“Luta dos trabalhadores da Sumol+Compal devia ser notícia todos os dias”
Marcos Rebocho tem 49 anos, vive em Vialonga desde os seis anos e não se vê a residir noutra localidade. É coordenador nacional do STIAC - Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Indústria Alimentar. Trabalha em Santarém e tem acompanhado de perto a luta dos trabalhadores de várias empresas, incluindo da Sumol+Compal, que critica por em doze anos não ter aumentado os salários dos colaboradores. Gosta de perceber as dinâmicas laborais e avisa que um patrão que não valorize os trabalhadores mais tarde ou mais cedo acaba por ter problemas.
Vim morar para Vialonga com seis anos e ainda cá vivo. Passei aqui a minha infância e a minha adolescência. Há 40 anos, Vialonga ainda era uma terra pouco procurada, um meio pequeno onde toda a gente se conhecia. Ainda hoje mantenho os meus amigos de infância, jogávamos à bola juntos, havia um grande convívio entre todos, os de Santa Eulália, da Granja, da Verdelha e do Cabo. Foi uma pena a freguesia ter acabado com as vialonguíadas, era um projecto que juntava toda a gente.
O maior problema de Vialonga são os acessos. Por causa dessa falta está a tornar-se mais difícil viver cá, especialmente nas horas de ponta. A variante que hoje existe também já não resolve as necessidades. Era muito importante avançarem com o nó dos Caniços na A1 para o trânsito poder fluir melhor. Hoje demoramos imenso tempo nas horas de ponta para conseguir entrar e sair da vila.
O meu primeiro emprego foi no aeroporto de Lisboa. O meu pai já lá trabalhava e ajudou-me a arranjar essa vaga, tinha uns 16 ou 17 anos. Comecei a trabalhar para a Delta Airlines na parte de despachar e separar bagagem. Depois não tive muitos empregos, fui para a fábrica da Matutano no Carregado trabalhar na linha de montagem das batatas fritas. Fiquei lá 30 anos mas não enjoei o cheiro (risos). Entretanto entrei como coordenador nacional do STIAC - Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Alimentar. Faço a gestão de toda a estrutura do sindicato e da rede de dirigentes e delegados sindicais em várias empresas.
Há muita gente a odiar os sindicatos mas sem perceber completamente o nosso papel. Conhecemos muitos trabalhadores que não são sindicalizados e que, depois, ao mínimo problema procuram o sindicato. A maioria das pessoas desconhece que as quotas que paga para os sindicatos pode reavê-la nos descontos do IRS. Este novo pacote laboral que o governo está a preparar vai ser bastante lesivo para os trabalhadores. Querem, por exemplo, criar um banco de horas individuais para cada trabalhador, em que a pessoa em vez de receber pelas horas extra acumula essas horas para gozar depois. Mas depois, quando quer tirar as horas ou precisar delas para ir a uma consulta, o patrão nunca as dá. Muito dificilmente o trabalhador vai conseguir tirar as horas, porque o patrão vai sempre arranjar uma desculpa qualquer para não as dar. Além disso, também querem introduzir mecanismos para facilitar o despedimento sem justa causa, assim, sem mais nem menos, ignorando anos e anos de contribuição de um trabalhador para a empresa.
Um patrão que não estime nem valorize os seus trabalhadores mais tarde ou mais cedo vai perceber que perde mais do que ganha. A própria marca da empresa acaba por ficar mal vista no mercado. Os trabalhadores falam entre si. Sabem onde é bom trabalhar e onde não é. A motivação é importantíssima e a valorização é extremamente importante para os trabalhadores. Quando isso acontece, as empresas ganham. Os sindicatos são o farol de esperança para os trabalhadores. Uma coisa que me dá imenso prazer é perceber as dinâmicas de cada local de trabalho e as diferentes realidades. Fui estudar sociologia para melhorar a minha parte cultural, mas também para perceber melhor estas dinâmicas.
Muitos patrões em Portugal ainda funcionam à base de incutir o medo nos trabalhadores. Tira-me do sério esse desrespeito e a desvalorização que existe no mercado de trabalho. Irrita-me profundamente. Nesses casos, os sindicatos são muito importantes para proteger os trabalhadores. Incluindo em casos de assédio ou bullying. Comparando com os países nórdicos, por exemplo, que têm uma visão social totalmente diferente dos trabalhadores, estamos muito atrasados. Eles não olham para o empregado como uma ferramenta para ter lucro, mas sim como parte da engrenagem, parte de um todo. Em Portugal muitas empresas ainda funcionam à base do medo. Tentam incutir nos trabalhadores o medo do patrão e isso reflecte-se muito em Portugal, sobretudo nas empresas familiares.
Não percebo como é que um caso como o da Sumol+Compal de Almeirim não está nos noticiários todos os dias. É uma empresa que teve 14 milhões de euros de lucro o ano passado e que durante 12 anos não aumentou salários. Actualizava-os, não os aumentava. Como é que uma empresa que deu 14 milhões de lucro não reage quando se pede para aumentar salários para um mínimo dos mínimos para se conseguir viver em Portugal, que são os mil euros por mês? As nossas greves na empresa têm dado resultado. Temos uma reunião agendada com a empresa este mês, vamos ver o que conseguimos negociar. Os trabalhadores aprovaram três moções com reivindicações que entregámos à empresa e nem nos responderam. Durante muitos anos as pessoas queriam trabalhar na Sumol+Compal por ser um espaço onde o trabalho era reconhecido e valorizado, agora não é assim.
Para mim o Natal é família e não gosto do consumismo da quadra. Os cartões de crédito ajudam a esse consumismo. Para mim, os valores do Natal são a família, a saúde e o convívio naquela noite de Natal. Uma das minhas viagens de sonho é continuar a conhecer Portugal, somos um país muito interessante. Também gosto de cozinhar e cozido à portuguesa é o meu prato favorito. Gosto mais de praia do que montanha quando passo férias. No concelho de Vila Franca de Xira, para mim, Vialonga é o local favorito. Não digo que a construção das piscinas seja o principal a ser feito na vila, mas acho que era importante termos um espaço cultural, polivalente, com valências variadas, como música e um anfiteatro com espaço para exposições.


