Três Dimensões | 14-01-2025 07:00

“A falta de estacionamento em Azambuja mata o comércio”

“A falta de estacionamento em Azambuja mata o comércio”
TRÊS DIMENSÕES
Madalena Dias, proprietária do restaurante Tasco da Ilda

Madalena Dias é de Azambuja, vila que escolheu para abrir o seu restaurante, Tasco da Ilda, na antiga casa da sua bisavó. Aos 44 anos quer expandir o negócio mas lamenta que este país não seja mais amigo dos empresários. Define--se teimosa e como alguém que ajuda sem pensar se vai receber em troca. Foi a família, conta, que a ensinou a ser assim.

Sou de Azambuja, fui só nascer a Santarém, quase pelo caminho. A ambulância avariou no Vale de Santarém mas o meu pai, que ia atrás, arranjou-a e conseguimos chegar à maternidade. Cresci nos Casais dos Britos, numa quinta isolada, onde os meus pais eram caseiros. Desde muito nova fui envolvida nos processos culinários. Sempre vivi à volta dos tachos. Uma vez fiz uma birra para que me deixassem amanhar dois quilos de carapaus.
O comércio local era muito dinâmico em Azambuja. Os avios eram feitos ao mês na mercearia do Zé Fazenda e, na altura do Natal, os brinquedos eram comprados no Top 10. Escolher o brinquedo era o cabo dos diabos porque tínhamos de o fazer em Outubro, porque havia muito poucos. As pessoas ficavam surpreendidas como é que com tão pouco fazia determinadas comidas. Mas eu devorava tudo o que era receitas em revistas. Quando fui a primeira vez ao Jumbo de Alfragide fiquei espantada por haver bases de pizzas, mas o dinheiro era para outras coisas, a minha mãe não comprava. Então, aos 12 anos, devo ter sido a primeira a fazer uma pizza nos Casais dos Britos com o fermento que o padeiro, que ainda hoje me vende o pão, me arranjou.
Tentei tirar uma licenciatura mas desisti porque precisava de trabalhar. Tive vários trabalhos que nada tinham a ver com restauração, mas acabava sempre na cozinha a fazer almoços para os colegas. Não me esqueço do que vivi mas relativizo. Arrependimentos não valem a pena. Sou extremamente teimosa, o que faz com que seja trabalhadora. É-me difícil saber parar. Foi a vida que me ensinou a ser assim.
O restaurante Tasco da Ilda nasceu de uma infelicidade, o falecimento da minha mãe, Fátima Regateiro, uma pessoa muito querida em Azambuja. Passei nesta rua com o meu pai e vi este espaço. Curiosamente quem viveu nesta casa foi a bisavó da minha mãe, que se chamava Ilda. Descobri que era costureira e é daí que vem o ‘tasco’: a parte rugosa do linho. Nessa altura dava formação de cozinha e pastelaria. Sempre disse que nunca queria ter um restaurante, mas depois de a minha mãe falecer quis trabalhar para esquecer. É um restaurante de memórias onde peguei em tudo o que comia quando era jovem.
Há uma ideia romântica à volta da área da restauração, que de romântica não tem nada. Temos de dar muito de nós para funcionar. Ter estado dois anos e meio sozinha na cozinha fez com que este restaurante passasse de um cubículo com três mesas e uma esplanada para o que vemos hoje. Tem sido um trabalho de evolução. Sempre que o negócio vai gerando lucro, invisto. Tem sido conquista atrás de conquista, mas aqui já não há para onde crescer. Comecei tarde, aos 44 anos, mas não quero parar. Ambiciono levar o Tasco da Ilda mais longe.
Há pessoas que não gostam de ser bem tratadas e desconfiam de quem as trata bem. Gerir pessoas é o mais difícil num negócio e acho que é universal a pequenas ou grandes empresas. Há pessoas que vêm um dia e depois não aparecem mais para trabalhar. Ainda há as que não têm qualificações e não querem aprender mais nem ter mais responsabilidades, mas querem ganhar mais. Sou mais mãe que patroa mas tenho de me lembrar que só tenho uma filha: chama-se Maria Rita e tem 12 anos.
Não haver uma saída da auto-estrada faz com que Azambuja passe à margem e seja mais difícil para os negócios. Mas quem gere um negócio não pode estar à espera que o sucesso lhe vá parar ao colo. Falta resiliência a muitos empresários, vontade de querer fazer. Não tenho prazer em, a um domingo, ter 20 pessoas à porta e, por não ter espaço para as sentar, ter de lhes dizer para irem a Aveiras ou para outro concelho. Devia haver mais restaurantes, a concorrência é excelente.
A falta de estacionamento em Azambuja mata o comércio. Venho para o centro da vila todos os dias para trabalhar, muitas vezes a pé, porque não há onde pôr o carro. Temos estacionamento dentro da vila mas tem de haver limitação de tempos através de parquímetros. Há muita gente que vem, deposita aqui o seu carro para ir para o trabalho e não deixa nada aqui. Azambuja é um depósito de carros de pessoas que vão para Lisboa trabalhar.
Este país não é amigo dos empresários. Sou tributada como se fosse uma Sonae e sou uma micro-empresa. Tudo é taxado. Tenho três meses no ano bons e sou tributada no IVA e ao fim desse tempo toda a margem de lucro e o que poderia ser a minha subsistência nos meses que não vão ser tão bons, o Estado levou tudo na mesma percentagem que leva às outras empresas.
Dou ouvidos a críticas se forem construtivas, o resto fica à porta. Nunca vamos conseguir controlar o que as pessoas dizem, por isso, mais vale não perder energia com isso. Sou de poucos mas bons amigos, depois sou acarinhada por muita gente que também gosto de acarinhar. Um amigo não é a pessoa que está sempre ali plantada mas é aquela que quando é preciso está lá. Não sou pessoa que perdoa facilmente mas não sou vingativa. Já fiquei mais amargurada com coisas que me ofendiam.
Em menina metia-me na bateira e ia à pesca com o meu avô. Os piqueniques eram feitos no meio do Tejo. Tive a sorte de ter nascido e crescido numa família que me deixou muitos e bons valores. Acima de tudo o respeito pelo próximo, a empatia e humildade, que hoje muito poucas pessoas têm. E o sentido de ajuda imediata. Se vir uma pessoa aflita não penso duas vezes em ajudar e sem intenção de receber em troca. Foi o que vi fazer na minha família.

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