Opinião | 19-09-2023 17:05

Aeroporto Alcochete/ponte Chelas-Barreiro: O pico da “exuberância irracional” 2007-2010 foi uma orquestrada falta de imparcialidade

A crise financeira começou em 2007 e a falência do banco Lehman Brothers deu-se em 15/9/2008. Por incrível que pareça, passados seis meses, em pleno cataclismo financeiro, o sobre endividado Portugal lançou o concurso para a maior ponte rodoferroviária mundial.

A crise financeira começou em 2007 e a falência do banco Lehman Brothers deu-se em 15/9/2008. Por incrível que pareça, passados seis meses, em pleno cataclismo financeiro, o sobre endividado Portugal lançou o concurso para a maior ponte rodoferroviária mundial.

Lembramo-nos da crise que começou em meados de 2007 e atingiu o clímax em 2008 por que ainda sofremos na pele os efeitos, passados todos estes anos!

Mas será que nos lembramos, que entre janeiro e abril de 2008, o governo aprovou o maior aeroporto europeu e a maior ponte rodoferroviária mundial ? E que, com o país à beira do precipício (intervenção troika), o governo, mesmo assim, ainda lançou o concurso da mega ponte Chelas-Barreiro?

E será que então nos apercebemos que a defesa de um espantoso estrago de 15.000ha para um aeroporto de 1.200ha (8%) pelo LNEC (equipa) sem expertise aeronáutica é que levou ao sonhador modelo-referência de um grande aeroporto com acoplada mega cidade-aeroportuária, conceito teórico irrealista no país e no contexto de um aeroporto a 50km do centro/descentrado da procura?

E que foi também a falta de expertise aeronáutica que levou o LNEC (equipa) à utopia de quatro pistas para 42 milhões de passageiros (uma pista operacional chegava)?

E, ainda, será que na altura nos demos conta que foram os idílicos cenários desenhados pelo próprio LNEC (equipa), que consolidaram a ponte Chelas-Barreiro com a soma de seis faixas rodoviárias?

Hoje, é muito claro que o LNEC (equipa) foi o instrumento do “sistema” para justificar projetos que a dimensão/perfil do país não justificava e o estado das finanças proibia

Para justificar a cumulativa tripla megalomania, no vocabulário económico “um pico de exuberância irracional”, o LNEC (equipa) manejou, com destaque, entre outras coisas, os princípios e critérios de avaliação (então a cargo da só agora muito conhecida Rosário Partidário).

O sucesso do justificativo fica claro nas palavras do ministro Mário Lino, citamos, “face aos objetivos do mandato e aos princípios e critérios em que assentaram as análises, conclui-se que a ligação Chelas-Barreiro se apresenta como claramente mais favorável para a travessia ferroviária do Tejo na Área Metropolitana de Lisboa” e, ainda, “Conclui-se também que é viável e justificável a associação de uma componente rodoviária a esta travessia”.

Ponte rodoferroviária Chelas-Barreiro: a ponte irracional que não servia para nada

Será que os portugueses se aperceberam do absurdo dos critérios que conduziam um pequeno país como Portugal a construir, na época, a que seria a mais extensa ponte de grande altura com quatro linhas férreas e seis faixas rodoviárias? E que, ainda hoje, essa ponte lisboeta se manteria no primeiro lugar mundial?

Será que tal irracionalidade não deveria ter levado o LNEC (equipa) a reponderar um HUB na margem norte (90% das viagens aéreas), olhando para Alverca com uma curta ponte ferroviária sobre o canal das barcas (800m) para o AV Lisboa-Madrid em bitola europeia?

Será que na altura não era irracional a carga com destino ao norte entrar em Lisboa, atravessar a G. Oriente e percorrer o congestionado trecho até ao Carregado?

Será que na época não era irracional ter uma mega ponte apenas e só para uma pequena parte do tráfego casa-trabalho de Barreiro-Moita (na maioria melhor servido pela ligação fluvial ao T. do Paço)?

E será que não era irracional ter na bacia de manobras do porto de Lisboa uma ponte de 42m de altura livre (não podia ter mais) quando os navios de cruzeiros caminhavam para 70m de altura?

Vira o disco e toca o mesmo: o retorno da escandalosa falta de imparcialidade

A criadora dos critérios da escolha de Alcochete pelo LNEC (equipa), de quem o seu ex-presidente (Matias Ramos) disse que o que ele queria só ela em Portugal podia dar (o triunfo de Alcochete), voltou, pasmemos, na presidência da Comissão Técnica “independente” (CTI), para julgar em causa própria.

Aeroporto CT Alcochete: O que torto nasce, mal ou tarde (ou nunca) se endireita

Episódio 2: O primeiro-ministro José Sócrates – o mentor de CT Alcochete – matou qualquer hipótese de imparcialidade do processo logo à nascença

CT Alcochete era um desígnio pessoal, não do país. Para vir à ribalta de forma “independente”, não podia usar o aparelho do Estado. A “iniciativa” de lançar CT Alcochete tinha de ter o cunho de uma desvinculada entidade privada. Para dar a cara (e pagar), José Sócrates escolheu a Confederação da Indústria Portuguesa (CIP).

Na época a falta de imparcialidade não era obstáculo. O mentor era José Sócrates, o primeiro-ministro “quero, posso e mando”. Os executantes foram escolhidos à conveniência do fim.

Os singelos estudos eram um proforma e não havia qualquer receio de ferir a imparcialidade, como demonstra o exemplo muito falado na altura: a coluna vertebral da decisão, o “ordenamento do território”-CIP e a “metodologia da avaliação ambiental estratégica e contributos sectoriais”-LNEC estava afinal a cargo de um casal que, assim, estava com um pé nos dois lados que se queriam independentes.

Rosário Partidário (equipa LNEC), quando questionada, referiu a sua recusa inicial porque, citamos, “podia parecer como uma possibilidade de incompatibilidade” e que só tinha cedido, citamos, ”O presidente do LNEC dizia que o que ele queria só eu em Portugal podia dar”.

Os projetos megalómanos do pico de “exuberância irracional” 2007-2010 num país à beira da bancarrota são a evidência do que nunca mais se deveria repetir

O cúmulo foi o “sistema” conseguir justificar a maior ponte do mundo do seu género sem ela servir para nada com um aeroporto na margem norte. Não haja dúvida, a salvação do país foi in extremis (concurso anulado em 15/5/2010) por causa da crise financeira. Se não fosse a troika parar o "sistema", estaríamos hoje a alimentar uma manada de elefantes brancos.

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