O Avanço das Máquinas e da Canalha
A gentrificação de bairros tradicionais, redutos da cultura popular, é parte da estratégia de destruição da memória coletiva, para criar novas gerações sob o valor absoluto do dinheiro e do alpinismo social. O avanço se tornou um retrocesso e os valores humanos se inverteram.
Quem lida com as máquinas há muito tempo sabe que elas têm idiossincrasias, o que pode parecer que têm consciência, mas não, isso apenas confirma a máxima do professor Miguel Nicolelis, que elas não são: 'nem inteligentes, nem artificiais'. Na verdade essas “idiossincrasias” são o resultado da inteligência humana aplicada aos softwares e algoritmos que as comandam, que são feitos por humanos e aplicados nas máquinas. É comum ouvir de pessoas que lidam diretamente com TI (Tecnologia da Informação) sobre “as manhas” de cada máquina, então quando as máquinas travam, ou criam algum impeditivo para o trabalho, você aprende “a manha” para que ela volte a funcionar dentro do esperado. A cafeteira, o computador, a televisão, enfim, todos os tipos de máquinas, replicam e reproduzem instruções, aplicadas em linguagem técnica, para que a máquina, qualquer que seja, trabalhe de forma específica. Não há novidade nisso, a novidade está no uso cada vez maior das máquinas para funções da inteligência humana e assim, fazendo com que pessoas que não dominam determinados temas possam usá-las para fazer coisas que não conseguiriam fazer pelos seus próprios meios.
Em outra época, não muito distante, se ia a uma biblioteca para pesquisar e lá se ficava por horas e horas estudando, caso não tivéssemos poder econômico para comprar os livros necessários para os estudos. Isso, no entanto, não era suficiente, precisávamos também de orientação e, dentro dessa lógica insofismável, quem vinha de uma família mais rica podia oferecer aos filhos uma formação muito melhor, além de bons colégios e cursos suplementares, com professores particulares para ajudar a superar as dificuldades, nessa ou naquela matéria. O uso das máquinas e o avanço delas em atividades humanas não para de crescer e isso não é necessariamente uma evolução, além de estar criando retrocessos substanciais na formação e no desenvolvimento cognitivo e subjetivo das gerações que já nasceram nessa Era, os chamados nativo digitais. A imersão na Era Digital das gerações que nasceram sob esse paradigma muda a forma das mentes trabalharem e com o tempo muda também a própria morfologia das estruturas cerebrais. O hipertexto, por exemplo, é como se a mente fosse uma tela de computador, mas a mente humana não é digital, somos analógicos porque trabalhamos organicamente de forma integrada e nada acontece na inteligência humana sem uma interação completa do todo.
Com o avanço do neoliberalismo o mundo começou a experimentar sintomas de disfuncionalidade estrutural, porque as condições de trabalho começaram o seu processo de precarização mais acentuado e assim chegamos a nova fase do capitalismo atual; o ultra neoliberalismo. Empresas como a Uber e as Big Techs trouxeram novas formas de exploração do trabalho e de ganhar muito dinheiro com o trabalho dos outros sem ter que pagar por isso. Os empresários se tornaram bilionários, só no Brasil o crescimento desse segmento foi de 33% de 2023 a 2024 e as suas fortunas, no mesmo período, aumentaram 37,7%. Para se perceber o resultado desastroso de tamanha concentração de renda nas mãos de poucos, basta olhar para as grandes cidades onde a miséria e o abandono da coisa pública se contradiz com o crescimento de grandes torres de vidro e dos condomínios fechados, concomitante ao desaparecimento do casario repleto de histórias e de arte. A gentrificação de bairros tradicionais, redutos da cultura popular, é parte da estratégia de destruição da memória coletiva, para criar novas gerações sob o valor absoluto do dinheiro e do alpinismo social. O avanço se tornou um retrocesso e os valores humanos se inverteram.
A nova tecnologia caiu como uma luva para as classes dominantes, interessadas apenas em ficarem cada vez mais ricas, mas canalhas também envelhecem e ficam doentes, por isso, o velho ditado indiano, de sentar-se à beira do rio e ficar esperando o cadáver do inimigo passar, está valendo e é mais sábio do que levar flores a cova do inimigo, porque ele poderá não estar ali. Jair Bolsonaro, um homem que se considera acima da lei e sem compaixão pela humanidade, demonstrou isso diversas vezes, está com a sua saúde cada vez complicada e passou por mais uma cirurgia de cerca de 12 horas, o que parece confirmar a tese de que o seu problema não é decorrência da “facada”, mas sim de outra ordem. Isso, evidentemente, não trava o projeto canalha de Anistia, que visa salvar a Extrema-Direita e reativar o seu candidato número 1. O projeto é uma aberração e quer, basicamente, salvar Bolsonaro e o ‘Núcleo Duro’ do golpe, além de criminalizar o Judiciário, leia-se, STF-Superior Tribunal Federal. O ministro Alexandre de Moraes, odiado profundamente pelos bolsonaristas, estava em uma lista, junto com Lula e o seu vice, Geraldo Alckmin, de pessoas a serem executadas. O sicário encarregado da execução de Moraes, inclusive esteve com ele na mira, mas recebeu ordens para abortar a missão. Tudo isso reflete a nova diretriz dos poderosos, não basta precarizar o trabalho e sucatear o serviço público para privatizá-lo, é necessário destruir o sistema democrático. Trump, um criminoso que ascendeu ao Poder nos EUA, porque a Justiça norte-americana demonstrou ser tíbia diante de inimigos desse porte, está claramente tentando implodir as instituições que sustentam o Estado de Direito, em uma saga que é pura pulsão de morte.
Vinicius Todeschini 16-04-2025