Aeroporto para Lisboa: A “recomendação” de quem sabe (Seattle – cidade rica)
Fazer estudos completos (nada deixar de fora) e com contas que integrem o custo do desperdício e os limites da razoabilidade socioeconómica. Com os pés na terra.
Seattle percebe de aviação, é a cidade da BOEING.
A área metropolitana de Seattle tem 4,5 milhões de habitantes (Lisboa 3 milhões) e a cidade é um relevante polo turístico. O volume de passageiros aéreos antes da pandemia foi de 52 milhões (Lisboa 31 milhões).
1 - Seattle reduziu a operação do aeroporto inicial quando construiu o HUB Tacoma
A cidade começou com o aeroporto King´s County perto do centro, cuja pista ficou “dependente” das posteriores pistas do HUB Tacoma (que ficou próximo), contexto aéreo similar aos dois existentes aeroportos de Lisboa (Portela e Alverca).
Com a abertura do HUB Tacoma, o aeroporto inicial (250ha-pista 3.050m) ficou para carga, aviação geral, apoio à Boeing e, ainda, para o “Air Force One” quando o presidente se desloca à região.
2 - HUB Seattle-Tacoma tem 1.000ha e uma capacidade de 70-75 milhões de passageiros
O hub é a base operacional da Air Alaska (o dobro da frota da TAP), a que acresce ainda ser a base da Delta para Ásia-Pacífico. O aeroporto está a 18km do centro, tem três pistas paralelas próximas (capacidade 90mov/h) e com a área de 1.000ha vai atender uma procura superior à de Lisboa.
3 - HUB Alverca-Portela 1.650ha-105movimentos/hora supera HUB Seattle-Tacoma 1.000ha-90movimentos/hora
a) Em Lisboa é ainda hoje possível rodar a pista de um aeroporto (Alverca) para ficar paralela à do outro (Portela), o que se deve ao aeroporto mais antigo (sorte única) estar encostado ao estuário mais largo da Europa. É o que se fez em Paris décadas atrás, uma pista do aeroporto Bourget rodou para ficar paralela às pistas do aeroporto Charles de Gaulle.
b) Colocar as pistas de Alverca e Portela paralelas e dispor de uma largueza em Alverca que permite baixar Portela a “city airport” são mais-valias que em Seattle são impossíveis por não haver espaço nem para rodar pistas nem para aumentar a área em qualquer dos dois aeroportos.
c) Em termos de aviação comercial, no HUB Alverca-Portela, a área e a capacidade do sistema aéreo são incrementais, começando com 1.210ha e 90mov/h e indo até 1.650ha-105mov/h, o que compara com o HUB Seattle 1.000ha-90mov/h.
No último artigo escrevemos que escolher CT Alcochete-7.500ha, mais comprar outro terreno de 7.500ha para colocar o campo de tiro, era uma tão grande insensatez que só era entendível a mando de alguém poderoso, tendo prometido voltar ao assunto. O impulsionador é conhecido, basta relembrar o artigo do jornal Público de 17/6/2007. Mas o modo como se chega à decisão, suspensão e retoma de CT Alcochete nunca foi clarificado e é a essa tarefa que propomos nos próximos artigos, onde iremos complementar a vertente técnica com o ir desenrolando o fio à meada até se chegar à CTI.
4 - Fusão Alverca-Portela afeta 25 vezes menos pessoas que os dois aeroportos de Seattle
As pistas paralelas, o balanço de tráfego Alverca 75%-Portela 25%, a radical reestruturação funcional da Portela e a fusão das duas plataformas, proporcionam uma virtuosa complementaridade que o elevará ao top europeu em eficiência de pista e em redução de ruído, baixando para um total de 150 pessoas afetadas acima de nível 65dB.
Em Seattle, no mesmo nível de ruído, os dois aeroportos afetam 3.900 pessoas.
5 - Seattle é mais uma prova, por um lado, do desvario megalómano da CTI e, por outro, do ajuste da solução HUB Alverca-Portela às reais necessidades do país.
Seattle é a grande cidade EUA com o PIB per capita mais alto, o que significa que tem dinheiro. É berço da Boeing, da Microsoft, da Amazon, da UPS e da Starbucks, o que significa que tem ambição. O seu porto movimenta 7-10 vezes mais carga que o de Lisboa, o que significa que é um grande polo logístico. E alberga as gigantes “Joint base Lewis-Mcchord” e a base naval Bangor, o que significa que é um grande complexo militar.
Tudo é superlativo em relação a Lisboa, exceto uma coisa: o mega aeroporto da Comissão Técnica “Independente” (CTI), grosso modo com uma área de 5.000ha, espantosamente cinco vezes maior que o HUB Seattle-Tacoma. Isto é mais que pôr-se em bicos de pés, é voltar a entrar no domínio do absurdo que nos levou à troika.
Aeroporto CT Alcochete: O que torto nasce, mal ou tarde, ou nunca, se endireita
No último artigo escrevemos que escolher CT Alcochete-7.500ha, mais comprar outro terreno de 7.500ha para colocar o campo de tiro, era uma tão grande insensatez que só era entendível a mando de alguém poderoso, tendo prometido voltar ao assunto. O impulsionador é conhecido, basta relembrar o artigo do jornal Público de 17/6/2007. Mas o modo como se chega à decisão, suspensão e retoma de CT Alcochete nunca foi clarificado e é a essa tarefa que propomos nos próximos artigos, onde iremos complementar a vertente técnica com o ir desenrolando o fio à meada até se chegar à CTI.
Episódio 1 - 17/6/2007: o dia em que o país soube que o impulsionador do mega CT Alcochete foi o primeiro-ministro (José Sócrates) e que, para atingir o seu desígnio, ele eliminou à partida as soluções duais
A revelação foi numa entrevista ao jornal Público do então presidente da Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), na qual ele disse que o primeiro-ministro lhe tinha “pedido” para fazer o estudo de uma alternativa ao aeroporto na Ota. Um pedido que, vindo de quem vinha, era mais uma ordem, e até já com o desenho das traves-mestras:
a) Não integrar as soluções duais, vincando, expressamente, que não queria a Associação Comercial do Porto e a Confederação do Turismo Português no processo (ambas defendiam o aeroporto da Portela em solução dual). Queria apenas a CIP.
b) Ter um muito, mas mesmo muito, grande aeroporto de raiz na margem sul, em localização nunca avaliada.
A “desculpa” do presidente da CIP para não se estudar soluções duais foi que o dinheiro de que dispunha não dava para mais do que estudar localizações de raiz na margem sul
A encomenda à CIP não era paga, logo o estudo tinha de ser contido. O que ficou bem claro na entrevista do presidente da CIP ao Público, quando foi questionado quanto ao facto de o estudo não contemplar alternativas Portela + 1; citamos a desculpa então dada do “investimento elevado que um trabalho destes exige, tornando inviável abranger mais possibilidades de localização”.
Um processo que começou com a “desculpa” que o dinheiro não dava para mais que um singelo estudo, teve como resultado a mais cara localização da história da aviação
Olhando para trás, é simplesmente extraordinário como tudo começa com um primeiro-ministro que, para “poupar” dinheiro, pede um estudo a uma entidade sem experiência, a qual, por sua vez, não tem dinheiro para fazer um estudo completo e, no fim, graças à ligeireza, o resultado veio a ser a mais cara plataforma da história da aviação (hoje 10 mil milhões de euros).
Como isto foi possível será o tema para os episódios dos próximos artigos.