Crónicas do Brasil | 03-08-2024 11:39

La Sayona versus Maduro

Vinicius Todeschini

Não existem inocentes na Venezuela, nem vítimas das circunstâncias nesse imbróglio, o que está acontecendo no país vizinho em boa parte é um sintoma de décadas de imperialismo norte-americano em nosso continente, que distorceu muitas coisas para justificar intervenções. Por isso achar culpados é muito complicado, talvez existam uns mais culpados que outros, mas achá-los e julgá-los é um trabalho para a história e isso vai demorar.

When the legend becomes fact, print the legend.", Maxwell Scott, personagem do filme de John Ford, “O Homem que matou o facínora”. A política atual segue isso à risca, indubitavelmente ‘a versão é mais importante que o fato’. A Venezuela não é diferente do resto do mundo, mas as coisas estão muito inflamadas por lá, porque quando um grupo toma o poder com um projeto de poder vitalício o radicalismo ‘campeia à rédea solta’. "A história se repete, a primeira vez como tragédia, e a segunda, como farsa" (Karl Marx). Esta frase tem mais de 180 anos e continua sendo exaustivamente citada para ilustrar certas peças recriadas -com elencos diferentes- pelo teatro humano na divina e trágica comédia humana. Fidel Castro, ao contrário, não achava que a história se repetisse, porque as circunstâncias eram outras, ou seja: para ele, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida anterior terá sido mera coincidência”, mesmo que alguns fatos e personagens se repitam incansavelmente.

A Venezuela tem sido palco para muitas aventuras e a pressão do mundo capitalista sobre este país, que possui a maior reserva de petróleo do mundo -maior até que a Arábia Saudita- é extremamente forte e insidiosa. A transmissão full time do discurso da oposição venezuelana por várias redes mundiais alinhadas à Direita é um exemplo dessa disposição. Na transmissão, a líder oposicionista Maria Corina Machado, em alguns momentos quase arrancou o microfone das mãos do candidato oficial da Plataforma Democrática Unitária, Edmundo González. A hiperexcitação da liderança mais importante da oposição era visível. Maria Corina é filha de um empresário muito poderoso do ramo siderúrgico, Enrique Machado Zuloaga (falecido em 2023), dono da Sivensa. O primo de Corina, Oscar Augusto Machado, está à frente do grupo empresarial da família. Corina teve uma participação ativa no golpe contra Chávez em 2002, através da ONG que dirigia chamada Súmate. A ONG foi apoiada pelo National Endowment for Democracy, uma instituição norte-americana fundada na década de 80 do século passado para atuar em política de outros países e mantendo a tradição estadunidense de intromissão e intervenção em outros países.

O Decreto Carmona, assinado por, Pedro Carmona Estanga e, também, por Maria Corina Machado, decretava o fechamento do Congresso e da Suprema Corte, anulava a Constituição e todas as medidas decretadas por Chávez e terminava também com os direitos constitucionais dos cidadãos, mas durou apenas 48 horas, o tempo do golpe. Ela também apoiou o autodeclarado presidente da Venezuela, Juan Guaidó, recebido por Donald Trump como presidente da Venezuela. Durante este período, Corina, apoiou e estimulou uma invasão militar estrangeira na Venezuela para derrubar o regime atual. Não existem inocentes, nem vítimas das circunstâncias nesse imbróglio, o que está acontecendo no país vizinho em boa parte é um sintoma de décadas de imperialismo norte-americano em nosso continente, que distorceu muitas coisas para justificar intervenções. Por isso achar culpados é muito complicado, talvez existam uns mais culpados que outros, mas achá-los e julgá-los é um trabalho para a história e isso vai demorar.

A proposta de Maria Corina Machado é exatamente igual a todos os neoliberais (:) diminuir o Estado e, consequentemente, os serviços públicos, privatizar tudo e entregar nas mãos dos seus pares, os empresários. As elites venezuelanas sempre se destacaram pela sua crueldade e o seu descaso com as condições sociais do povo, foi isso que tornou o chavismo possível, porém o caminho agora se tornou tempestuoso e propício a uma guerra civil. A morte prematura de Chávez combinada com um sucessor como Nicolas Maduro acabou por tornar tudo ainda mais difícil e procrastinação do atual mandatário em entregar as atas, acaba confirmando as suspeitas de fraude, porque parece estar ganhando tempo para manipulá-las, como estão afirmando os seus adversários. La Sayona está ao derredor de Maduro como um espírito vingador, tal qual reza a lenda venezuelana, uma mulher que persegue os homens infiéis.

Nos EUA, Donald Trump, uma permanente ameaça à democracia e aos avanços da civilização aceitou o convite da Associação Nacional dos Jornalistas Negros para uma entrevista. Depois de George W. Busch ele é o primeiro republicano a assentir o convite. Aconteceram muitos protestos na entrada do evento, na cidade de Chicago, porque ele já atacou vários jornalistas negros e usou diversas vezes linguagem racista em sua campanha. Trump não destoou de ser o que é e atacou Kamala Harris de forma vil, alegando que Kamala estaria usando a sua identidade negra por razões políticas. “Ela é indiana ou negra? Ela era indiana por completo e, de repente, deu uma guinada e se tornou uma pessoa negra”. A mãe de Kamala é indiana e nasceu em Chennai na Índia, o seu pai é negro e nasceu na Jamaica, mas, mesmo sabendo disso, Trump não economizou e destilou o seu velho veneno sexista e racista em sua adversária. A Casa Branca repudiou a declaração do candidato e a classificou como ofensiva. “O que ele acabou de dizer é repulsivo. É um insulto”, afirmou Karine Jean Pierre -secretária de imprensa. Mas o que esperar de Trump? De fato, ele não cansa de se superar e agora não seria diferente, só que o espírito de La Sayona também pode migrar para os EUA, porque espíritos não têm limites, nem reconhecem fronteiras.

Vinicius Todeschini 31-07-2024

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