Grandiloquente Serafim das Neves
Quem pensa que com o fim da campanha eleitoral e a realização de eleições foi estancada a torrente das ideias excelentemente excelentes, destinadas a mudar a face e tudo o resto dos concelhos e freguesias da região, desengane-se. A fertilidade nesse campo é imparável e avassaladora. E quem não acredita na minha avisada palavra que esteja atento aos próximos quatro anos.
A ousadia e o descaramento dos outrora candidatos e hoje autarcas democraticamente eleitos vai arrasar, como dizem os brasileiros. E os opositores não lhes vão ficar atrás e em muitos casos até os irão ultrapassar em desbunda, até porque, estando na oposição podem dizer muito mais disparates do que se estivessem na posição, digamos assim. Além disso os que foram eleitos têm que tentar justificar porque não fazem o que prometeram, enquanto que aqueles a quem o povo eleitor não ligou muito só têm que se concentrar no alegre e costumeiro bota abaixismo.
No final do mandato nada do que agora conheces existirá. Tudo estará arrasado em nome do “puguésso”, que é uma forma muito autárquica de dizer progresso”. Em verdade, em verdade te digo que, com a ajuda dos fundos comunitários e o contributo aplicado da febril actividade dos decisores, não ficará pedra sobre pedra de toda esta pesada herança de ranço infraestrutural, que atravanca lugarejos, aldeolas, vilórias e medianas cidadórias.
Estou em trânsito pela Europa aproveitando os últimos dias que tenho de férias. Não vou longe porque fui dos felizardos a quem o Governo incluiu na lista de dadores benévolos para grandes causas nacionais. Como sabes tenho orgulho em viver num país que trata bem os seus servidores, beneficiando em troca da sua simpatia e atenção e também da celeridade por vezes supersónica com que nos tratam dos assuntos. Sei que por vezes abuso disso, entrando em muitas repartições só para ouvir sorridentes bons-dias e desejos de dias felizes mas espero que me perdoem este incorrigível vício.
Estava eu a dizer que me pus na alheta do nosso paraíso devido à minha costela masoquista. De vez em quando apetece-me levar umas chibatadas de realidades diversas e menos paradisíacas. Já passei Badajoz e sigo em frente. Sempre que saio do nosso Éden a primeira coisa que estranho é não haver notícias nem de Portugal, nem do nosso querido Distrito de Santarém, nem nos jornais; nem nas rádios; nem nas televisões.
A ignorância destes povos vizinhos é abismal. São uns grunhos autênticos. Desconhecem as coisas fenomenais, fantásticas e espectaculares que temos por cá. Nunca ouviram falar em Santarém - Capital do Gótico, nem no fantasmagórico Museu Ferroviário do Entroncamento. Ignoram que temos o melhor cozido de carnes bravas do mundo e vinhos tintos com mais medalhas de ouro que o Usain Bolt e, vê lá tu, nunca tiveram notícia das imarcescíveis festas da Flor do Entroncamento.
A seguir às eleições, no café onde costumo ir beber o meu abatanado matinal e comer o sacramental folhado de carne quentinho e estaladiço que me aumenta o colesterol ao mesmo tempo que me mata as papilas gustativas, de prazer, a empregada perguntou-me se eu não gostava de ser presidente da câmara. Para tentar que eu lhe desse uma resposta positiva disse que aquilo com ordenado e alcavalas dava mais de quatro mil e duzentos euros por mês. Acabei de comer e fui-me embora sem lhe responder porque a resposta era complexa.
Afinal do que eu gostava mesmo era de ganhar mais de quatro mil e duzentos por mês mas sem ter que mandar fazer rotundas com estátuas parolas, jardins sem árvores nem bancos, zonas wi-fi sem internet e festivais do caracol animados musicalmente com a prata da casa. Isto para além de não ter que aturar magotes de conhecidos a pedirem-me emprego para filhos pós-graduados.
Saudações estrangeiradas
Manuel Serra d’Aire