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A terra de António Botto

A terra de António Botto

Concavada é uma das mais pequenas freguesias do concelho de Abrantes

Concavada, pequena aldeia à beira Tejo é conhecida por ali ter nascido António Botto (1897-1959), poeta perseguido pelo regime de Salazar. A maioria dos filhos da terra que viveu do rio e do que a terra dava procura hoje sustento noutras paragens.

Da época em que os “Cuncas” subiam o rio para fazer cavadas nas quintas à beira Tejo até ao nascimento da aldeia de Concavada devem ter passado largas dezenas de anos. O certo é que uma das origens do topónimo desta aldeia e sede de freguesia do concelho de Abrantes é atribuída ao nome dessa família de cavadores que ainda hoje existe na terra.Concavada nasceu à sombra de grandes quintas – Casal Cortido, Casal da Coelheira, Monte Velho, Galhofa e Monte Novo, entre outras - e do rio. Pescadores, fragateiros e trabalhadores rurais foram construindo as suas casas onde podiam. Quem circula na estrada que liga Pego e Alvega e atravessa Concavada não imagina o emaranhado de ruas e becos que existe do lado esquerdo. São casas térreas de pedra rebocada, com grossas empenas, construídas nos quintais, obedecendo apenas às dimensões dos terrenos. De um momento para o outro uma ruela estreita-se porque uma casa saiu do alinhamento.Foi nesta aldeia, elevada a freguesia em Julho de 1985 por desanexação da freguesia de Alvega, que nasceu António Botto - o poeta perseguido pelo regime de então e expulso da função pública por ser homossexual. Na casa onde nasceu, numa esquina no meio da aldeia, foi colocada uma lápide e no largo principal, à beira da estrada nacional, a junta de freguesia homenageou-o com um busto em bronze.Concavada é uma das freguesias mais pequenas do concelho de Abrantes, tão pequena que teve de incluir o lugar Ribeira do Fernando a fim de ter área e população suficientes para ser autónoma. Tem 590 eleitores, apurados nas legislativas de 20 de Fevereiro, e cerca de 800 habitantes, num território de 19,2 quilómetros quadrados. Apesar disso as escolas estão cheias e um dos projectos do presidente da junta, José Maria Rebelo Ferreira (PS), é a construção de uma nova sala de aulas. Há mais de 50 crianças em idade escolar. “Há muita gente nova, no ano passado nasceram mais 9 ou 10 crianças. Numa freguesia tão pequena é muito”, comenta o autarca.Quando a freguesia foi criada, nem todos os residentes de Ribeira do Fernando concordaram em passar para uma nova freguesia. Sempre tinham pertencido à freguesia de Alvega e aí queriam continuar. Mas com o passar do tempo “só tiveram a ganhar”, diz o autarca e justifica: “A freguesia de Alvega é muito grande não havia tempo para cuidar de todos os lugares”.Concavada tem saneamento básico, para além de água e luz, e as estradas estão alcatroadas. Em toda a freguesia só falta pavimentar dois arruamentos e situam-se na sede. Na Ribeira do Fernando, José Maria Ferreira quer construir uma casa mortuária.As rivalidades com Alvega, que também fomentaram a cria-ção da freguesia de Concavada, esbateram-se com o tempo. A nível da terceira idade os idosos de Concavada são apoiados e utilizam os equipamentos sociais de Alvega, a dois quilómetros de distância. “Estamos bem servidos não se justifica criar equipamentos desses em Concavada”, continua o presidente da junta.Muito mais grave e de difícil resolução é a inexistência de médico na freguesia. O posto médico, que faz parte do edifício da junta de freguesia, foi inaugurado em 1993, mas nunca teve um médico efectivo. Durante algum tempo, um casal de médicos de Alvega ia particularmente à Concavada. Depois, por motivos particulares, deixaram de ir, e a Sub-Região de Saúde de Santarém nunca encontrou um clínico que quisesse trabalhar na aldeia.“É de facto um grande problema e, para além do posto estar ali sem ser utilizado, de Concavada para Alvega não há transportes regulares. As pessoas têm de deslocar-se pelos seus próprios meios”, esclarece o autarca, adiantando que por vezes a carrinha da junta serve para fazer essa deslocação.A primeira pedra do edifício sede da junta foi lançada em 1990 e a sua construção foi financiada pela Central do Pego, mas só três anos depois foi inaugurada. De 1985 até 1993, a sede da junta funcionou numa garagem, onde foi colocado um balcão para atendimento.Vinte anos depois, a freguesia tem uma funcionária que de tarde trabalha para a junta e de manhã para os correios. “Na freguesia havia um posto público num estabelecimento comercial que entretanto fechou, para não ficarmos sem esse serviço entramos em acordo com os CTT e transferimos o posto para a junta”, esclarece José Maria Ferreira.Os habitantes de Concavada trabalham na construção civil, na Central do Pego ou na região. O rio já não dá sustento a ninguém e a emigração para Lisboa, em grande parte devido às pessoas que trabalhavam nas fragatas – os fragateiros – também acabou. Alguns deles regressaram à aldeia quando chegaram à reforma e a capelinha tipo mausoléu construída junto ao Tejo em honra de Nossa Senhora da Guia continua a recordar os tempos em que o rio era a principal via de comunicação.A agricultura está em decadência, algumas das grandes quintas estão ao abandono. Dos nove lagares que chegaram a existir na aldeia nenhum resta. Concavada já não vive nem do rio, nem da terra.Margarida Trincão
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