Crónicas do Brasil | 28-05-2025 20:49

A decadência de Porto Alegre – Parte II

Vinicius Todeschini

As obras do Centro Histórico de Porto Alegre são intermináveis; calçamentos inacabados, ruas sem nenhuma harmonia entre as estruturas, invasão dos espaços públicos pelos comerciantes, e um exército que vagueia sem profissão pelas ruas. A enchente de 2024 confirmou o quanto a cidade foi abandonada pelas últimas gestões, que optou, programaticamente, pela construção de prédios calcados na especulação imobiliária. Um desenvolvimento vazio de qualquer sentido humano que, pouco a pouco, altera o corpo da cidade e esvazia a sua alma.

O simples prazer de andar pelas ruas de Porto Alegre já não é mais tranquilo, como foi em algum lugar do passado desta cidade. Os obstáculos são inúmeros: calçadas abandonadas, marquises corroídas, fios soltos pelo chão ou ainda pendurados nos postes, ladrões de celulares sempre prontos para atacar, fezes de cães que não são recolhidas, galhos de árvores (porque uma empresa faz as podas e a outra é que retira os galhos e folhas), pessoas de todas as idades pedindo esmolas ou vendendo paçoquinhas, malabaristas dos sinal vermelho e tantas coisas dissonantes com o passeio, que ele se torna uma saga perigosa. As obras do Centro Histórico são intermináveis;, calçamentos inacabados, ruas sem nenhuma harmonia entre as estruturas, invasão dos espaços públicos pelos comerciantes, e um exército que vagueia sem profissão pelas ruas. A enchente de 2024 confirmou o quanto a cidade foi abandonada pelas últimas gestões, que optou, programaticamente, pela construção de prédios calcados na especulação imobiliária. Um desenvolvimento vazio de qualquer sentido humano que, pouco a pouco, altera o corpo da cidade e esvazia a sua alma. Os resultados são bizarros, porque não há qualquer tipo de equilíbrio, seja ambiental ou estético. São torres de vidro que brotam rapidamente do chão, prédios de apartamentos com pés-direitos com pouca altura e janelas cada vez menores, que lembram pombais, projetos arquitetônicos repetitivos que criam uma sensação permanente de desamparo e impessoalidade.

O roubo de fios se tornou uma ‘atividade profissional’ de várias pessoas da cidade, elas arriscam a vida para cortar fios de todos os tipos e assim também rompem serviços de internet e de eletricidade. Alguns são ladrões e fazem isso em conexão com receptadores, mas outros fazem, somente, para sobreviver a um sistema social cada vez mais excludente e corrosivo. Não há como andar algumas quadras sem encontrar dezenas de fios arrancados e jogados pelas calçadas, oferecendo riscos imprevisíveis. Entre os postes há uma quantidade de fios emaranhados que é, praticamente, impossível distinguir o que é de um serviço ou de outro. São fios que não acabam mais, enrodilhados uns aos outros, alguns provavelmente desativados, mas que não foram retirados porque a fiscalização simplesmente não acontece. É um tal de empurra-empurra entre prefeitura, a companhia de eletricidade e as prestadoras de serviços que utilizam desse sistema. O resultado é o pior possível, uma cidade cada vez mais feia e abandonada pelo Poder Público, um canteiro de obra das construtoras, que são “os donos da cidade”.

Nas zonas mais abastadas há vigilância privada constante e moradores de rua são mantidos longe desses lugares, o resultado é uma concentração dessas pessoas no Centro Histórico e em bairros adjacentes como Cidade Baixa, Santana, Bom Fim, Farroupilha, Independência e outros, mais próximos ao centro da cidade, mas há, também, em lugares distantes do centro, um crescimento vertiginoso de pessoas em situação de rua. Porto Alegre, pouco a pouco, se transforma em uma cidade completamente diferente do que já foi e com a queda dos últimos sobrados históricos não restará mais nada do seu passado. As referências estéticas das antigas construções são fundamentais para referendar história e manter viva a cultura de um povo e, assim, sustentar a sua identidade, mas os empresários que conquistaram o Poder, através dos seus representantes, têm uma agenda de demolição para acabar com qualquer resistência cultural e estética, haja vista o carnaval, que já foi um dos melhores do país.

Com o passar dos anos a população se mostra cada vez mais alienada do seu passado, e elege políticos que são contra os interesses populares, por isso, o que era direito duramente conquistado e gratuito está se transformando em serviços pagos e, muito em breve, haverá pedágios para acessar o centro da cidade (já foi tentado) e alguns bairros, cerceando a liberdade de ir e vir prevista na Constituição. A desconstrução da democracia de dentro para fora é a solução final dos ultra neoliberais, porque democracia plena atrapalha o seus planos. O futuro da cidade depende do seu povo, mas a cooptação das pessoas de baixa renda e das periferias pela ideologia da Extrema-Direita, calcada em mitos, como o empreendedorismo e teologia da prosperidade, não torna esta expectativa alvissareira. Na cidade de São Paulo, por exemplo, os motoboys, em sua maioria, apoiaram a candidatura de Pablo Marçal, um sujeito inescrupuloso, para dizer o mínimo, mas que, ao mesmo tempo, desperta a admiração de muitos jovens das periferias por sua capacidade mentir e de driblar a Justiça brasileira, que sempre se mostra ambígua quando se trata de pessoas endinheiras e poderosas. O futuro de Porto Alegre está ameaçado, pois novos projetos calcados no consumo desenfreado vão continuar e a distância econômica, cada vez maior entre as pessoas, não vai parar de crescer A cidadania, agora, é garantida pelo seu nível de consumo, uma nova taxonomia social está em curso e nessa ‘Nova Ordem’ o espaço da cidadania terá que ser reconquistado, ou viraremos escravos dos neocolonialistas, sem direito, sequer, a uma aposentadoria digna.

Vinicius Todeschini 27-05-2025

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