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“O Estado quer-nos  a vender saúde e com as análises irrepreensíveis”

Uma prima minha comprou uma cadelinha que é tratada com um desvelo comovente. O bicho teve direito a um enxoval que engloba chupetas (é verdade, há chupetas para cães!), camisolas e sei lá que mais… Uma panóplia de mimos que me leva a pensar que aquela história da vida de cão associada a desditas várias já era. Hoje, muito cão tem vida (e alguns também nome) de lorde, comem do melhor que há no mercado da paparoca enlatada, vivem em ambiente climatizado e não num velho bidon a servir de casota e só não aprendem a tocar piano e a falar francês porque essas são habilidades que lhes estão vedadas por razões óbvias.
Não sei quem foi que disse “quanto mais conheço os homens mais gosto dos cães”. Uma frase forte, que fica a matar num qualquer manual de citações mas com a qual não concordo inteiramente. Porque se é verdade que alguma gente em que fui tropeçando ao longo da vida não interessa nem ao Menino Jesus e não pode ser comparável a um cachorrinho fofinho e ronceiro, daqueles que andam sempre com o rabo a abanar e a desafiar para a brincadeira, outras pessoas há que não trocaria nem pelo mais premiado labrador ou cocker spaniel.
Já para não falar de outros seres humanos que gostaria muito de conhecer e de ser próximo (para não dizer íntimo), o que infelizmente nunca sucedeu nem muito provavelmente irá suceder. Assim de repente lembro-me, por exemplo, da Gisele Bündchen, da Charlize Theron ou da ainda enxuta Cindy Crawford. Por muito mau feitio que tenham não podem ser comparadas ao mais premiado canídeo deste mundo.
A propósito: há uns dias ouvi uma conversa interessante sobre o assunto, onde alguém teorizava que hoje muitos casais jovens optam por ter um cão em vez de bebés. Também já tinha pensado nisso. Não sei se há estudos sobre esse fenómeno, mas a verdade é que o número de nascimentos diminuiu drasticamente, não sei mesmo se na proporção inversa que cresceu o número de cães a viverem à grande e à francesa. Resta saber quem vai sustentar a Segurança Social quando formos velhotes.
Aproveito este escrito para agradecer os esforços que o Estado tem feito para zelar pela minha saúde. Começou timidamente há uns valentes anos quando começou a taxar o tabaco forte e feio para me tentar dissuadir a acabar com o consumo de nicotina, a que se seguiu a publicação de imagens chocantes nos maços de tabaco; prosseguiu com o aumento dos impostos nas bebidas alcoólicas e a partir daí veio a guerra ao sal, à gordura e ao açúcar. Felizmente, ainda não se lembraram do sexo, mas por este andar ainda lá chegam...
O Estado consegue ir mais longe que o pai austero e disciplinador que muitos tiveram na infância ou a zelosa mãe que se esgotava em ralhetes e advertências que serviam de baias na nossa acção diária. Se o objectivo é tornar-nos numa espécie de monges e freiras, sonsos e sem vícios, as coisas estão no bom caminho. Como dizia um adepto das coisas boas da vida,que conheci numa comezaina, o Estado quer ver-nos morrer cheios de saúde e com os resultados das análises irrepreensíveis...

Saudações veraneantes do
Serafim das Neves

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