Três Dimensões | 23-04-2025 07:00

“Não aceito na Ecodepur pessoas que não tenham sentido de humildade e entreajuda”

“Não aceito na Ecodepur pessoas que não tenham sentido de humildade e entreajuda”
TRÊS DIMENSÕES
Bernardo Taneco

Bernardo Taneco foi convidado com 25 anos a desenvolver a Ecodepur, no concelho de Ourém, líder nacional no fabrico de sistemas de tratamento e reutilização de águas e efluentes. Mais de duas décadas depois e da expansão para o continente africano, diz não ter perdido a humildade e nos tempos livres ajuda as associações.

Sou natural de Lisboa mas estou em Ourém desde os 25 anos. O meu primeiro emprego foi aos 16 anos a entregar cartas no centro de Lisboa. Foi um amigo do 12º ano que me fez ir para Engenharia do Ambiente. Estava muito focado na área da saúde por influência da minha mãe. Quase todas as mães querem ter um filho médico. O meu pai era músico de ópera no Teatro Nacional de São Carlos, como a minha família do lado paterno. Tenho uma irmã na área do desporto e uma filha a tomar a decisão do que quer seguir. É muito difícil aos 18 anos termos a certeza do que queremos, mas se tivermos a sorte de fazer algo de que gostamos, nunca vamos trabalhar verdadeiramente na vida.
Percebi que ser engenheiro do ambiente não significa ser ambientalista. Não serve para protestar, serve para apresentar soluções técnicas e economicamente viáveis. Depois de acabar o curso na Universidade Nova de Lisboa comecei a trabalhar na área de projecto na Engiciclo, em Alverca do Ribatejo, e foi pelo facto de desenvolvermos projectos comuns com a Henriques & Henriques que fui convidado pelo seu administrador e presidente, Saul Henriques, para desenvolver a Ecodepur e trabalhar activamente no sector ambiental. Temos feito este caminho desde 2002, sobretudo na área do tratamento e reutilização de águas. A esmagadora maioria das pessoas está aqui há muitos anos. Na parte da engenharia temos uma média de mais de 15 anos, porque é uma área aliciante. Estão sempre a surgir desafios e a serem desenvolvidas tecnologias novas, o que implica estar sempre na vanguarda e a investir em conhecimento. E também é extraordinariamente gratificante.
O nosso trabalho fundamental é levar saneamento a zonas onde não existe. Estamos presentes directamente em Portugal, Espanha e Marrocos, mas o nosso grande mercado é África. Formámos a Ecodepur Marrocos, sediada perto de Casablanca, em 2009. A nossa área de trabalho é cada vez mais a reutilização de águas residuais domésticas, águas cinzentas, águas pluviais, todas estas águas podem ser tratadas e reutilizadas em muitas operações: autoclismos, lavagens de viaturas, de pavimentos, redes de incêndio, de arrefecimento industrial, rega de espaços verdes, agricultura… Em Portugal somos 23 engenheiros, quase 40% da equipa são engenheiros. Temos em Fátima a nossa área técnica e comercial, a unidade de Casal dos Frades onde desenvolvemos os reservatórios e em Caxarias outra fábrica semelhante onde produzimos reservatórios mais pequenos. São as chamadas ETAR compactas para loteamentos, condomínios ou hotéis, sistemas de tratamento, mas que estão concebidos para serem completamente enterrados e evitarem qualquer tipo de impacto, visual e de cheiros.
Portugal precisa de massa crítica. Temos processos de investigação e desenvolvimento em curso com entidades do sector tecnológico e de ensino e acabamos por trabalhar com os jovens. Estamos a discutir com a Universidade de Coimbra um protocolo de cooperação no sentido de trabalhar para resolver alguns problemas ambientais no sector do azeite. Estamos associados à Associação Portuguesa de Engenharia Sanitária e Ambiental e à Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas, no meu caso participo activamente na APDA na comissão especializada da economia circular.
O facto de termos dificuldade em aceder a uma massa crítica pensante e tecnológica é limitativo, assim como alguns problemas de gestão de recursos humanos. Estamos em risco de não conseguir concretizar os fundos do Plano de Recuperação e Resiliência porque não temos pessoas para trabalhar. As barreiras do Trump preocupam pelo facto de conseguirmos perceber que vai contagiar a economia mundial. A barreira de Portugal é a barreira geográfica, somos periféricos, contudo, tentámos transformar essa desvantagem numa vantagem, direccionando a nossa actividade para África. Hoje a marca Portugal tem peso, nome, respeito. Somos considerados sérios e competentes.
Vivo em Tomar mas de coração sou de Ourém. Tenho muito orgulho na dinâmica empresarial e industrial de Ourém, porque vejo-a em muito poucos sítios. Deixei tudo para trás, mas hoje não trocaria onde vivo para voltar a Lisboa. Tomar é das cidades mais lindas que conheço, pouco desenvolvida do ponto de vista industrial, mais virada para o turismo. Quero continuar a expansão da Ecodepur geograficamente e do campo de soluções, continuar a crescer e afirmar-se como uma das melhores empresas europeias do nosso domínio.
O meu hobbie é ajudar algumas associações, como a ACR de Santa Cita e ACR da Linhaceira. Descobri isso no Ribatejo. Muitas vezes apoio as associações ao fim-de-semana, desde servir almoços, trabalhar em eventos para angariar fundos, ajudar em torneios, patrocinar alguns. Nunca estive ligado à política e sou da opinião de que não se deve misturar. Gosto muito de estudar e aprender e o meu tempo livre é passado entre amigos, a ler… A minha mulher até fica chateada porque em vez de estar a ler um romance gosto de ler livros de tecnologias. Sou muito humilde e empresarialmente não herdei nada, vim de uma família de classe média perfeitamente normal. Trato o meu director técnico da mesma maneira que trato a senhora da limpeza e não aceito dentro da empresa pessoas que não têm essa filosofia de humildade e entreajuda, porque todos são precisos.

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