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Pedro Barroso despediu-se dos palcos em Torres Novas nos 50 anos de carreira
foto Cláudia Sardinha Cantor Pedro Barroso despediu-se dos palcos no concerto que decorreu no Teatro Virgínia, em Torres Novas, a 21 de Dezembro

Pedro Barroso despediu-se dos palcos em Torres Novas nos 50 anos de carreira

“Não abandono a intervenção crítica, nem a cidadania, enquanto o último neurónio mo permitir”. “Que lutas nos sobram, que ninhos/ Que gaivotas esvoaçam pelo mar?/ Que sustos e dores e caminhos/ Que causas inda’ há para lutar?” são versos da canção “Rumos”, que Pedro Barroso gravou com Patxi Andión, antes de ele falecer e que será incluída no CD “Novembro”.

Com o público do Teatro Virgínia, em Torres Novas, de pé a aplaudir, Pedro Barroso levantou-se do lugar onde tinha passado as quase três horas do concerto e foi abraçar músicos e artistas convidados, um a um.
Foi na noite de sábado, 21 de Dezembro, num espectáculo inicialmente anunciado como de celebração dos cinquenta anos de carreira mas que o músico e compositor, revelaria, no dia anterior, na sua página do Facebook ser o da sua despedida dos palcos.
“Sim. Corto a “jaqueta de forcado” amanhã, no velho Teatro Virgínia pelas 21h30 - com testemunho de 600 cúmplices; e quero dizer com isto, que cesso actividade como músico, não me retirando obviamente, nem como homem das ideias, nem das artes, nem das palavras. E da diferença. Não abandono a intervenção critica, nem a cidadania, pelo menos enquanto o último neurónio mo permitir”, escreveu.
Pouco passava das nove e meia da noite quando as luzes da sala se apagaram e, com a cortina negra fechada, como antes de uma peça de teatro, surgiu Armando Carvalhêda, um dos maiores divulgadores da música portuguesa através do seu programa Viva a Música, para anunciar Pedro Barroso.
Assim que a cortina abriu os seiscentos espectadores que ocupavam todos os lugares da sala ergueram-se e aplaudiram demoradamente. Pedro Barroso, esteve internado no Hospital da Luz, em Lisboa, de 9 a 17 de Dezembro, e o concerto de Torres Novas, que estava esgotado há mais de um mês, chegou a estar em risco mas na noite de 21 de Dezembro o cantor, apesar de dar sinais de alguma fadiga, mostrou ânimo, boa disposição e mesmo se as pernas fraquejam a sua voz está intacta. Forte e vibrante como sempre foi.
“Já que aqui estou/Vou-lhes agora contar/De mil passos feitos vida/Desta vida atribulada/Desta vida de cantar”, ecoou na sala e o público, empolgado, acompanhou-o no refrão: “Viva quem canta/Que quem canta é quem diz/Quem diz o que vai no peito/No peito vai-me um país”.
Na sala havia pessoas de todas as idades. Uma ou outra criança com pais ou avós. Alguns terão assistido, a 21 de Dezembro de 1969, à transmissão televisiva do programa “Zip-Zip” onde o artista se estreou. A certa altura da noite, depois de contar como a censura do antes do 25 de Abril o tinha obrigado a transformar uma canção sobre a guerra numa canção de amor, Pedro Barroso teve em palco dois companheiros do Liceu: Luciano Jesus e Zé Duarte que o acompanharam à viola na interpretação do texto original do tema censurado.
Pedro Barroso não ocupou o centro do palco. Optou por ficar num dos extremos (à esquerda, para o público). Sentado num cadeirão largo tinha à sua frente uma pequena mesa e à direita a viola, que usou algumas vezes. Junto a si, também sentado esteve Armando Carvalhêda, que com ele conversava nos intervalos das músicas. E foram imensas as histórias que o artista contou, como a do realizador de televisão que chamava contrabaixo ao violoncelo de Luís Sá Pessoa e que insistia para ele o tocar de pé na parte final do programa que estavam a gravar.
Atrás de Pedro Barroso estava o piano que durante a maior parte do tempo foi tocado pelo seu filho Nuno Barroso. À esquerda dele estavam Miguel Carreira (acordeão e viola), Pedro Fragoso (viola, piano), David Zagalo (teclados), Ricardo Parreira (guitarra portuguesa), David Serrão (contrabaixo), Susana Santos e Luís Sá Pessoa (violoncelo) e Manuel Rocha (violino).
Como convidados para interpretarem algumas canções da autoria de Pedro Barroso estiveram o fadista da Chamusca, João Chora, que cantou Fado Ribatejo, um tema que gravou há vinte anos; a fadista de Riachos, Teresa Tapadas, que cantou, “Ao menos uma vez”, que foi gravado em 1997 por Tonicha; António Laranjeira, que cantou “Porto Antigo”, tema que incluiu num dos seus discos e Francisco Fanhais (Padre Fanhais). O Choral Phydellius de Torres Novas subiu ao palco para fazer coros num dos temas e dois dançarinos de Riachos dançaram num outro tema.
No único “encore” do concerto de Torres Novas Pedro Barroso interpretou uma das suas mais conhecidas canções: “Menina dos Olhos D’Água” e foi no último adeus ao público, quando se dirigiu à frente do palco, que pareceu ter tido uma breve tontura.

Os ausentes sempre presentes

Durante o espectáculo Pedro Barroso lembrou alguns amigos e companheiros de estrada, nomeadamente José Afonso ou o escultor Martins Correia, da Golegã, do qual cantou o poema “Eternos Sonhadores” em conjunto com o filho, Nuno Barroso, que musicou o tema. Foram também ouvidas mensagens enviadas por Janita Salomé, Júlio Isidro e Manuel Freire. A mensagem deste último levou Pedro Barroso a cantar “Pedra Filosofal”.
Especial homenagem foi feita ao cantor e compositor António Macedo, cujo falecimento, em 1999, quase não foi noticiado. A propósito dessa “injustiça”, Pedro Barroso fez questão de mostrar que ele não era esquecido e pôs toda a sala a cantar o refrão da sua mais conhecida canção. “Canta, canta, amigo canta/vem cantar a nossa canção/tu sozinho não és nada/juntos temos o mundo na mão”.

“A minha vida foi um privilégio; uma festa compartilhada”

Pedro Barroso fez a sua estreia em 1969 e apresenta como referência a sua actuação no programa televisivo Zip-Zip de 21 de Dezembro desse ano. O cantor e compositor de 69 anos, feitos a 28 de Novembro, nasceu em Lisboa mas a sua família é de Riachos, Torres Novas, onde vive e que sempre considerou como a sua terra.
“Riachos é o meu lar. É a minha casa. Nasci praticamente ali. Fui para Riachos com oito dias. Depois mantive uma relação permanente que nunca se quebrou. Por morte do meu pai, em partilhas, achei por bem ficar com a casa de família porque gostava muito dela. Na altura era muito novo, tinha 28 anos e foi um encargo que assumi. Decidi ficar com o velho Casal da Raposa que é, no fundo, o meu lar. É uma questão de pele, da minha própria história”, explicou a O MIRANTE em 2009, ano em que O MIRANTE o distinguiu com o Prémio Personalidade do Ano.
O concerto de sábado no Teatro Virgínia, uma sala com 600 lugares, estava esgotado há mais de um mês e foi sempre anunciado como sendo de celebração dos 50 anos de carreira. Só na sexta-feira é que Pedro Barroso anunciou publicamente a sua despedida dos palcos. “A minha vida foi um privilégio. Uma festa compartilhada”, escreveu ele na sua página do Facebook na véspera do espectáculo.

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