus próprios interesses.

As igrejas evangélicas se tornaram um problema grave, porque o seu crescimento desgovernado estabeleceu uma forte base para a extrema-direita fazer o que sabe fazer de melhor: manipular. A bancada evangélica defende pautas de costumes dignas da Idade Média, mas negocia com argúcia tecnológica. Liderados por pessoas muitas espertas e preparadas em usar técnicas modernas de manipulação, os líderes desse segmento não dão ponto sem nó e, como estão cada vez mais ricos e poderosos, ameaçam a quem quer que se coloque em seu caminho. Suas ameaças incluem, evidentemente, as espirituais, como faziam os padres na época medieval (:) rogam pragas, vociferam, pedem dinheiro, vendem absolvições e tudo isso usando o nome do Pai, mostrando claramente que, entre às suas crenças reais, Deus não está.

O Brasil tem elites entronizadas com poder, dinheiro e disposição para se manter e aumentar ainda mais o que conquistaram a ferro e fogo. Assim é o país do carnaval, triste e quente nos trópicos, “Tristes Trópicos”, como escreveu o sociólogo francês, Claude Lévi-Strauss, e úmido e frio no sul, onde o reacionarismo tem a sua maior base, como em Santa Catarina, um dos estados do sul onde existem mais células nazistas. O estado que tem 3% da população nacional e abrigou a primeira filial do partido nazista do Brasil, nos anos 1920 e de 2021 para 2022, segundo uma reportagem da revista Piauí, totalizou 320 células, mais de um quarto dos 1.117 grupos catalogados no país, só em Blumenau, cidade do estado com 365 mil habitantes, existem 63. São Paulo com 12 milhões de habitantes tem 96.

Não há nada que indique mudanças a curto prazo para um país que não soube aproveitar a volta da democracia para apurar as suas leis e evitar que as Forças da Reação se sentissem encorajadas a voltar. Bolsonaro se elegeu e escancarou as portas do inferno, que os ingênuos democratas tinham deixado entreaberta, depois de terem levado flores à cova de um inimigo que está mais vivo do que nunca. Não há covas suficientes para enterrar todos os homens maus e eles não tem bandeira, a extrema-direita de Israel, por exemplo, convenceu a maior parte da população que qualquer ação contra o seu país é uma ação que visa a sua extinção e não há negociação sob esse ponto de vista, por isso muitos inocentes perecerão sob os seus ataques, que afirmam ser uma defesa. No Brasil nunca houve negociações em relação à pirâmide social predominante, por isso o bolsonarismo surgiu como força de reação a tudo que significa justiça social e não desaparecerá facilmente, porque nenhum fascismo foi derrotado com compaixão.

Vinicius Todeschini 16-11-2023

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