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“Escolhi vender o meu corpo porque não tive outra alternativa para sobreviver”
Maria aprendeu a lidar com a situação de ter o seu corpo como ferramenta de trabalho

“Escolhi vender o meu corpo porque não tive outra alternativa para sobreviver”

A 17 de Dezembro comemora-se o Dia Internacional Contra a Violência sobre Trabalhadores do Sexo. O MIRANTE falou com uma mulher que trabalha em Santarém a vender o corpo, o que, nas suas palavras, é uma forma de fazer felizes os homens que a procuram.

“O corpo é meu e a consciência é muito minha: durmo bem apesar de saber que trabalho num ofício considerado maldito”. Foi a resposta que Maria deu ao jornalista quando questionada sobre se sente arrependimento quando acorda todas as manhãs. Dos cerca de vinte telefonemas que fizemos para as mulheres que exercem a prostituição na região de Santarém, e que anunciam em jornais, só ela aceitou contar a sua história.
Tem 61 anos e trabalhou como empregada de balcão cerca de 30 anos. Começou a viver do sexo há cerca de 10 anos depois de ter ficado desempregada e ter muitas contas para pagar. “Escolhi esta vida por desespero e por ser a minha única salvação”, conta, explicando que esteve mais de um ano à procura de emprego, mas talvez por já ter alguma idade fecharam-se todas as portas onde foi bater.
Maria admite que nos anúncios retira uns anos à sua idade real para incluir a preferência de um maior número de clientes. “Albarda-se o burro à vontade do dono”, sublinha com um sorriso. Mas não deixa de contar que sabe ter atributos físicos que facilmente justificam a idade que anuncia. “Deus, ultimamente, não tem sido bom para mim, mas deu-me um bonito corpo, que eu também faço por estimar não abusando do álcool nem da comida”.
Atende os seus clientes na zona de Santarém para não correr o risco de encontrar alguém conhecido como aconteceria provavelmente em Lisboa, já que a cidade é uma ervilha. Arrendou uma casa e explicou ao senhorio as suas intenções. “É a única pessoa que sabe. Nem a minha filha, que já é adulta, sonha com o trabalho que tenho”, afirma, admitindo que nunca teve coragem para contar à família por sentir vergonha.
Garante que não tem prazer nas relações sexuais, mas também nunca teve problemas com os clientes a quem abre a porta da sua casa, embora o faça sempre com receio. “A maior parte são clientes fixos e isso deixa-me mais à vontade”, refere. Conta que tem muitos jovens a procurarem os seus serviços e que sente orgulho por alguns deles saírem com um brilho nos olhos.
Conviver 30 minutos com Maria custa no mínimo 25 euros. Diz que já não pensa em ir à procura de outro trabalho e que vai continuar a usar o corpo como ferramenta até chegar à idade da reforma, porque a alternativa seria andar a continuar a bater às portas erradas e viver de ordenados mínimos. A conversa não acabou sem se justificar mais uma vez: “Não ando a roubar nada a ninguém. Chorei muito ao início, mas aprendi a lidar com a situação e não posso dizer que sou uma mulher infeliz”.

Santarém tem duas casas de convívio afamadas

O concelho de Santarém é conhecido em todo o país por ter duas casas de convívio das mais badaladas: uma tem a particularidade de ser gerida por uma mulher que é conhecida por ajudar obras sociais e pessoas em dificuldades. O jornalista já confirmou em algumas viagens pelo estrangeiro e em conversa de circunstância que Santarém está no mapa também devido à casa de convívio situada no Vale de Santarém onde existe uma clientela fixa de vários extractos sociais. Com regularidade realizam-se por lá festas de aniversário e despedidas de solteiro.

Violência na prostituição é prática corrente

A prostituição de rua é uma prática insegura para quem a pratica e a prova disso são as estatísticas que referem que 90% dos trabalhadores do sexo de rua sofrem de violência. Em Portugal, segundo o Relatório Anual de Segurança Interna de 2018, foram detidas sete pessoas pela prática de lenocínio, cinco homens e duas mulheres. Trata-se de um crime punido com pena de prisão que pode ir de seis meses a oito anos.
Existem outros números que se destacam em relação aos detidos por crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual: 15 por abuso sexual de pessoa incapaz de resistência; 42 por pornografia de menores; 71 por violação; 113 por abuso sexual de crianças. De realçar que nestas 248 detenções apenas existem nove mulheres.
Pelo que O MIRANTE apurou, no distrito de Santarém, não há casos a registar. No concelho de Vila Franca de Xira, e conforme noticiamos a 28 de Dezembro de 2017, foi desmantelada uma rede de prostituição e foram detidas três pessoas por suspeitas de lenocínio, prática criminal de aliciação e exploração de comércio sexual e prostituição.

“Escolhi vender o meu corpo porque não tive outra alternativa para sobreviver”

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