Na Granja o São Sebastião festeja-se no Verão
Romaria popular às portas de Lisboa atrai milhares de pessoas no último fim de semana de Julho. Na localidade da freguesia de Vialonga não faltam os bailaricos, a quermesse e tudo o resto a que um arraial popular dá direito. A festa anual é pretexto para o reencontro de familiares e amigos e muitos jovens dizem que é melhor do que ir para a noite lisboeta.
O dia litúrgico de São Sebastião assinala-se a 20 de Janeiro, mas na Granja, localidade da freguesia de Vialonga, concelho de Vila Franca de Xira, o santo é celebrado em Julho. Porque as festas são como o Natal: quando o homem quiser. E as festas e romarias calham melhor no Verão, quando o estado do tempo é mais propício à diversão e à folia.
Estamos às portas da cosmopolita Lisboa, capital do país, mas o ambiente podia perfeitamente ser de uma qualquer aldeia em festa do Portugal mais profundo, porque arraial que se preze tem iluminações garridas, música de baile, pares (por vezes só de mulheres) a dançar, crianças em alegres correrias, quermesse e comes e bebes com fartura.
Nos dias 29, 30 e 31 de Julho a Granja foi palco das suas festas populares em honra ao padroeiro São Sebastião, depois de um acordo com a Igreja realizado há muitos anos ter permitido transferir a celebração para o Verão. Na noite de sexta-feira, o largo em frente à Associação Recreativa da Granja - entidade organizadora do evento - encheu-se de gente.
“Esta é uma localidade com muita malta nova cá a viver e cada vez tem vindo a crescer mais. Sim, é um dormitório mas nas festas não são só as pessoas de Vialonga que aqui vêm, vem cá gente de Alverca e Sacavém”, diz a O MIRANTE João Niza, responsável pelos eventos da Associação Recreativa da Granja.
Para os moradores a festa em honra de São Sebastião é o ponto mais alto do calendário festivo da Granja. Vasco Silva, 19 anos, reside na Granja há 10 anos, proveniente de Lisboa, e assume que prefere a festa popular à noite da capital. “Estas festas são do melhor que há. Um pouco iguais a todas as outras mas o convívio é o mais importante. É raro sair para Lisboa, lá a malta embebeda-se e ficam desmaiados nos cantos das ruas. Aqui o que importa não é o álcool, mas sim a camaradagem, ainda que haja um ou outro mais alegre” indica o jovem.
Ao lado de Vasco está João Gil, emigrado no Luxemburgo há dois anos, que veio de propósito à Granja, onde cresceu, para as festas. “É do melhor! Apesar de no Luxemburgo também haver destas festas, eu prefiro estar com os amigos com quem cresci”, refere o jovem de 19 anos, que alia os estudos ao trabalho a montar aquecedores.
Já Eurico Lopes, 72 anos, olha para as festas com algum desdém. Sentado num banco de jardim, o natural de Cabeço de Vide, afirma que podia estar melhor se voltasse ao Alentejo pois lá os preços são mais baratos. Frequenta as festas da Granja desde que ali chegou há 45 anos, mas muito por culpa do local onde mora. “Moro aqui ao lado, tenho de aguentar isto, se for para casa o barulho não me deixa dormir”, diz.
Quem não quis perder o baile foi Maria de Lurdes, residente em São João da Talha. Está nas festas da Granja pela primeira vez, pela mão da amiga Maria Helena de Santa Iria da Azóia, que já conhecia a festa de anos anteriores. Frequenta os bailaricos há três anos depois de o marido falecer vítima de cancro em 2011. “Venho divertir-me, dançar com os homens, com quem quiser dançar comigo”, assume às gargalhadas a antiga feirante de 63 anos.
O recinto para o bailarico é simples: um palco para os convidados musicais tocarem músicas brasileiras, africanas e portuguesas e o largo com uma meia lua de cadeiras onde se sentam sobretudo pessoas a quem os anos já pesam.
Na hora de dançar os primeiros pares são de mulheres. São poucos os homens a levantarem-se das cadeiras para dançar de início. Com o andar da noite, mais gente vai-se juntando no meio da improvisada pista de dança revestida a alcatrão.
Nas traseiras da festa, junto à escola primária da Granja, realiza-se a garraiada, com vários homens empoleirados nos ferros que limitam a arena, mas poucos no centro para tourear a vaca. De olhos postos no animal, está um grupo de quatro amigos residente em Unhos (Loures). Estão na Granja pela primeira vez. “Preferimos estas festas a Lisboa. A capital tem muita confusão. Aqui as pessoas são mais acolhedoras, é pequeno e sentimo-nos mais confortáveis”, diz Luís Cruz, auxiliar de enfermagem de 23 anos.
“Não dá para viver do artesanato”
Perto do largo da Granja está uma mostra de artesanato. São apenas quatro bancadas, mas muito visitadas pelos populares. “Vendi pouca coisa”, diz Ana Morais, 44 anos, bombeira na Póvoa de Santa Iria e que faz costura como passatempo desde há um ano. “Isto está difícil, não dá para viver do artesanato, aquilo que gastamos em matéria-prima é muito. As pessoas torcem o nariz aos preços mas não têm noção do que isto custa a fazer”, diz.
Ao lado está Isaura Santos, 44 anos, moradora de Vialonga que conhece a festa da Granja há vários anos. “Já cá venho desde miúda. Para vender só estive aqui há dois anos. Não tenho muito tempo para isto, pois tenho dois filhos de 12 e 16 anos e o meu marido está a trabalhar no estrangeiro”, indica Isaura, que é administrativa em Lisboa.
Crise afectou patrocínios
Este ano as festas em honra ao São Sebastião na Granja receberam, por noite, mais de duas mil pessoas, um número significativo para o pequeno espaço em frente à Associação Recreativa da Granja. Mas arranjar financiamento para as realizar não é tarefa fácil. “Esta festa em despesas está avaliada em seis mil euros, desde licenças, seguros, grupos musicais, etc... Antes as empresas davam 500 ou 600 euros, agora dão 100 euros. Outras mais pequenas davam 50 euros, e agora pedem desculpa pois não podem contribuir”, diz João Niza, tesoureiro da associação, que sublinha o apoio da Junta de Freguesia de Vialonga.
“Cada vez temos menos patrocínios e os que temos é de pouco valor. O que rende são os jantares que enchem a sala de 27 mesas, que mudamos duas ou três vezes por noite, e o bar que também ajuda imenso”, refere João Niza, destacando o grupo de 60 voluntários, que todos os anos trabalha durante duas semanas para pôr a festa e pé.