A Estética do Fim do Mundo
A Extrema-Direita criou uma guerra cultural com as mesmas táticas recomendadas por Gramsci contra valores que ela credita à Esquerda, quando na verdade foram conquistas dos setores democráticos da sociedade na luta contra o fascismo e o nazismo.
A teoria de alguns setores da oposição norte-americana de que Trump é apenas um fantoche, ganhou pontos após a entrevista de Elon Musk (‘O Anticristo da Hora’) no Salão Oval da Casa Branca, junto com seu filho, enquanto Trump sentado na cadeira presidencial com o olhar sem vida, parecia apenas um coadjuvante sem nenhuma autoridade. O filho de Elon Musk que tem um nome bizarro, X Æ A-Xii, xingou o presidente no início da entrevista e crianças sempre reproduzem de forma descontextualizada o que ouvem em casa, mas o conteúdo é sempre verdadeiro. Quem ouviu atentamente a entrevista até o final percebeu a grande atuação dos personagens envolvidos, onde a participação do filho é planejada para humanizar as intenções do projeto em curso nos EUA. As denúncias de corrupção encenadas de forma dramática são extremamente graves, mas seguem a velha lógica dos fascistas e o alvo da vez é a USAID-Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, instituição fundamental da política ‘soft power’ norte-americana com um orçamento de cerca de US$ 40 bilhões.
A USAID projetava no mundo os valores norte-americanos e amenizava a profunda antipatia que o imperialismo norte-americano sempre amealhou desde que se tornou uma potência. É importante ressaltar que os resultados conquistados pelos norte-americanos levaram décadas de investimento nessa política de ‘distribuição de benefícios’. O professor de Relações Internacionais da Universidade de Harvard, Stephen Walt, escreveu que já se pode antever um padrão nas ações do presidente dos EUA, ‘ora faz ameaças estúpidas e os outros respondem com conceções triviais, ou percebem o blefe e o desafiam’. São justamente os países, aliados históricos do Tio Sam, que estão sentindo as ações da ‘política do porrete’ de Trump, mas em relação aos inimigos dos EUA parece haver outro tratamento, que se explicaria por eles não receberem nada dos norte-americanos e também por uma identificação e uma admiração tácita do presidente norte-americano pelos autocratas, que povoam de tragédias a história da humanidade.
O objetivo do governo Trump está contido neste trecho de uma frase de Elon Musk durante a entrevista: “mas você não pode ter uma burocracia federal autônoma”. Ele segue o discurso comparando democracia com burocracia, o que não faz sentido, porque burocracia não é um regime de governo, burocracia trata das formalidades das ações entre Estado e seus entes, mas essa confusão interessa aos autocratas disfarçados de democratas, o objetivo é o poder total. Ele fala como se todos os norte-americanos aptos a votar tivessem, unanimemente, votado em Trump e exigido uma revolução, porém não foi isso que aconteceu. Musk deseja ser mais que presidente norte-americano, que legalmente pelas leis atuais não pode ser, deseja ser o imperador do mundo. Em seu delírio messiânico, conta com a combinação da ignorância e da paixão, que ativados pela miséria que o capitalismo neoliberal produz há décadas, surja o fanatismo por figuras como Trump e ele. O método está funcionando, Hitler que o diga.
O messianismo delirante do megaempresário não tem limites, nem balizas, segue apenas os ditames do seu narcisismo. As cenas com o filho durante a entrevista mostram como ‘a estética do fim do mundo’ deseja se apresentar -com falsa moralidade e pregando valores familiares- enquanto mente e detrata seus opositores com declarações sem provas e fake news do mais baixo calão, como a que o pai de Musk, Errol Musk, fez no podcast, “Wide Awake Podcast”, de Joshua Rubin. Nesse vídeo ele aparece afirmando que Obama é gay e Michelle é uma mulher transgênero com um pênis de 23 cm. “É uma outra perna”, afirmou. Elon Musk tem 12 filhos com várias mulheres e fez uso de métodos artificiais, como inseminação artificial (o que explica a recorrência de gêmeos), inclusive a sua filha, Vivian, que foi rejeitada por ele em entrevista ao jornal conservador, Daily Wire, por ser mulher transgênero, é gêmea de Griffin.
Políticas de Estado são diferentes de políticas de governo, Bolsonaro buscava controlar órgãos de Estado autônomos como a Polícia Federal. A ideia é dissolver as instituições, torná-las líquidas e moldá-las a um governo discricionário. Muitas pessoas pobres e ingênuas aderiram à Extrema-Direita acreditando que o mal está no Estado, ou pior, que o mal é o Estado, mas são elas, justamente, as que mais precisam dele para remediar a exclusão estrutural do capitalismo. Quando os pobres apoiam políticas que irão prejudicá-los, alguma coisa está muito errada! A Extrema-Direita criou uma guerra cultural com as mesmas táticas recomendadas por Gramsci contra valores que ela credita à Esquerda, quando na verdade foram conquistas dos setores democráticos da sociedade na luta contra o fascismo e o nazismo. Mesclando Gramsci com Chacrinha (“Eu não vim para explicar, eu vim para confundir”) conseguiu povoar o imaginário popular com fantasias perigosas, o resultado é o que se vê. A Esquerda ainda tenta sair da inércia para enfrentar as ações de um inimigo que se apropriou das suas próprias estratégias e as torceu até, finalmente, criar um modelo funcional e eficaz de cooptação. Os 4 anos de Bolsonaro foram péssimos para a Economia, Lula está indo muito bem, no entanto não consegue capitalizar em popularidade a sua boa administração, simplesmente porque está perdendo de goleada a guerra cultural.
Vinicius Todeschini 17-02-2025