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Uma terra onde as pessoas têm casas em terrenos que não são delas

Uma terra onde as pessoas têm casas em terrenos que não são delas

O imbróglio de grande parte da freguesia de Fajarda pertencer a uma família

A freguesia da Fajarda, concelho de Coruche, nasceu do aforamento dos terrenos da Herdade da Fajarda da família Roquete. O arrendamento de lotes por cem anos resultou num imbróglio devido à divisão e subdivisão dos terrenos onde foram sendo construídas casas por filhos, netos e bisnetos dos arrendatários. Agora grande parte da localidade pertence ainda a uma família onde há casas de outros.

Ernesto Lopes está a amanhar a horta numa das ruas da Fajarda num dos poucos terrenos que está legalizado. Teve a sorte do seu avô ter comprado há muitos ano o lote de terra à família Roquete, dona de muitos hectares de terrenos de cultivo que constituíam a Herdade da Fajarda, no concelho de Coruche. Num tempo em que as transmissões de propriedades eram feitas por boca, Ernesto é dos habitantes que se contam pelos dedos que possui uma escritura e que está livre de um imbróglio administrativo e jurídico criado com o aforamento dos terrenos no século XIX e que afecta grande parte das gentes da localidade.A família Roquete arrendou lotes de 18 mil a 20 mil metros quadrados por cem anos. As pessoas foram construindo casas nos terrenos numa altura em que apenas era exigida uma autorização do dono do espaço. Os arrendatários foram dividindo as terras pelos filhos, pelos netos que construíram também habitações. Após a revolução do 25 de Abril de 1974, recorda o presidente da junta Ilídio Serrador, as pessoas deixaram de pagar rendas. Hoje grande parte dos habitantes tem casas em terrenos que continuam a pertencer à família Roquete. Houve alguns que ainda conseguiram comprar as terras após o 25 de Abril a dez escudos (cerca de cinco cêntimos) o metro quadrado. As últimas parcelas vendidas foram a 40 escudos (20 cêntimos), conta Ilídio Serrador. Hoje o valor é muito mais alto. Há 20 anos a junta de freguesia comprou o espaço de três hectares onde está a sede e outros equipamentos públicos por 15 mil euros. A situação está a criar vários problemas bem conhecidos da engenheira da Câmara de Coruche, Ana Cristina Pereira, que é da Fajarda, onde vive, e das que tem a sua situação legalizada graças à sua bisavó Quitéria que foi das poucas que assinou uma escritura de compra da propriedade. As pessoas pagam o Imposto Municipal sobre o Imóvel (IMI) das casas mas a parte rústica (terrenos) não estará a ser paga até porque as Finanças são confrontadas com uma grande confusão com os limites e áreas das propriedades. Que o diga um avaliador das Finanças que anda às voltas com algumas situações em que não se consegue descobrir os limites das propriedades porque a única informação escrita existente diz apenas “que o espaço confina por todos os lados com o dono”, refere a engenheira.Vender as casas pode ser uma tarefa difícil ou mesmo impossível. Em terrenos em que há casas de vários familiares se um deles for penhorado as casas dos outros podem também ficar penhoradas. E há situações em que, mesmo com a compra dos lotes aos Roquete, são quase impossíveis de resolver. “Tivemos há pouco tempo uma situação de um terreno com várias casas de vários proprietários em que se tinha que dividir os espaços”, conta Ana Cristina Pereira. Para regularizar administrativamente a situação é preciso fazer destaques das parcelas. O problema é que “a legislação só permite que se faça um destaque de 10 em 10 anos”. Para complicar ainda mais há casas que nunca foram registadas, salienta o presidente da junta. O autarca a cumprir o quinto mandato é um dos afectados. Nasceu na casa feita pelo pai no terreno arrendado e onde sempre viveu. Ilídio Serrador diz que até estaria disponível para comprar o terreno para legalizar a situação, mas não a preços actuais. E ainda há as benfeitorias realizadas. O espaço tem um pomar, foi sendo melhorado ao longo dos anos. “Há que ter em conta também a valorização do terreno. A solução, para o presidente da junta, pode passar por duas hipóteses. Ou o usucapião, direito a adquirir a posse de um bem imóvel por uso deste durante determinado tempo, o que se pode revelar complicado porque os Roquete podem vir contestar a acção. Ou então, e talvez o melhor, haver um acordo com a família que seja vantajoso para a população.Fajarda tem menos de dois mil habitantesA Freguesia de Fajarda tem 53,9 quilómetros quadrados, ocupando a parte noroeste do concelho de Coruche. Segundo os últimos censos tem 1839 habitantes. É atravessada de nascente a poente pela Estrada Nacional 114-3 que liga Coruche a Salvaterra de Magos e de sul a norte pela Estrada Municipal 581 que faz a ligação a Glória do Ribatejo, sendo também atravessada no mesmo sentido pela linha ferroviária que faz a ligação entre Setil e Vendas Novas. Engloba a Herdade do Cascavél, parte da Herdade da Agolada e as herdades ribeirinhas de Gravinha, Courela do Outeiro, Chão Barroso, Parreira, Vale Covinho, Zambaninha, Gamas, Amieira, Montinho do Picamilho, S. Romão, Machada, Calabre, Torre da Falcôa, Rebolo, Vinagre, Maria de Ciso, Colmeeirinho, Colmeeiro, Coelhos, Courela da Misericórdia e Cabide.
Uma terra onde as pessoas têm casas em terrenos que não são delas

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