Crónicas do Brasil | 15-03-2024 17:11

Já não se fazem jovens como antigamente

Vinicius Todeschini

A Esquerda se acomodou em seus métodos tradicionais de fazer política, tanto no âmbito estudantil, quanto na militância em geral. O PT nasceu do sindicalismo, mas os sindicatos não têm mais a representatividade de outrora. Em outras épocas uma greve dos bancários paralisaria o país, hoje isso não acontece mais, porém os caminhoneiros conseguem.

Os ciclos disruptivos que se sucedem a cada cem anos, na história recente da humanidade, não são suficientes para explicar a falta de idealismo das gerações Y e Z, principalmente. Aqui no Brasil, o período que começa com o fim da ditadura, segue até o golpe político que depôs a presidenta Dilma Rousseff e culmina com a tentativa de Golpe de Estado em janeiro de 2022, dá uma boa régua para medir o crepúsculo dos grandes ideais. Na revolta contra o governo Collor de Melo, que resultou no seu impeachment, em 1992, havia um espírito idealista perpassando todo o processo para confirmar a nova democracia brasileira. Itamar Franco assumiu e colocou, Fernando Henrique Cardoso, como superministro da Economia e o Plano Real trouxe um novo ciclo econômico para o país, rompendo com a hiperinflação e criando estabilidade. Collor de Melo tinha uma forma de fazer política mais parecida com o atual presidente da Argentina, Javier Milei, que o próprio Bolsonaro, mas o seu plano econômico, que confiscou as poupanças levando muitas pessoas à falência e algumas ao suicídio, foi um fracasso total. A revista Veja foi a responsável por lançar e popularizar a sua fama de “caçador de marajás” (nome dado aos funcionários públicos com altos salários) como forma de barrar a ascensão dos candidatos de Esquerda, Brizola e Lula.

A violência simbólica praticada pelos jovens idealistas de Esquerda, nas escolas e universidades, contribuiu muito para estimular uma reação conservadora pelos seus pares, que não percebiam muita democracia nos processos complexos e cheios de jargões radicais dos Centros Estudantis e de entidades como a UNE (União Nacional dos Estudantes) e a UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas). No Congresso da UNE, em junho de 2001 na cidade de Goiânia, me chamou a atenção a grande dificuldade para se discutir política fora das pautas impostas pela direção da entidade e também pelo enorme grupo de seguranças, todos devidamente anabolizados, em torno da mesa condutora do processo. O monopólio do PT e do PC do B, que se alternavam no poder, e a maneira de fazer política estudantil; impondo pautas e patrolando oposições, acabou por bitolar os quadros políticos de Esquerda, mantendo assim este modo de fazer política estratificado no tempo e dando margem para que outras formas abrissem espaços. O resultado apareceu claramente nas manifestações de 2013, onde os representantes da política tradicional, inclusive estudantis, não sabiam explicar do que se tratava e quem comandava.

Pesquisas acadêmicas apontam que os jovens identificados com a Direita e a Extrema-Direita consideram a família como a fonte de informação mais confiável e jovens de Extrema-Direita preferem as redes sociais para conversar sobre política, as mobilizações de 2013 e 2018 confirmam isso. O You Tube aparece como a rede social predileta desse segmento. “O movimento de 2013” perturbou as análises tradicionais porque não havia ferramentas ou imaginação para isso e não existia uma causa objetiva capaz de justificar tamanha dimensão para as mobilizações (:) o Brasil tinha se firmado como a 7ª economia do mundo, a taxa de desemprego era 4,3%, a menor taxa desde 2002 (dados do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), no entanto todas as análises partiram de pressupostos tradicionais para tentar entender um fenômeno novo e difuso, mas que tinha um escopo. Um exemplo é o MBL (Movimento Brasil Livre), do qual o deputado federal pelo União Brasil, Kim Kataguari, foi o porta-voz, que soube se aproveitar muito bem daquilo, se nomeando anti-Dilma e ultraliberal. Esses jovens hipster conseguiram transformar a energia daquela época em dividendos políticos e financeiros.

A Esquerda se acomodou em seus métodos tradicionais de fazer política, tanto no âmbito estudantil, quanto na militância em geral. O PT nasceu do sindicalismo, mas os sindicatos não têm mais a representatividade de outrora. Em outras épocas uma greve dos bancários paralisaria o país, hoje isso não acontece mais, porém os caminhoneiros conseguem. Cooptados pela Extrema-Direita eles demonstraram a sua força em 2015 e contribuíram para desgastar o governo da presidenta Dilma. Muitas entidades representativas dos caminhoneiros foram contra o ato, mas os radicais confirmaram a sua grande infiltração ideológica nessa categoria e alcançaram o seu objetivo.

Os jovens políticos que surgiram na esteira neoliberal adotaram o antipetismo como lema e conseguiram cooptar a insatisfação generalizada e alienada das verdadeiras causas dos problemas brasileiros e mundiais, eles se destacarem e criaram carreiras, entretanto, hoje em dia, simplesmente confirmam o que sempre foram: oportunistas. O deputado Kataguari, por exemplo, criticou a Alemanha por criminalizar o partido nazista e depois da repercussão negativa pediu desculpas. Seguem as pautas neoliberais sem acrescentar nada ao que está posto e continuam batendo nas políticas sociais do Estado, como se o capitalismo fosse responsável, unicamente, por criar riquezas, se recusando a enxergar o óbvio: a miséria estrutural; o preço que o neoliberalismo cobra somente dos pobres, enquanto os super-ricos se locupletam. A queda de popularidade do presidente Lula e a vitória da Direita em Portugal, junto com o crescimento da Extrema-Direita nesse país, não deixa nenhuma dúvida do perigo que continua rondando as democracias e os direitos humanos. Ventura e aventura em tempos de conflitos!

Vinicius Todeschini 14-03-2024

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