O Tejo está mais limpo mas tem menos peixe
Avieiros da Póvoa de Santa Iria continuam a viver do que o rio lhes dá. Chegaram ao Ribatejo no início do século XX, provenientes de Vieira de Leiria, em busca de melhores condições de vida. Junto ao Tejo foram criando as suas comunidades e ficaram conhecidos para a posteridade como avieiros. No bairro de pescadores da Póvoa de Santa Iria há descendentes dessas famílias que ainda têm a pesca como primeira ocupação.
António José, 54 anos, pertence à terceira geração de avieiros. O pai já nasceu no Ribatejo e António continuou a tradição de família. Desde os 17 anos que vive do que o rio lhe dá. Ao longo destas mais de cinco décadas de vida tem acompanhado o desenvolvimento da Póvoa de Santa Iria e apesar de reconhecer que actualmente há menos poluição no Tejo, diz também que há menos peixe.
“Parece um paradoxo mas não deixa de ser verdade, havia esgotos a céu aberto, havia a siderurgia, mas o peixe estava lá. Ainda assim a poluição continua a afectar o nosso trabalho. Este é um santuário onde o peixe faz a desova, se as águas não estiverem em condições o peixe não entra aqui”, diz a O MIRANTE durante o quinto Convívio de Avieiros da Póvoa de Santa Iria, que se realizou no domingo, 17 de Julho, organizado pela Associação Cultural dos Avieiros da Póvoa de Santa Iria (ACAPSI).
Apesar de representar uma das famílias mais antigas dos avieiros da Póvoa, António confessa que os filhos não vão seguir as mesmas pisadas e que o futuro ligado à pesca está em vias de extinção. “Um jovem que queira fazer vida da pesca agora é impensável. Nunca vi um ano tão escasso de peixe”, refere o pescador. “Na década de 80 dava gozo pescar aqui, foi uma época muito rica, sentíamo-nos realizados. Fazia a pesca de vara e apanhava linguados e enguias. Agora se quero comer enguias tenho de comprar a colegas meus”, lembra António, que agora se foca na pesca da corvina e robalo.
Antes da requalificação da zona ribeirinha os pescadores da Póvoa de Santa Iria viviam numa comunidade própria, distante do resto dos povoenses. Desde essa obra da Câmara de Vila Franca de Xira, os pescadores passaram a fazer parte da cidade, mas nem todos vêem essa mudança com bons olhos. “É uma moeda de duas faces. Deixámos de estar isolados, mas agora fomos invadidos, perdemos a nossa privacidade e identidade”, refere António.
Para o presidente da ACAPSI, Fernando Barrinho, a requalificação da zona ribeirinha veio dar uma imagem diferente dos pescadores aos povoenses. “A população na altura tinha receio do bairro de pescadores e agora deixámos de estar fechados e acabamos por estar mais enraizados na cidade. Esta zona é um ex-libris da Póvoa de Santa Iria e, além de protegermos o património piscatório, protegemos também a própria zona do passeio ribeirinho. Vem muita gente vandalizar os armazéns à noite e acabamos por ser nós a aparecer e mandá-los embora”, assume Fernando, de 48 anos.
A ACAPSI organiza há cinco anos o Convívio de Avieiros. Este ano houve pescadores provenientes do Alentejo e até mesmo de Espanha. Cerca de 140 participaram no evento.
Repórter alvo de tentativa de assalto
Na deslocação para a Associação Cultural de Avieiros da Póvoa de Santa Iria, o repórter do O MIRANTE foi abordado, na estação de comboios da Póvoa, por dois jovens que o tentaram assaltar. Seguiram o repórter até à rua de acesso ao bairro dos pescadores, onde o agrediram com um murro. Os agressores acabaram por não levar nada e já foi apresentada queixa na Polícia de Segurança Pública (PSP).