
Lapso na lista impede Movimento Independente de São Vicente do Paúl de ir a votos
Um erro na elaboração da lista do Movimento Independente de São Vicente do Paúl violou a lei da paridade. Tribunal Constitucional não aceitou recurso e impediu candidatura independente que tem governado essa freguesia do concelho de Santarém.
A candidatura do Movimento Independente de São Vicente do Paúl (MISVP) foi impedida de ir a votos na freguesia de São Vicente do Paúl, concelho de Santarém, nas autárquicas de 12 de Outubro, devido a um lapso na elaboração da lista que não respeitou a lei da paridade. O recurso apresentado para o Tribunal Constitucional não surtiu efeito. O juiz seguiu a interpretação da lei que já havia sido expressa pelo Tribunal Judicial de Santarém. Em causa está a colocação na lista de três homens em lugares seguidos (quinto, sexto e sétimo). A lei define que não podem ser colocados mais de dois candidatos do mesmo sexo, consecutivamente, na ordenação da lista.
Após a apresentação da lista no Tribunal de Santarém, em Agosto, o MISVP foi alertado para a existência de algumas desconformidades, tendo sido a maior parte delas resolvida. Mas a ordenação que viola a lei da paridade manteve-se na versão seguinte, o que levou o Tribunal de Santarém a rejeitar a lista. O movimento recorreu para o Tribunal Constitucional, mas não teve êxito. A lista tinha Susana Veiga Branco como candidata à presidência da junta de freguesia e integrava como número dois o histórico autarca Ricardo Costa, actual presidente da União de Freguesias de São Vicente do Paul e de Vale de Figueira, que assim sai de cena, pelo menos durante quatro anos, depois de mais de quatro décadas nas lides autárquicas.
“Não fomos derrotados nas urnas, fomos derrotados pela justiça”
Contactada por O MIRANTE para comentar a posição dos tribunais, Susana Veiga Branco, que encabeçava a lista do Movimento Independente de São Vicente do Paúl, lamentou o desfecho. “A democracia em Portugal está definitivamente mais pobre, quando o tribunal não permite que uma candidatura de um Movimento Independente vá a eleições. 51 anos após o 25 de Abril é gravíssimo e de lamentar que a vontade do povo não possa ser assim expressa em eleições. E isto por erros processuais, inclusive pelo Tribunal da Comarca de Santarém. Os erros a nós apontados foram sanados e nunca considerados pelo tribunal, que se refugiou em questões jurídicas que o cidadão comum não compreende”, escreveu na resposta enviada ao nosso jornal e que publicámos na íntegra no nosso diário online.
“Estamos agora perante o profundo erro da cidadania estar a ser posta em causa. Qual a legitimidade democrática do próximo executivo da junta de freguesia, quando o Movimento Independente que liderou a freguesia em maioria nos últimos 16 anos foi impedido pela justiça de concorrer às eleições? As pessoas estão obviamente muito magoadas e dececionadas, não só os autarcas recandidatos e toda a lista do Movimento Independente como as centenas dos seus apoiantes e a população”, acrescenta no seu depoimento, onde agradece “a todas as pessoas que acreditaram e acreditam neste Movimento e que tudo fizeram para continuarmos a lutar pela nossa terra”.
Susana Veiga Branco deixa ainda claro que o movimento “não vai acabar, vai continuar a existir e dá a garantia que daqui a quatro anos irá manifestar ainda muito mais força”. E conclui reiterando as suas críticas às decisões dos tribunais. “Não fomos derrotados nas urnas, fomos derrotados pela justiça portuguesa. Percebemos mais uma vez a diferença entre sermos uma lista independente ou uma lista partidária. Os obstáculos, na forma como somos vistos pelas instituições, são muito superiores. Continuamos a acreditar nos valores de Abril, mas neste momento onde estarão eles?!”, escreve.
Ricardo Costa: autarca mais antigo em funções no país sai de cena de forma inglória
Ricardo Costa, ainda presidente da União de Freguesias de São Vicente do Paúl e de Vale de Figueira, leva 43 anos como autarca, o que faz dele o presidente de junta há mais tempo em funções de forma consecutiva. Está há 36 anos como presidente de junta - primeiro em São Vicente do Paúl e os últimos doze anos como líder de uma união de freguesias -, tendo sido secretário da Junta de São Vicente do Paúl durante seis anos, quando começou nas lides autárquicas, na já longínqua década de 80.
O veterano autarca, de 77 anos estava longe de prever que iria interromper a longa carreira autárquica por causa de um lapso que ainda tem dificuldade em explicar. “Foram tantos olhos a ver e ninguém deu pela falha”, lamenta. Agora resta “respeitar” a decisão dos tribunais, reconhecendo que é “uma saída triste” e que não mereciam. “Infelizmente não nos apercebemos que havia três homens seguidos na lista. Foi um erro que não rectificámos”, reconhece, considerando que “é uma injustiça, porque ninguém gosta de perder na secretaria”. Ricardo Costa olha já para o futuro e garante que o movimento independente vai continuar activo e a defender os interesses da população da freguesia. Depois, daqui a quatro anos, logo se vê. “Vou estar por aqui, não conheci outra terra a não ser esta”, diz, sublinhando a sua “disponibilidade para colaborar” com quem vier a seguir na junta.
Depois de tantos anos ligados à vida autárquica, Ricardo Costa vai ter de se adaptar aos novos tempos. É quase como reaprender a andar. Vai ter mais tempo livre e aproveitar para descansar depois de uma vida extremamente activa. “As funções de presidente de junta mantêm-nos ligados em permanência. Hoje uma junta de freguesia é como uma grande empresa, que exige uma presença diária. A responsabilidade é muita”, diz o reformado que dedica todo o seu tempo à junta. “O trabalho feito ao longo de 40 e tal anos está à vista de todos. Tenho a consciência tranquila. Agora é continuar a desenvolver a freguesia”, conclui.
