Três Dimensões | 20-02-2024 21:00

“As IPSS não têm os apoios necessários do Estado”

“As IPSS não têm os apoios necessários do Estado”
TRÊS DIMENSÕES
Gonçalo Fabião Semedo é presidente da direcção do Centro de Bem Estar Social de Vale de Figueira, concelho de Santarém há cerca de um ano

Gonçalo Fabião Semedo nasceu a 16 de Junho de 1972, em Lisboa, embora tenha uma forte ligação a Vale de Figueira, de onde é natural a família.

As férias de Verão na infância foram passadas na aldeia do concelho de Santarém e é das melhores memórias que guarda. Trabalhou durante 15 anos numa multinacional e quando saiu criou a sua própria empresa no ramo imobiliário. Vive com a esposa e os filhos há cerca de dez anos em Vale de Figueira e diz que não há melhor qualidade de vida do que no campo. É presidente da direcção do Centro de Bem-Estar Social de Vale de Figueira há cerca de um ano.

Estava no 4º ano da licenciatura em Psicologia quando tive que fazer uma opção que mudou o rumo da minha vida. Estudava, trabalhava em part-time no grupo Sonaecom e tinha uma loja de equipamento informático. Deixei de estudar e fechei a loja quando fui promovido. Passei a gestor de serviços e fiquei sem tempo para conciliar tudo. Trabalhei 15 anos nessa multinacional e gostei muito. Durante este emprego criei uma empresa no ramo da informática. Só quando saí da Sonaecom é que criei uma empresa no ramo imobiliário e eu e a minha esposa abrimos um alojamento local em Lisboa.
Não há melhor qualidade de vida do que no campo. Sou natural de Lisboa mas a minha família é de Vale de Figueira [concelho de Santarém]. O meu avô foi o médico da terra durante muitos anos. Vivemos em Vale de Figueira há cerca de dez anos, na casa de família, que estamos a recuperar aos poucos. Deixar Lisboa foi a melhor coisa que poderia ter feito. O stress, as horas no trânsito... Lembro-me que o meu trabalho ficava a dez minutos de casa de carro. Quando me avisaram que iam mudar as instalações para a zona da Expo comprei uma motorizada porque é impossível o trânsito na capital.
Guardo as melhores memórias da infância passada na terra da minha família. Todos os Verões, até aos meus nove anos, foram passados em Vale de Figueira. Eu e os meus irmãos adorávamos vir para cá. Depois os meus pais alugaram uma casa no Magoito, perto de Sintra, e os meus avós iam ter connosco nas férias escolares. Não tenho muitas memórias do meu avô porque, como era médico, não o via muitas vezes. Descobri muitas coisas depois dele morrer. A minha avó materna foi minha catequista. Foi talvez a pessoa que mais me influenciou na infância. Ensinava-me a importância do ambiente e dos animais. Lembro-me de contar como uma vez salvou uma cegonha que tinha ficado presa num fio de electricidade. As memórias que criamos na infância são as melhores.
Os meus pais adoptaram um rapaz quando eu já tinha 20 anos. Éramos quatro irmãos quando chegou à nossa família um novo elemento que foi sempre tratado como irmão. A minha mãe é médica e na altura o bebé foi deixado no hospital assim que nasceu pela mãe e a ama que ia ficar com ele teve um acidente. Falaram com a minha mãe que disse que sim, que seríamos família de acolhimento e hoje continua a fazer parte da família.
O momento mais difícil foi a morte do meu irmão mais velho. Tinha 28 anos e era médico. Faleceu vítima de doença. Tinha mais três anos do que eu. Foi muito complicado e torna-se ainda mais difícil ver o que essa morte causou aos nossos pais. Sabemos que nos amam mas a falta que aquele filho faz é devastadora. Era o primeiro filho e durante o seu primeiro ano de vida foram só ele e a minha mãe porque o meu pai foi para a guerra. Só depois é que a minha mãe foi ao seu encontro em África.
É raro haver sentido de voluntariado como antigamente. As pessoas não têm a mesma disponibilidade porque trabalham e a vida é muito apressada. Alguns cargos de dirigentes associativos deveriam ser remunerados. Não um ordenado inteiro mas um complemento para ajudar. Neste momento, sinto dificuldade em conciliar a minha vida profissional com o associativismo. Temos falta de funcionários em algumas áreas, primeiro porque não conseguimos pagar acima da média, temos um baixo orçamento e o trabalho é duro. Temos noção que não é fácil recrutar pessoal.
Não temos os apoios necessários do Estado. Reconheço que houve um esforço com o aumento no pagamento no final do ano, mas não sei se foi porque estamos em período eleitoral. O Estado deveria pagar pelo menos 50% do que as instituições gastam com cada utente. Um utente custa cerca de 1.300 euros/mês e o Estado apoia com 570 euros por cada utente. Estamos muito longe dos 50% de apoio. Temos muitos utentes que não ganham metade daquilo que gastamos com cada um. Temos que arranjar outras formas de ir buscar dinheiro sem aumentar os preços, começando pelos dirigentes, que são voluntários. Muitas vezes somos nós que ajudamos na manutenção e limpeza.
Gosto muito de ir à praia no Inverno quando não há multidões. Não gosto de praia no Verão, é muito calor e muita confusão. Gosto de viajar sem ir com muita coisa programada. A viagem que fiz à Escócia e Irlanda foi algo improvisado. Quando chegámos à Irlanda dormimos a primeira noite no hotel e no dia seguinte alugamos um carro e percorremos a ilha toda. Tínhamos alguns hotéis marcados e outros não. Dormíamos onde calhava e cheguei a dormir no carro [risos]. Quero muito conhecer os Açores. Não gosto de cozinhar mas aprecio muito o arroz de feijão da minha mãe. A minha esposa cozinha muito bem e não resisto ao rolo de carne e ao bacalhau com broa que costuma fazer.
O voto não deve ser obrigatório. É um dever votar e também há o direito a não votar. Há pessoas que deveriam ter a consciência que se não entendem bem sobre cada partido político não deveriam votar ou votar em branco. Votar é de uma responsabilidade tremenda. Muda o rumo de um país de um momento para o outro. Confio pouco nos políticos. Não generalizo mas são menos os que não confio, mas já decidi em quem vou votar.

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