Chineses acusados de concorrência desleal
Grossistas e comerciantes de Samora criticam passividade dos fiscais
Os empresários chineses estão a colocar os olhos em bico aos portugueses. Uma associação de grossistas formada a partir do Hiper Centro, Norte e Sul de Samora denunciou vários armazéns, alegadamente, ilegais. Grossistas e comerciantes falam de uma concorrência desleal que ameaça centenas de postos de trabalho nas lojas e nas fábricas que, por causa disso terão reduzido a produção para metade nos últimos dois anos. Os empresários portugueses criticam a passividade das autoridades. Os chineses dizem-se alvo de racismo e já pediram a colaboração da Embaixada da China em Lisboa.
Um grupo de grossistas e comerciantes da região de Samora Correia acusa os empresários chineses instalados na zona de concorrência desleal e critica a passividade das entidades fiscalizadoras. Os empresários vindos da China garantem que se esforçam para cumprir a lei e falam de uma campanha racista. A Embaixada da China está a acompanhar a situação e promete apoiar os investidores Chineses em Portugal.Um movimento que emergiu no Hiper Grossista Centro, Norte e Sul (CNS), instalado há vários anos na Zona Industrial da Murteira em Samora, está a formar a Associação de Grossistas de Portugal (AGP). A associação, que está pronta a realizar a escritura notarial para registo oficial, irá reunir mais de mil associados, entre grossistas, comerciantes e fabricantes de têxteis, sapatos, acessórios de moda e brinquedos. A AGP surgiu com a necessidade dos empresários se agruparem para combaterem a concorrência dos empresários asiáticos.Segundo Cidália Gonçalves, porta-voz da comissão instaladora da AGP, só no Hiper de Samora estão em risco cerca de 120 lojas das quais dependem directamente 500 pessoas. Mas as consequências poderão ser mais graves se continuarem a ser feitos cancelamentos de encomendas nas fábricas que empregam milhares de trabalhadores. “Isto é uma bola de neve que vai ter graves consequências para o país”, explica António Cruz, um dos cinco administradores do Hiper CNS.Cidália Gonçalves, que é também administradora da sociedade, tem dado a cara numa autêntica cruzada contra o comércio ilegal. “Nós não temos nada contra os chineses, eles são bem vindos se pagarem impostos como nós e se trabalharem com as mesmas regras.”.A empresária denuncia a existência de, “pelo menos”, seis armazéns ilegais de artigos chineses na freguesia de Samora. Os pavilhões, que são antigos armazéns e fábricas, vendem de tudo um pouco. “Sem facturas e sem pagarem qualquer imposto”, acusam os empresários.A grossista acrescenta que os trabalhadores, na sua maioria “chineses ilegais”, são sujeitos a horários de trabalho alargado, sem garantias e condições mínimas. “ Alguns comem e dormem nos próprios armazéns onde trabalham 16 horas por dia. É uma autêntica escravatura branqueada pelas autoridades”, afirma.“Só desta forma eles podem vender camisolas a dois euros e calças a cinco euros”, acrescenta António Pereira, um empresário de 34 anos que explora uma das lojas do hiper de Samora e emprega 35 operárias numa fábrica têxtil no Norte. “Se isto continuar assim vou ter de despedir pessoal na fábrica. O produto não está a ter saída”, refere.Os empresários dizem que são sujeitos a fiscalizações periódicas das finanças, Inspecção Geral do Trabalho e autoridades policiais. Para conseguirem licenciar o hiper e as lojas tiveram de cumprir medidas rigorosas que obrigaram a grandes investimentos antes da abertura das portas. “Se a minha carrinha circular com seis camisolas sem uma factura com toda a descrição, sou multada. Eles andam com carrinhas cheias, sem guias e sem facturas, e não lhes acontece nada”, acusa Cidália Gonçalves. A empresária estranha a passividade das autoridades fiscalizadoras e fala na existência de “redes de comércio chinês muito fortes em Portugal”.Quarenta lojas instaladas numa antiga fábrica em Porto Alto China 2000 é o elo mais forteUm pórtico chinês e vários placards publicitários anunciam a venda de produtos chineses, um bar e um restaurante. O “China 2000” é um centro comercial chinês que tem o nome de grossista, mas vende de tudo, a toda a gente e independentemente das quantidades. A situação é referida num relatório do jurista da Câmara de Benavente emitido em 2 de Dezembro de 2002, após visita ao local.Um jornalista de O MIRANTE colocou-se no lugar de um cliente e, na semana passada, entrou no “cash and carry” sem que lhe fosse pedida qualquer identificação. Comprou o que tinha a comprar e quando foi a pagar viu-lhe negada a factura que é obrigatória em qualquer transação comercial. “Hoje não tenho factura. Você vem cá amanhã?”, questionou a empregada.O nosso jornal apurou que esta é uma prática corrente e teve acesso a uma factura emitida a 15 de Janeiro de 2003 onde a mercadoria foi facturada com uma taxa de IVA de 17 por cento, quando a taxa em vigor já era há muito de 19 por cento. No documento foram facturadas seis t-shirt’s, mas não aparece a composição da mesma, que é uma obrigação legal. Em caso de fiscalização o empresário responsável pela loja seria alvo de uma coima e de um processo de contra-ordenação.A fuga aos impostos é apenas uma das acusações que recai sobre o centro comercial que ocupa um edifício industrial com uma área coberta de mais de 3.200 metros quadrados. A comissão instaladora da Associação Portuguesa de Grossistas afirma que “o estabelecimento não está legalizado e funciona sem condições de segurança”.Cidália Gonçalves, porta voz dos grossistas, denunciou a situação junto da Câmara Municipal de Benavente. No dia 6 de Janeiro, a autarquia ordenou o seu encerramento. Segundo o presidente, António Ganhão, não havia projecto de segurança e condições mínimas para funcionar. O edil disse ainda que foi feito um piso intermédio que servia de arrecadação que não estava legalizado.O proprietário, Chen Liao, um empresário de 40 anos que é também proprietário de dois pisos de lojas nos centros comerciais Martim Moniz e Mouraria, ambos em Lisboa, recorreu da decisão e comprometeu-se a legalizar a situação. Enquanto o processo decorria, Chen Liao pediu a ajuda da Embaixada da China que intercedeu no sentido do presidente da câmara receber o empresário e o embaixador. António Ganhão disponibilizou-se a recebê-los, mas só depois da situação estar legalizada. Num tempo recorde, em cerca de 15 dias, o empresário conseguiu a aprovação do Serviço Nacional de Bombeiros e fez algumas alterações impostas pelos serviços de arquitectura da Câmara Municipal de Benavente. Segundo o presidente da câmara, uma vistoria feita no local pelos técnicos da protecção civil, arquitectura e serviços jurídicos da câmara concluiu que estavam reunidas as condições mínimas. Com base neste parecer técnico, o executivo municipal decidiu dar autorização precária para a reabertura do centro comercial. António Ganhão garantiu que a câmara vai continuar vigilante e não pactuará com “ilegalidades”.Cidália Gonçalves diz que a câmara foi enganada pelos serviços técnicos e garante ter provas de que o centro comercial continua a funcionar ilegalmente. “Eu desafio a câmara a visitar o local e o senhor presidente vai perceber que foi enganado pelos técnicos”, refere.A empresária afirma que um das questões que terá influenciado a câmara foram os 60 postos de trabalho prometidos pelo empresário chinês, mas a grossista desafia a câmara a investigar quantos trabalhadores são portugueses e quantos estão legalizados. “Só lá estão dois trabalhadores portugueses e a maioria está ilegal”, afirma.Segundo informação do presidente da câmara, tem havido um esforço por parte do proprietário para legalizar o espaço. Os projectos de arquitectura e segurança estão em fase de conclusão e estão asseguradas as condições mínimas de funcionamento.Quanto à questão da concorrência desleal, António Ganhão disponibilizou-se para ajudar os comerciantes e grossistas a combater as ilegalidades. “Há regras que são para todos. Não podemos pactuar com uma concorrência desleal que assente em princípios condenáveis”, diz.
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