Três Dimensões | 26-04-2022 12:00

“Hoje se uma criança é empurrada por outra na escola já é vítima de bullying”

Isabel Veiga é professora há 27 anos e directora do Agrupamento de Escolas Alves Redol há sete

Isabel Veiga, 48 anos, directora do Agrupamento de Escolas Alves Redol em Vila Franca de Xira.

Isabel Veiga nunca quis ser professora mas apaixonou-se pela profissão à primeira aula. Ao fim de 27 anos de serviço confessa que já pensou por um ponto final na carreira, que deixou há muito de ser atractiva. Explosiva por natureza, a directora do Agrupamento de Escolas Alves Redol não suporta hipocrisias. Viveu uma infância livre e feliz e lamenta que as crianças de hoje não tenham a mesma sorte.

As crianças têm pouca liberdade para brincar e desenvolver autonomia. Muitas não sabem o que é saltar à corda ou andar de bicicleta, vivem agarradas ao telemóvel. Tive a sorte de ter uma infância feliz a tratar das cabras com a minha avó, a jogar aos jogos da pedra e do lenço e ir e vir da escola a pé com outras crianças.
Hoje se uma criança é empurrada por outra na escola já é vítima de bullying. Mas isso é o viver normal de uma criança, que ainda não tem consciência que está a fazer mal. Não quero com isto dizer que o bullying não existe porque existe mas é preciso saber o que é.
Nasci numa pequena aldeia do concelho de Alvaiázere. A minha mãe trabalhava no campo e o meu pai era polícia em Torres Novas. Aos 15 anos fui viver para Tomar, onde tirei um curso técnico-profissional de informática. Licenciei-me depois na mesma área num pólo do ISLA em Torres Novas.
Nunca quis ser professora mas depois de experimentar nunca mais deixei o ensino. Comecei a dar aulas de informática na Escola Profissional em Torres Novas enquanto fazia a faculdade à noite. Em concurso nacional  a primeira vez que fiquei colocada foi na Secundária de Ourém.
Já pensei em abandonar o ensino por estar zangada com o Ministério da Educação. Há muito que a carreira de professor deixou de ser atractiva. Tenho 27 anos de serviço e acabei de integrar o quarto escalão da carreira. Nem eu nem nenhum professor da minha geração vai chegar à reforma no topo da carreira.
A sociedade criou a imagem que os professores trabalham pouco, ganham muito e se reformam cedo. Não é verdade e também é preciso desconstruir a ideia de que temos três meses de férias.
A falta de professores vai ser o maior desafio da escola pública nos próximos cinco anos. Vai haver uma debandada de reformas e ninguém para ocupar esses lugares porque os cursos base pedagógicos para formar professores ficam desertos. E em zonas como Vila Franca de Xira onde o preço das casas é um absurdo o problema vai agravar porque com salários de mil euros e deslocados, muitas vezes a  pagar duas casas, fica difícil. Não se percebe como é que os professores do norte vêm parar ao sul e os do sul ao norte.
Os alunos ainda não estão habituados a usar o telemóvel na aula para fins pedagógicos. Para a maioria é só para brincar. Hoje dizem-nos que não podemos dar aulas como há 20 anos mas há questões como a dos telemóveis que são culturais e levam o seu tempo a mudar.
Os meus pais priorizaram e valorizaram a minha formação académica e foi o melhor que podiam ter feito por mim. Apesar de não serem ricos para os estudos, nunca me faltou nada. O primeiro computador que me deram custou uma fortuna.
Não podemos servir-nos dos cargos que exercemos para fazer perseguições. Enquanto directora tracei uma linha recta de valores que assenta em tratar todos por igual. No dia em que a quebrar vou-me embora.
Sou energética e por vezes explosiva, mas logo de seguida acalmo-me e procuro resolver o problema que tenho em mãos. Às vezes tenho excesso de opinião, mas não sou ressabiada nem de guardar rancor. Hipocrisia e maldade gratuita são as piores características do ser humano. O que mais valorizo no outro é o espírito solidário e a lealdade. Hoje tenho menos amigos que há uns anos mas os que tenho são leais. A vida ensinou-me a seleccionar melhor quem quero ter à minha volta.
O meu pequeno prazer da vida é ficar em casa com os amigos a comer uns grelhados e a beber um copo de vinho tinto. Gosto de dançar e de cantar karaoke em casa, com privacidade.
Na minha vida não pode faltar o meu marido e a minha filha. Em minha casa não pode faltar café. Sou uma mãe muito orgulhosa da filha que tenho. Não sou de Vila Franca de Xira mas sinto-me vilafranquense. Se pudesse trazia para a cidade um bom restaurante com música ao vivo. Não vou às touradas mas respeito muito essa tradição.
Na vida falta-me fazer voluntariado numa pediatria e viajar mais. Quero conhecer o Egipto, a Índia, Turquia, Moçambique e Cabo Verde, pelas suas culturas. Sou de andar com a mochila às costas, não tenho paciência para ficar numa praia a apanhar sol.

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