Crónicas do Brasil | 02-07-2025 14:08

O Rio Grande do Sul na rota do desastre

Vinicius Todeschini

O Brasil, como se percebe, não necessita de inimigos externos, porque os internos dão conta, com sobra, em manter o país na condição de ‘campeão universal da desigualdade social’.

O estado do Rio Grande do Sul está na rota de fenômenos climáticos extremos, é o que concluem estudiosos do clima, baseados em uma conjugação de fatores e, potencializados, pelo dito, ”novo normal”, consequência do aquecimento global que, para os negacionistas, é uma falácia. Este segmento que se destaca por negar muitos dos avanços da ciência, paradoxalmente se beneficia da tecnologia que lhe é útil, as redes sociais que, somente, se tornaram uma realidade pelo desenvolvimento e soma de várias tecnologias. Para piorar a situação do estado, localizado no extremo sul do Brasil, a sua capital está localizada em frente ao Guaíba, um lago-estuário que é rio ao mesmo tempo, porque tem uma corrente de água que segue em direção à Lagoa dos Patos. Cerca de 80% de todo ‘Sistema Hídrico’ do estado se utiliza desta via de passagem, rumo ao oceano Atlântico, para escoar as suas águas que desaguam, finalmente, junto aos molhes da cidade de Rio Grande, onde existe uma passagem estreita para o mar de, mais ou menos, 60 metros. Depois da maior enchente da história, em 2024, nada mudou.

A tese que a Extrema-Direita se utiliza para justificar a falta de providências e projetos para a prevenção de novas cheias é o assoreamento do Guaíba, que aconteceria pela proibição de retirada de areia para uso comercial, feita em 2003, em decreto assinado pelo então governador do estado, Olívio Dutra. Há um documentário, inclusive, que se espalhou rapidamente como fogo morro acima, que afirma isso. O atual prefeito da cidade, que foi reeleito com cerca de 60% dos votos, Sebastião Melo, é defensor dessa tese e para isso cita, frequentemente, uma referência na área, o engenheiro Carlos Tucci, mas o próprio engenheiro afirmou o contrário. Em suas palavras: “ Não, não (não é importante a dragagem). Em um sistema tão grande como o Guaíba, a dragagem só é importante para a navegação, para você ter um trecho de navegação. O efeito (para conter cheias) é mínimo. Nós já simulamos esse tipo de cenário. A dragagem ajuda num arroio, num riacho pequeno, onde ele perde seção. Mas em um sistema como a Lagoa dos Patos ou Guaíba, não, o efeito é pequeno”. Os pesquisadores do Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) concordam com o engenheiro.

O senso comum deseja soluções rápidas e definitivas, por isso se apodera de alternativas simples, a maioria simplórias e as divulga massivamente. Os proselitistas populares adoram demonstrar sapiência e se jactar com afirmações desse tipo, sem nenhuma base que as sustente. Ouvem isso em programas de televisão extremamente tendenciosos, onde a ideologia da Extrema-Direita prepondera e as reproduzem como papagaios em rodas de condomínios, bares e afins... Os taxistas, os caminhoneiros, os motoristas de Vans e micro-ônibus (que se deslocam de pequenas cidades em direção à capital para levar pessoas aos hospitais e ficam longas horas em stand-by) aproveitam o tempo ocioso para reproduzir e espalhar afirmações inconsistentes como esta. As redes sociais deram voz aos imbecis, como afirmou o escritor italiano, Humberto Eco, em 2015, e disse mais: "O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade". A vida não anda para a frente como pensa o senso comum, mas segue em uma espiral ascendente e descendente, onde nenhuma evolução é constante ou base para outra.

O próximo ano será fundamental para o país, porque forças totalmente antagônicas se digladiarão como nunca, pelo menos nesse período de pós-redemocratização. A grande aposta da Extrema-Direita é controlar o Senado e assim expurgar do Supremo Tribunal Federal figuras como, Alexandre de Moares e Flávio Dino, que entravam suas ambições em desconstruir o Estado e torná-lo um feudo das Elites do Atraso (como diz o Professor Jessé Silva). O Congreso Nacional, batizado por mim como ‘Congresso do Atraso’ está sendo incansável em fazer projetos contra o povo e barrar outros que beneficiam a maioria, assim foi com a derrubada do decreto da IOF, cujo escopo é taxar os mais ricos, mas aprovou o aumento de deputados de 513 para 531 e também fez, através do deputado carioca, Sóstenes Cavalcante, do PL, partido de Bolsonaro, um Projeto de Lei que altera o Código Penal e estabelece uma pena de 6 a 20 anos para mulheres estupradas que fizerem aborto depois de 22 semanas de gestação, o que é o dobro da pena do estuprador, que é de 6 a 10 anos. Não é à toa que o projeto foi batizado de ‘PL do Estuprador’.

O Brasil, como se percebe, não necessita de inimigos externos, porque os internos dão conta, com sobra, em manter o país na condição de ‘campeão universal da desigualdade social’. Não fossem suficientes os reacionários da política, existe a Grande Mídia atacando, incessantemente, o governo através dos seus inúmeros veículos e exigindo cortes de investimentos sociais, mas jamais defendendo a taxação dos mais ricos e a limitação de gastos dos congressistas, que custam ao país mais de US$ 5 milhões de dólares ao ano. “Não existe pecado do lado de baixo do Equador”, escreveu Chico Buarque, o maior compositor brasileiro, o que existe de fato aqui é um Elite incansável em exigir cada vez mais privilégios e sugar as tetas da nação, tetas que ainda não murcharam, porque ela, a nação, está deitada eternamente em berço esplêndido, como diz o hino, cuja música é plágio, basta ouvir “Dom Sanche” (1825) de Liszt; “Centone di sonate nº1” (1828) de Paganini; “Fantaisie pour flûte seule” (1823) de Neukomm; “Método de piano forte” (1821) de J.M.Nunes Garcia e “La Cenerentola” (1817), de Rossini.

Vinicius Todeschini 30-06-2025

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