A esperança e o medo
Sempre no cio, a cadela capitalista devora seus copuladores e, após cada ato, se faz necessário novos candidatos para exercerem a função mortal de entretê-la. Não há preocupação real com a vida, existe sim o imperativo do crescimento desregulado, mas o planeta já demonstra, há um bom tempo, estar chegando a um limite mais que preocupante, assustador.
Caminhamos sempre em frente e, no contratempo do tempo, mensuramos em números o tempo vivido, que jamais correspondem ao que se guarda. Seguimos em compasso de espera, porque é a nossa condição e levamos no íntimo a esperança e o medo. Não há como voltar, no entanto, costumamos dizer a uma contrariedade de alguém: ‘tem volta’... Seguimos na esperança de dias melhores, enquanto o tempo nos devora, porém, em nossa época, há cada vez mais razões para se ter medo do que esperança. Na medida em que o nível de informações atinge muito mais pessoas, se desvanecem, uma a uma, todas as ilusões sobre antigos mistérios, mas, ao mesmo tempo, a agressividade surge como sintoma mais visceral a perda da inocência, com isso mais pessoas querem entrar nos clubes restritos dos privilegiados. A cada nova crise uma nova ordem para que tudo continue como está, criando a impressão de mudança, quando o único escopo é criar novas demandas para que mais produtos sejam vendidos e caiam logo em desuso e sejam substituídos rapidamente, justificando assim a cadeia interminável de produção e consumo.
O projeto da deputada federal do PSOL de São Paulo, Erika Hilton, que acaba com a jornada 6X1enfrenta forte resistência dos conservadores, que são a maioria no Congresso. O projeto visa diminuir a carga horária dos trabalhadores para 36 horas semanais, como já existe em muitos países. Ele acabaria com a jornada 6X1, seis dias trabalhados por um de descanso, a substituindo 4X3, com 3 dias de folga por semana, contabilizado com os dois dias do final de semana. Há grande discussão em curso entre os defensores dos empresários e os que defendem os trabalhadores, mas a Direita e a Extrema-Direita são absolutamente intransigentes, porque as elites brasileiras jamais cederão -sem muita luta- qualquer coisa que signifique mais avanços sociais, mesmo que isso seja bom para a sociedade. Na Grande Mídia, os jornalistas que reproduzem a voz dos seus donos não se cansam de criticar o projeto, sempre apontando como o risco de aumentos dos produtos. O discurso do medo quer manter tudo como está.
Sempre no cio, a cadela capitalista devora seus copuladores e, após cada ato, se faz necessário novos candidatos para exercerem a função mortal de entretê-la. Não há preocupação real com a vida, existe sim o imperativo do crescimento desregulado, mas o planeta já demonstra, há um bom tempo, estar chegando a um limite mais que preocupante, assustador. Com Trump no poder se pode esperar o pior e as escolhas do seu novo governo já demonstram a direção que isso tomar. Marco Rubio, ultradireitista e inimigo feroz dos concorrentes dos EUA, será seu Secretário de Estado, um outro crítico da China, Michael Waltz, será o conselheiro de Segurança Nacional. Para mimar, Elon Musk, foi criado um novo departamento, o de ‘Eficiência Governamental’. Por fim, Lee Zeldin, a raposa para cuidar do galinheiro, o negacionista que vai dirigir a EPA, a agência ambiental norte-americana, que apoia as indústrias de energia fóssil. O retrocesso vem aí e a esperança continua perdendo de goleada para o medo.
Por fim, no Brasil, surge o homem-bomba na Praça dos Três Poderes estabelecendo um novo nível de terrorismo para o país, sinal de que a pregação fanática, sistemática e irredutível, assim como aconteceu em alguns países árabes, já começa a colher frutos por aqui também. ‘Se está a seguir um cego na escuridão, se perder dele não faz nenhuma diferença’, mas o sistema binário parece reger a lógica dos homens (bem e mal) e das máquinas (0 e 1). O cidadão que cometeu o ato parece estar ligado a uma rede de pessoas suscetíveis aos discursos de ódio e capazes de agirem racionalmente dentro de uma lógica insana, mas perfeitamente organizada e desenvolvida em camadas, para que uns simbolizem os mártires da causa, quando na verdade são apenas peões descartáveis nesse jogo perverso.
Lula, em sua saga contra o neoliberalismo, não desiste de tentar colocar o imposto sobre as grandes fortunas na pauta do Congresso, o mais antipovo desde a redemocratização. Será uma árdua tarefa taxar os superpoderosos, que são 2 % da população mundial. Aqui no Brasil 1% dos mais ricos detém 49,6 % de toda a riqueza em suas mãos e para isso o presidente tenta barganhar com um Congresso reativo e, portanto, contrário, em sua maioria, a qualquer tentativa dessa ordem. Por fim, o ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, Ciro Nogueira, postou notas contra a radicalização depois do ato do homem-bomba em Brasília pedindo o fim da radicalização na política brasileira, mas aproveitou para alfinetar o governo, a quem ele culpa por não querer virar a recente página de conflitos no país. Como se percebe a hipocrisia e a desfaçatez não tem limites, aliás, são predominantes na nossa política. O ex-ministro e atual senador pelo Piauí aposta na memória curta da maioria da população para não lembrar que Bolsonaro e o seu governo ficaram o tempo todo incitando o ódio e a divisão, enquanto engendravam um golpe de Estado. Lula sabe que não acontecerá tão cedo uma taxação justa no país dos impostos regressivos e da corrupção institucionalizada, portanto não há como não achar ‘quixotesca’ a sua atuação nesse caso. A única forma de taxar os mais ricos é a maioria tomar o poder, coisa que nunca aconteceu realmente no Brasil, o país dos arremedos.
Vinicius Todeschini 18-11-2024