A lei das exumações, as receitas municipais e a falta de sensibilidade dos legisladores
Com data de 4 de Maio de 2015 foi publicado um edital da Câmara do Entroncamento, anunciando que iria proceder à exumação das ossadas de 247 (duzentos e quarenta e sete) cadáveres que se encontravam sepultados há mais de três anos, nos talhões do cemitério. No mesmo edital era dado um prazo de 30 dias aos familiares para requererem a conservação das ossadas.
Na lista incluída no edital havia duas pessoas sepultadas em Janeiro de 2012, uma sepultada em 1969 (há 46 anos) e as restantes entre 1985 e 2011. Não era indicada qualquer data para as exumações, o que se compreende dada a lista ser muito extensa e presumir-se que as mesmas não poderiam ser feitas ao mesmo tempo.
Seja como for, as famílias que tiveram conhecimento do edital e manifestaram o desejo de conservar as ossadas tiveram que pagar a respectiva taxa de exumação e adquirir um ossário para a colocação dos restos mortais.
Desconheço porque havia cadáveres para exumar há vinte, tinta e quarenta anos e porque foram todos incluídos na mesma decisão de proceder a exumações de cadáveres com apenas três anos. Não me custa aceitar que isso possa ter-se verificado com a crescente falta de espaço disponível para sepultar pessoas falecidas no concelho.
A exumação das pessoas falecidas em Janeiro de 2012 poderia ter ficado para outra data mas a lei que passou de cinco para três anos o período mínimo para as exumações permitia que assim fosse feito e aquele “arrastão” de exumações, digamos assim, convinha aos serviços.
Primeiro, porque todos os familiares ficavam logo notificados naquela data e porque o prazo de trinta dias dado para reclamar as ossadas iria gerar receitas provenientes da taxa das exumações e da venda dos ossários. E político que se preze não perde uma oportunidade de gerar receitas.
Sei que para o dia 29 de Março deste ano, véspera da Páscoa, quase três anos após a saída do edital e do recebimento das taxas e venda de ossários, foram marcadas exumações ali anunciadas, algumas das quais não se concretizaram porque os cadáveres ainda estavam em processo de decomposição.
Pode imaginar-se o choque e a angústia de familiares que assistem às exumações, altura em que revivem o falecimento do ente querido. Imagine-se agora o que sentirão em casos como os que ocorreram na Quinta-Feira Santa, em que os cadáveres voltam a ser enterrados para ser tentada nova exumação dois anos depois.
O legislador quando decidiu, em 1998, mudar de cinco para três o tempo mínimo para exumações fê-lo apenas por haver crescentes notícias de falta de espaço nos cemitérios sem ser sensível à dor que está a provocar um pouco por todo o país. Se mesmo com cinco anos ainda há corpos em decomposição em inúmeros cemitérios, como vou lendo, esta é efectivamente uma lei meramente economicista. Resta apenas o bom senso das entidades que gerem os cemitérios para evitar fazer sofrer as famílias. E espero que a exumação seguinte já não tenha que ser paga pelos familiares porque isso é uma verdadeira injustiça.
Augusto Inácio Marcial Teles