Luís Martins: um homem do desporto que também é empresário e presidente dos Bombeiros de Salvaterra

José Luís dos Santos Martins, 53 anos, é sócio-gerente da Habimetal, em Samora Correia, e presidente da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Salvaterra de Magos. Natural de Lisboa, divide-se entre a vida empresarial e o voluntariado, sempre com a mesma energia que trouxe da infância que incluiu o Alentejo. Entre memórias do campo, quase dez anos na Polícia Marítima, uma ligação ao desporto, construiu um percurso feito de inquietação, projectos e liderança.
Os meus pais separaram-se quando eu tinha três anos. Cresci em guarda-partilhada, mas mais próximo do meu pai. As minhas melhores recordações de infância estão no Alentejo, nas Ermidas do Sado, com os meus avós paternos. É de lá que trago no sangue as raízes alentejanas. Lembro-me de andar de bicicleta, de ir à lenha com o meu avô, de cuidar dos animais, do cheiro da comida feita na lareira e do café que a minha avó preparava. Era um miúdo traquina e inquieto, não por fazer maldades, mas por não conseguir estar quieto. Subia às árvores, corria atrás das ovelhas e, quando todos dormiam a sesta, arranjava maneira de sair à rua e brincar, mesmo que as vizinhas viessem pedir à minha avó para me sossegar.
Nunca pensei no que queria ser. Limitava-me a acompanhar o meu pai às oficinas e às obras. Gostava de motas, carros e futebol, e passava os Verões a jogar à bola em campos de terra batida e debaixo do calor no Alentejo. Sempre fui de gostar da liberdade do campo, nunca de estar fechado. Estudei desporto em Lisboa, mas não cheguei a concluir o curso. Na altura tive de me apresentar para a tropa e acabei por ingressar na Marinha. Frequentei a escola da Armada em Vila Franca de Xira e, com as notas que tive, escolhi seguir para a Polícia Marítima, no Comando de Defesa Marítima de Setúbal. Foram quase dez anos. Ainda hoje me sinto fascinado por Setúbal, pelos golfinhos, pelo mar. Mas a rotina militar, sempre igual, acabou por me afastar.
Quando saí, fui trabalhar para a Habimonta e para a Habimetal, empresas do meu pai, onde já ajudava nas férias. Pouco depois, o meu pai construiu uma casa de fim-de-semana em Samora Correia e mudei-me para lá. Passei por todas as fases da empresa e isso deu-me uma experiência valiosa. Em 2003, a Habimonta chegou a ser o maior empregador do concelho de Benavente, com 80 trabalhadores. Éramos pioneiros em construções modulares, com obras em todo o país. Fiz de tudo: desde vender contentores a carregá-los e depois a entregá-los, ou mesmo a ir ajudar aos sábados.
Sou sócio-gerente maioritário da Habimetal, com o meu tio como sócio minoritário. A empresa tem cerca de 40 anos e conheceu altos e baixos. Já teve quatro funcionários, passou pela crise de 2007 com apenas dois e agora emprega entre 15 e 20 pessoas. É uma empresa pequena, mas próxima dos clientes, onde se criam laços. Não sinto o peso da responsabilidade: tanto aqui como nos bombeiros, há sempre problemas para resolver e vamos evoluindo.
O Estado trata mal os empresários. Carrega demasiado em impostos e não motiva quem cria emprego. Se os empresários fossem melhor tratados, haveria mais riqueza e mais aumentos salariais. Na minha empresa ninguém recebe o ordenado mínimo, todos têm horas pagas, prémios quando merecem e motivação para trabalhar. O sector da construção vive uma crise de mão-de-obra. Há construtores a disputar trabalhadores, oferecendo mais 50 euros para os desviar da concorrência. É também cada vez mais difícil para os jovens comprar casa sem capitais próprios. É preciso salários melhores, mas isso só se consegue com empresas sólidas e trabalhadores qualificados. O problema é que falta planeamento: formamos pessoas sem atender às profissões em falta no mercado.
Os pedreiros, serventes ou sapateiros começam a ser valorizados e a ser bem pagos, porque são escassos. É justo. O que falha ainda é a formação. O segredo, para mim, é trabalhar em união. Era isso que diria a um Primeiro-Ministro ou a um Presidente da República. Seja como empresário, presidente dos bombeiros ou presidente de um clube, a nossa palavra não é a palavra de Deus. Ganho experiência a ouvir os outros. O problema do país é ser reactivo e não preventivo. Vemos isso nos incêndios: só se pensa em comprar aviões ou kits quando o fogo já está a arder. Falta planeamento. O mesmo se aplica às crises económicas ou às guerras: só se reage quando já é tarde. Não nos precavemos, não prevenimos. Por isso quando damos um tiro para o ar desata tudo a correr.
O desporto também marcou o meu percurso. Fui presidente do Clube Desportivo Salvaterrense durante dois a três anos e daí cheguei ao Sporting, onde entre 2016 e 2018 fui director de recrutamento no futebol feminino. Ganhei todos os títulos possíveis e senti-me realizado. Entrei no futebol por acaso, a ajudar o meu filho nos treinos, mas acabei a implementar projectos e a aprender com os pais, os jovens e a lidar com a falta de recursos de um clube. Foi no Salvaterrense, essencialmente pelo projecto do futebol feminino, que o Sporting se interessa pelo trabalho desenvolvido. Essa experiência, como tantas outras, deu-me a bagagem que hoje aplico como empresário e presidente dos bombeiros: lidar com pessoas, começar do zero e ver as coisas crescer. É isso que me dá pica. Estar parado é que não.
Não tenho sonhos por concretizar. O mais importante é saúde, sentir-me bem e fazer os que estão à minha volta sentirem-se bem também. Se me saísse o Euromilhões ajudava os meus filhos, os bombeiros e quem esteve ao meu lado. Nem sempre com dinheiro, porque há muitas formas de ajudar. Valorizo a justiça, a honestidade e a frontalidade. A falta de valores e as injustiças revoltam-me. Tenho uma ligação profunda ao mar: gosto de andar de veleiro, de mota de água, do meu barco, do cheiro da praia. Preciso do mar e do sol. Também gosto do campo, de Salvaterra de Magos ou do Alentejo, onde vivo rodeado de silêncio. O que me faz sentir especial são os meus filhos e a minha companheira.