Um Ano Depois
O tal golpe não se concretizou, mas foi por pouco, afinal ninguém é ingênuo em acreditar no que diz o atual ministro da Defesa, José Múcio, que repete incansavelmente que as Forças Armadas, em sua maioria, não apoiavam o golpe. Tudo foi muito bem calculado: cada movimento, cada fake news e tudo gestado naqueles acampamentos ao lado dos principais quartéis de comando militar.
Já se passou um ano da tentativa de golpe coordenado pela extrema-direita brasileira, com o apoio da maior parte das polícias militares e financiado por aqueles que não desejam um Estado forte e atuante em defesa da democracia e da igualdade, muito pelo contrário. Descobrir e prender os financiadores dessa barbárie é agora o objetivo mais importante da Polícia Federal, porque ali estão os grandes mentores, os que têm poder e dinheiro para mobilizar pessoas e estruturas. As pessoas que foram arregimentadas pensavam em obter vantagens depois do golpe consumado e mais; que não sofreriam represálias, pois os militares os defenderiam. Nada disso aconteceu e terão que enfrentar as consequências dos seus atos, alguns já foram julgados e as penas aplicadas foram severas para os padrões brasileiros. Os empresários assumidamente bolsonaristas como, Luciano Hang, por exemplo, com seu indefectível ‘terno/periquito’ são fáceis de identificar, mas a grande maioria atua nas sombras.
O tal golpe não se concretizou, mas foi por pouco, afinal ninguém é ingênuo em acreditar no que diz o atual ministro da Defesa, José Múcio, que repete incansavelmente que as Forças Armadas, em sua maioria, não apoiavam o golpe. Tudo foi muito bem calculado: cada movimento, cada fake news e tudo gestado naqueles acampamentos ao lado dos principais quartéis de comando militar. O ministro do STF, Alexandre de Moraes, que os extremistas chamam de ‘Xandão’ em tom de deboche, tem sido o mais atuante dos juízes do Supremo Tribunal Federal e faz um grande esforço para que todos sejam punidos, com mais de 6,2 mil decisões tomadas em 2023 relativas aos atos golpistas, que amedrontaram o país e afrontaram a democracia como nunca dantes. O Brasil ainda está metabolizando tudo que aconteceu, mas as instituições democráticas reagiram e venceram aqueles que, sem jamais mostrar as caras, mobilizaram um exército de aflitos para que acontecesse uma GLO (Garantia da Lei e da Ordem), o que na prática colocaria o poder nas mãos dos golpistas. Segundo testemunhos de funcionários que estavam naquele fatídico dia no STF, os invasores depredavam e, logo após os atos, se ajoelhavam e rezavam fervorosamente como se estivesse em uma missão autorizada pelo próprio Deus.
A maioria dos empresários que financiaram a tentativa do golpe não serão punidos, porque foram muitos e a maioria dos que fizeram isso sempre estiveram de um só lado -o seu- e seguirão assim atrás de maiores lucros, sua única ideologia. O Ato no Congresso no dia 8 de janeiro de 2024, um ano após o fato, com a presença dos chefes dos Três Poderes, simboliza a importância que se deve dar ao que aconteceu para que não percamos de vista, mais uma vez, os rumos do país. A ausência do presidente da Câmara, ‘o coroné Arthur Lira’ e 14 governadores, todos bolsonaristas, apenas confirma a divisão no país. A fala final coube ao presidente Lula e nada mais justo (:) ele que foi preso sem provas, que suportou 580 dias detidos na sede da Polícia Federal em Curitiba, que nunca perdeu a tramontana e se elegeu presidente mais uma vez. Cabe a ele a missão de restaurar a fé dos brasileiros em dias melhores, tempos em que os direitos dos trabalhadores não sejam subtraídos para pagar contas que o povo não criou, como fizeram recentemente com a Reforma Trabalhista no governo Temer e a da Previdência no governo Bolsonaro.
A fala do ministro Alexandre de Moraes foi a mais pragmática, porque ele tocou na questão fundamental para as democracias do mundo inteiro: o campo minado das redes sociais, a ferramenta que instrumentaliza os fascistas do mundo inteiro, onde as fakes news disparadas pelos robôs alimentam o monstro voraz da barbárie moderna. O desafio é responsabilizar quem faz isso sem retirar liberdades, pois as redes sociais ligam pessoas pelo mundo e se tornaram ferramentas essenciais para bilhões de pessoas. O argumento capcioso usado pelos fascistas é a defesa da liberdade, o que cria um paradoxo; por que defender algo para depois suprimir? Pois é assim que funcionam os fascismos, clamam pela liberdade com o único objetivo de chegar ao poder para acabar com os seus adversários políticos e usar o povo como rebanho de ideologias esdrúxulas. O debate é fundamental para o mundo inteiro e em vários países discussões sobre regulamentações do uso das redes sociais já está na ordem do dia.
O escritor alagoano, Lêdo Ivo, culpava o clima tropical por uma série de dificuldades que o Brasil apresenta, inclusive na literatura. Ele achava que o clima frio era mais apropriado para o surgimento de escritores de fôlego com grades obras, como Tolstói e Dostoiévsky, por exemplo. Já o escritor colombiano ganhador do Prêmio Nobel de 1982, Gabriel García Márquez, natural de Aracataca, onde a temperatura raramente é menor que 22 graus, não se enquadra nessa premissa. Aliás, García Márquez sempre preferiu os climas quentes e era um crítico da fria Bogotá a 2,640 m de altitude, preferia Cartagena, no litoral, onde trabalhou como jornalista. Como se percebe o nosso problema é de outra ordem e não nos faltam escritores de fôlego, apenas não conseguimos superar o colonialismo e sempre o reproduzimos ao criar e manter uma sociedade onde a desigualdade é a marca maior e o nascer brasileiro e pobre é uma condenação.
Vinicius Todeschini 11-01-2024