Crónicas do Brasil | 14-05-2024 17:05

O cavalo no telhado

Vinicius Todeschini

A classe política brasileira é uma das piores do mundo e, preponderantemente, está a serviço de uma elite colonizada e mesquinha, cujo ideário passa sempre por acúmulo de capitais e a exclusão da maioria. Não brincam em serviço e muitos estão aliados a uma rebarba de manipuladores do mais baixo calão.

Um cavalo foi resgatado de um telhado no município de Canoas, no Rio Grande do Sul. O cavalo é um animal muito cultuado por aqui e o fato de “Caramelo” -apelidado assim pela cor da sua pelagem- ter resistido tanto tempo em uma situação tão bizarra, o tornou uma espécie de símbolo. O estado está de joelhos diante da maior enchente da sua história e as consequências ainda são incomensuráveis. Caramelo ficou muitas horas em cima de um telhado e, talvez, por não ser um cavalo muito grande, não rompeu a frágil cobertura sobre a qual se posicionou para não se afogar. O animal, de cerca de 350 quilos, foi resgatado pelos bombeiros e agora se recupera em um hospital veterinário, sendo tratado como um verdadeiro herói, quando na verdade é um retrato das nossas fragilidades diante das forças da natureza. Todos foram atingidos por essa tragédia, e os que não foram diretamente impactados, também estão envoltos em uma egrégora carregada de angústia e pulsão de morte. O número de pessoas atingidas é incalculável e o de mortos não para de aumentar, porque existe um número alarmante de desaparecidos.

O desregramento da política com ao avanço do neoliberalismo e da Extrema-Direita atingiu níveis críticos e a irresponsabilidade social cresceu exponencialmente. O atual Congresso Nacional Brasileiro, um dos mais reacionários e fisiológicos da ‘Nova Democracia Brasileira’, é incansável em criar leis e regulações contrárias à sociedade para contemplar seus apoiadores. O garimpo ilegal deslanchou no período de Bolsonaro na presidência e contaminou os yanomamis e a sua terra com mercúrio (substância extremamente tóxica e mutagênica) e, mesmo assim, ainda não foi possível retirá-los totalmente das terras indígenas. A liberação de agrotóxicos, no período de 2019 a 2022, chegou à cifra de 2.182 produtos, onde 45% deles são proibidos pela União Europeia. Produtos extremamente perigosos para a vida sendo usados para gerar ainda mais lucro aos milionários do agronegócio.

A desconsideração pelas alterações do clima e o negacionismo, combinados, criaram todas as condições para amplificar as tragédias ambientais e não há projetos de vulto para enfrentar os graves efeitos do Aquecimento Global. Desde a Conferência Eco-92, passando pelo Protocolo de Kyoto, onde muitos países não aderiram e por Copenhague em 2009, onde foram revisadas as metas da Conferência de Kyoto, onde os EUA, um dos maiores emissores de GEE (Gás Efeito Estufa), se propôs a reduzir apenas 4%, a evolução é muito lenta. No Acordo de Paris que entrou em vigor em novembro de 2016, com 195 países signatários e a COP21, onde foram atualizadas as metas e o presidente dos EUA, Donald Trump, decidiu romper unilateralmente com o acordo, por achar contrário aos interesses americanos, tudo segue assim. Obama criticou duramente a Trump, afirmando que ele rejeitou o futuro com aquela decisão e Bolsonaro foi uma figura inútil e, assim, o Brasil recebeu o prêmio “Fóssil do Dia”, prêmio dividido com a Arábia Saudita, país reconhecido, mundialmente, pelos ambientalistas por dificultar acordos deste nível.

Bons tempos que a figura do cavalo no telhado renderia apenas crônicas em tom picarescos, mas o perigo, agora, ronda as cidades e não vem mais só do desarranjo social a que estamos submetidos, secularmente, aqui no Brasil, e sim da própria natureza, da qual depende nossa existência como ser e como espécie. As cheias do velho Nilo eram a salvação da agricultura egípcia, porém os rios foram modificados, desviados, canalizados, aterrados e a natureza, agora devidamente envenenada pelos gases do efeito estufa, começa a ter reações devastadoras. Os rios foram criados através de milênios para fluírem em seus ritmos sazonais e desconhecem as regras humanas de criação e ordenamento das cidades. O mundo entrou, definitivamente, em rota de colisão com a natureza.

Caramelo chegou a ser confundido por uma égua, mas era um macho da espécie, entretanto, o que a população não pode mais confundir, é em quem vota. Políticos como Eduardo Leite e Sebastião Melo já mostraram ao que vieram, com um ideário de interesses em um tipo de desenvolvimento que não é mais compatível com a realidade planetária. A modificação criminosa do Código Ambiental em mais de 480 itens, no caso do governador, e a falta de manutenção no sistema de prevenção de cheias da cidade de Porto Alegre, no caso do prefeito, por si só, são mais do que suficientes para incriminar e condenar essas figuras funestas, sempre a serviço do capital e dos poderosos e aos seus próprios interesses.

A classe política brasileira é uma das piores do mundo e, preponderantemente, está a serviço de uma elite colonizada e mesquinha, cujo ideário passa sempre por acúmulo de capitais e a exclusão da maioria. Não brincam em serviço e muitos estão aliados a uma rebarba de manipuladores do mais baixo calão. Os que se colocaram a serviço dessas elites também querem enriquecer e estão dispostos a tudo para isso (:) são pastores da onda neopentecostal, milicianos que controlam boa parte do estado do Rio de Janeiro, principalmente, a sua capital, mas se espraiam cada vez mais pelo país. Na verdade não existe nada que não façam pelos seus objetivos, são perigosos e oportunistas, muitos são psicopatas, outros são perversos, mas todos eles buscam o mesmo: dinheiro e poder a qualquer custo.

Vinicius Todeschini 14-05-2024

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