Ciganos da Chamusca e a tradição de passar o Dia de Todos os Santos no cemitério
É normal enterrar bens do falecido com ele e os casamentos de viúvas são mal vistos.
Na Chamusca, no Dia de Todos os Santos, 1 de Novembro, as primeiras pessoas a chegar ao cemitério e as últimas a sair, pertencem à comunidade cigana. A tradição já sofreu algumas alterações, como revelaram a O MIRANTE algumas dessas pessoas, mas todos continuam a fazer questão de permanecer o mais tempo possível junto às campas dos familiares já falecidos.
“Há uns trinta anos isto era mais rigoroso. As pessoas permaneciam aqui de manhã à noite. A maioria das famílias trazia comida e almoçava mesmo aqui. Agora já quase não é assim e há quem vá almoçar e volte”, conta António Silva.
“Isto faz parte da nossa cultura. De um modo geral acreditamos que há vida para além da morte. Se alguém não paga uma campa ou um funeral dizem que a alma de quem lá está não fica descansada”, vai explicando.
“Muitas coisas mudaram. Antigamente as viúvas, mesmo quando eram muito novas, não podiam voltar a casas, por exemplo. Agora já há algumas que voltam a casar apesar de isso nem sempre ser bem visto por alguns elementos da comunidade”, ilustra.
Os ciganos têm outras tradições relacionadas com a morte e com os mortos que foram explicadas à reportagem
de O MIRANTE. “Para além do luto rigoroso, é costume meter alguns pertences do morto dentro da cova. Pelo menos aqueles a que o falecido dava mais valor. A minha mãe, por exemplo, tinha coisas do meu pai que depois dela partir ninguém iria guardar ou utilizar e fez isso. Do meu pai foram para dentro da cova uns fatos que ele tinha, os óculos, uma bengala, um cachimbo...coisinhas assim. Objectos pessoais”, conta Maria Helena Garcia que agora reside em Tomar.
Ela e a mãe, Maria Júlia, que tem 93 anos passaram o dia no cemitério. Chegaram por volta das nove da manhã e disseram que só iriam sair quando começasse a escurecer.
Branca Sá, também passou o dia no cemitério onde estão enterrados o seu pai, a irmã os avós, tios e primos “Está aqui a família completa”, refere.
José Miguel da Silva conta que vai todos os dia ao cemitério mas no Dia de Todos os Santos passa o dia inteiro no local.
O MIRANTE encontro-o com a esposa, junto à campa de familiares.
Pessoas vão aos cemitérios no dia de Todos os Santos por ser feriado
Nessa data a procura de flores ultrapassa largamente a oferta.
O dia de Finados é o 2 de Novembro mas em Portugal as pessoas visitam as campas dos familiares no dia anterior, Dia de Todos os Santos, por ser feriado. Nessa altura não há flores que cheguem para as encomendas.
Nos dias que antecedem o Dia de Todos os Santos, que se celebra a 1 de Novembro, o trabalho na secção de florista da Agência Funerária Isilda Grilo, que tem lojas no Tramagal (concelho de Abrantes) e Constância, aumenta muito, tornando-se complicado gerir todas as solicitações.
“Vendi mais flores nesta semana que antecede o dia 1 de Novembro do que nos seis meses antes. Fiz uma encomenda de flores ao fornecedor, muito superior ao normal mas já tive que fazer mais uma. Este ano a procura de flores aumentou e começou mais cedo”, explica Isilda Grilo a O MIRANTE.
A empresária afirma que esta altura do ano é semelhante ao Natal, altura em que também há muita procura de flores para ornamentar as campas dos familiares. A semana passada, quando chegou à loja, depois de ter feito dois funerais, tinha mais de uma dezenas de clientes à sua espera para comprarem flores.
“Algumas pessoas fazem questão de ter as campas arranjadas e bonitas neste dia mas esquecem-se de ir ao cemitério arranjar as campas durante o ano inteiro. Não faz sentido ter a campa arranjada só num dia”, comenta.
O dia de finados é a 2 de Novembro mas as pessoas visitam os cemitérios no dia anterior, aproveitando o facto de o Dia de Todos os Santos ser feriado.
Os crisântemos brancos são as flores mais procuradas mas também há quem prefira margaridas. Nos anos mais recentes e apesar de todas as campanhas contra o plástico, tem havido uma grande procura de flores de plástico e de acrílico que duram mais tempo do que as flores naturais.
Isilda Grilo confessa que há clientes que para além das flores lhe encomendam a colocação das mesmas nas campas dos familiares. “São pessoas que moram no estrangeiro ou que vivendo em Portugal moram longe e não conseguem vir. Eu aceito os pedidos porque não sou capaz de dizer que não. Até agora nunca cobrei o serviço de arranjar as campas mas apenas o preço das flores mas há alturas em que tenho pouco tempo, nomeadamente quando há funerais., desabafa.
Pela sua experiência neste ramo diz que os mais novos não ligam muito à tradição de visitar os cemitérios no Dia de Todos os Santos e quando vão é a pedido dos mais velhos.