Vítor Brás: “tira-me do sério a cultura do suficiente instalada na sociedade”
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Vítor Brás tem 34 anos, é da Póvoa de Santa Iria e está entre os cem melhores médicos dentistas do mundo. Filho da professora Maria Gabriela, um rosto conhecido que ensinou gerações de povoenses a ler e escrever, diz ter orgulho na sua terra e homenageou-a com o nome da clínica que abriu em 2015: Clínica Morgado da Póvoa.
Nunca se focou apenas numa área de estudo, confessa-se uma pessoa criteriosa, perfeccionista e inconformada, que gosta de estar sempre na vanguarda da tecnologia. A implantologia é uma das suas paixões e avisa que há muita gente a ser enganada com marketing duvidoso nessa área.
Quando era pequeno tinha muitos sonhos: ser guitarrista, professor ou corrector da bolsa em Nova Iorque. Depois vi que a minha área é a saúde, sempre gostei muito de biologia. Fui para medicina dentária e ao mesmo tempo estudei música no Conservatório Nacional em Lisboa. Batalhei imenso para entrar em guitarra clássica. Nunca me foquei apenas numa área de estudo. Acabado o curso médico, quis logo abrir uma clínica e tirei uma formação em implantes. O meu objectivo era apenas dar planos de tratamentos aos pacientes e chamar outro colega para vir cá operar. Mas a implantologia acabou por me escolher a mim e não o contrário. Lembro-me ainda hoje do meu primeiro implante, quando percebi que era isto que queria fazer.
Sou nascido e criado na Póvoa de Santa Iria. A Póvoa sempre foi grande e uma cidade subúrbio. Não havia tantos supermercados mas conseguíamos fazer uma vida de rua. Na minha infância vivi mais na rua do que em casa. Hoje é ao contrário. Tive uma infância agradável, com boas memórias, e ainda hoje recomendo a Póvoa para viver e trabalhar. Não me via a viver e a abrir o meu negócio noutra localidade.
Cada boca é diferente e há sempre desafios a superar. Temos sempre de lidar com a adrenalina do momento. Dependo apenas da destreza da minha mão e nesta área temos de saber tomar decisões na hora. Há muita gente a ser vítima de marketing enganoso nesta área da implantologia. Quando me perguntam se trabalho com seguros, digo que só trabalho com dentes. Não gosto de engenharias financeiras. Trabalho com os materiais que eu decido, que acho melhores, e não estou constrangido por margens de lucro, acordos de seguradoras, nada. Só o paciente me importa.
Abri a Clínica Morgado da Póvoa em 2015 e o nome é uma homenagem à minha cidade. Fazemos medicina dentária avançada e tanto eu como a minha sócia temos muita formação. Fui considerado em Janeiro do ano passado um dos top 100 do mundo pelo Global Summits Institute, uma entidade que avalia médicos. Apareci no ranking e foi uma surpresa. A minha vida não é só o gabinete, também dou palestras, dou formação na área de cirurgia, nunca quis ser um anónimo. Sempre achei que o gabinete era muito pequeno para mim e por isso estou sempre a mexer-me.
Na clínica fazemos de tudo: tratamos da cárie até à colocação de dentes fixos num dia. Fazemos o que há de mais avançado na medicina dentária, incluindo implantologia. Em algumas horas a pessoa sai daqui com dentes fixos. No meu trabalho se o que aqui fazemos não for excelente então não vale a pena fazer. Sou criterioso e perfeccionista com a minha equipa clínica. Somos cinco dentistas, uma higienista e duas assistentes. E não é só o tratamento, é o acompanhamento. Os nossos clientes não pagam limpezas porque têm esse direito. Não é um desconto nem uma promoção.
Temos tecnologias avançadas, como a anestesia digital. É um grande avanço médico. É uma agulha específica que a pessoa nem a sente a entrar. O que dói na anestesia é o fluído anestésico a entrar e a distender os tecidos. Quando passamos um certo limite é isso que provoca dor. A máquina tem um sensor que dá a anestesia abaixo desse limiar, percebendo a resistência dos tecidos da pessoa e vai dando gota a gota abaixo do limiar da dor. E como é específico, abrange apenas o dente, já não vai para o lábio. Esta clínica é como uma casa na árvore. Se eu vir uma nova tecnologia num congresso quero-a.
O mercado evoluiu para as pessoas procurarem descontos e promoções, mas bom e barato não existe. Não podem pedir a um dentista com a minha formação e experiência que trabalhe a certos preços e com alguns materiais. Há dentistas que se sujeitam a isso porque não têm a minha experiência, o meu currículo, a minha formação. É a fome e a vontade de comer. As pessoas queixam-se mas na verdade quando escolheram a clínica onde fazer o tratamento fizeram-no com base no preço. Prefiro que me escolham com base no valor. Muita gente ainda não percebeu que o sorriso é o nosso cartão de visita. Não é apenas uma questão estética mas também de saúde. Algumas pessoas queixam-se do valor de uma limpeza oral mas se for preciso vão todos os meses à esteticista. Ainda há muita gente que não valoriza a medicina dentária.
Um implante é um substituto da raiz quando não há dente. É basicamente um parafuso que se coloca no osso. É importante conhecer a pessoa que se vai operar e não ser uma coisa instantânea. Já recusei colocar implantes a alguns clientes por desconhecer o seu historial. Preciso de uma cronologia, perceber a pessoa, as suas necessidades, é importante ter todo esse conhecimento antes de avançar para a cirurgia.
Gosto sempre de saber para onde quero ir e inspirar-me nos bons exemplos. Vou sempre ter sonhos profissionais. Estou orgulhoso do que construí mas nunca estarei satisfeito. O segredo para se ser empresário é a vontade de se fazer sempre mais. Para se ser empresário temos de estar sempre insatisfeitos e a querer melhorar. Uma empresa é como um filho. É essa inquietude que para mim define um empresário: fazer sempre um pouco mais do que o necessário. Tira-me do sério as pessoas que só fazem o suficiente. Instituiu-se a cultura do suficiente na nossa sociedade. Do “só me pagam para isto”. A conformidade. As redes sociais estupidificam-nos. Tira-me do sério a falta de espírito crítico.
Não podemos só estudar e fazer só o que se gosta: para mim isso é poesia. Temos de escolher a nossa carreira aliando o que se gosta à sua aplicabilidade no mercado. Temos de fazer algo palpável e concreto e saber como vamos contribuir com isso. Muita gente acaba engolida no sistema a fazer apenas o suficiente e perdemos inovadores e pessoas que podiam fazer a diferença. Durmo com a empresa todos os dias e nunca desligo. Deito-me e acordo a pensar em trabalho. Tenho sempre os neurónios activos. Nos poucos tempos livres que tenho, todos os dias acordo às 06h30 para treinar. É uma hora para mim.