Rui Fernandes: o escultor da Golegã que não é escravo de modas e de escolas

Rui Fernandes está a acabar a escultura que vai assinalar o centenário da praça de toiros da Chamusca. O MIRANTE foi visitá-lo em horário de trabalho e aproveitou para ver a exposição na Galeria Municipal encerrada antes do tempo por falta de pessoal para abrir a porta.
O escultor Rui Fernandes está a trabalhar numa obra que vai assinalar o centenário da Praça de Toiros da Chamusca. O jornalista de O MIRANTE empurrou de forma discreta um portão de um espaço propriedade da Câmara da Chamusca e encontrou Rui Fernandes literalmente com a mão na massa e os olhos vidrados no trabalho.
Dos olhos pouco podemos falar. Das mãos podemos dizer que sentimos a textura do material pois procurámos um aperto de mão que veio com tudo o que na altura servia para trabalhar na obra. Antes de registar qualquer conversa o jornalista teve que meter as mãos no balde de água para poder começar a tomar notas.
As fotos que documentam este texto são do dia 18 de Setembro, a poucos dias da data marcada para a inauguração da escultura. Soubemos nesse dia que a data tinha sido adiada e que ainda não há nova data marcada.
Rui Fernandes confessou que se fosse preciso trabalhava de dia e de noite, para moldar os cerca de mil quilos de barro da escultura, mas que assim, com mais tempo, vai poder descansar as costas mais vezes.
O escultor da Golegã, nascido em Lisboa, considerado um mestre na escultura e na pintura, filho de Manuel Fernandes, de quem herdou a veia artística, e com quem aprendeu os valores mais importantes da vida e da arte. Foi surpreendido com a visita mas não se fez rogado em mostrar o seu trabalho e em explicar como é que a escultura vai ficar junto à Praça de Toiros, a assinalar uma data importante do espaço único na Chamusca: uma praça cheia de memórias de touradas e de outros espectáculos organizados pelas associações locais.
Enquanto conversá-mos Rui Fernandes fez questão de continuar a trabalhar para nos mostrar a grandiosidade da escultura mas também a forma como se molda uma Obra de arte. O escultor trabalha o barro com a mesma mestria que usa o pincel nas suas pinturas e aguarelas. A sua Obra é reconhecida em todo o país e no mundo.
O pretexto para a visita foi também a tentativa falhada de ver uma exposição de pinturas, esculturas e aguarelas, que Rui Fernandes organizou na galeria municipal da terra. Muito antes da data do encerramento o jornalista de O MIRANTE encontrou o espaço sempre fechado. Fomos à procura do pintor que, de forma generosa e amiga nos levou à galeria depois de pedir ao segurança que facultasse a entrada pelo interior do edifício dos Paços do Concelho da Chamusca.
Antes disso ouvimos a história atribulada desta exposição, que esteve inacessível ao público durante muito tempo. Foi inaugurada a 18 de Julho, mas sem cerimónia, e reaberta a 3 de Agosto, véspera da corrida de toiros que assinalou o centenário da praça, já com alguns convidados e com o autor presente. A falta de pessoal para abrir a galeria estará na origem do encerramento da exposição muito antes do previsto. O escultor confessou que chegou a receber telefonemas de pessoas que queriam ver a exposição reencaminhando-as para os serviços da câmara que facilitavam a entrada pela porta do edifício principal.
Embora conheçamos bem o trabalho de Rui Fernandes, esta exposição tinha alguns trabalhos que marcam uma nova etapa na vida do artista, nomeadamente ao nível das aguarelas.
Rui Fernandes garante que estes novos trabalhos, que mostram uma nova dinâmica na sua obra, não são só de hoje. Há muitos anos que experimenta novas formas de valorizar os temas da lezíria, dos toiros e dos cavalos. Alguns quadros de que mais gostamos foram construídos sem a ajuda do lápis, do desenho que orienta os pincéis; Alguns têm já uma dezena de anos, mas só agora são mostrados. “Vivo da pintura e da escultura mas não sou escravo de uma moda ou de uma escola. Tenho uma cabeça livre para criar e quero mostrar que não fico agarrado só àquilo que dá dinheiro”, diz, enquanto explica a história de cada obra que esteve exposta na galeria municipal. A exposição incluía também obras já conhecidas e alguns troféus de sua autoria como o do Prémio Amália Rodrigues, entre outros.
Ao fundo da galeria marcava presença um quadro de Manuel Fernandes, que Rui Fernandes resgatou de uma associação da Golegã, a quem teria sido oferecido noutros tempos, e agora estava esquecido e desprezado numa cave. Rui está empenhado em continuar a trabalhar na sua obra mas também tem uma missão: organizar ou ajudar a organizar uma homenagem ao pai que tem quadros espalhados por muitas instituições da região, e que foi esquecido e apagado do mapa, de forma injusta tendo em conta a qualidade do seu trabalho e do seu percurso.