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Nos últimos dois anos foram detectadas no distrito de Santarém apenas duas situações de ile3galidade

Fotocópias assassinas

Inspecção Geral das Actividades Culturais diz que o distrito não é dos piores

A cópia ilegal de obras científicas, a que alguém já chamou “fotocópias assassinas”, prolifera sobretudo junto às instituições de ensino superior. No distrito de Santarém, onde se espalham várias escolas superiores, o panorama não é dos mais negros. Nos últimos dois anos a Inspecção Geral das Actividades Culturais detectou apenas dois casos de ilegalidade. Os estudantes não são apologistas das cópias integrais, mas queixam-se que os preços de alguns livros científicos são demasiados elevados. Quem sai prejudicado são autores, editores e livreiros.

“A fotocópia mata o livro”. O aviso lê-se no balcão do Centro de Cópias Copimodel, na Avenida Madre Andaluz, em Santarém, quase em frente à Escola Superior de Educação. Há muito que a gerente da empresa, Isilda Marques, rejeitou as fotocópias que assassinam os livros. No centro tiram-se cópias de obras, mas o cliente tem que assinar um documento que deixe claro que “as cópias são para uso exclusivamente privado”.No último Verão a empresária foi fiscalizada pela Sociedade Portuguesa de Autores, mas não teve problema uma vez que a filosofia da casa é a de proteger o livro. “Não é das fotocópias dos livros que vivemos”, garante. A cópia de livros é morosa e pouco rentável. “Damos cabo do livro, das costas e é proibido por lei”, resume.No Escritório Moderno, no centro histórico de Santarém, também só são tiradas fotocópias de alguns excertos de livros, “normalmente quando não se consegue encontrar o livro”, explica o gerente António Miguel.O chefe de divisão da Inspecção da Geral das Actividades Culturais (IGAC), Ricardo Hipólito, confirma que no distrito de Santarém o panorama não é dos mais negros. Nos últimos dois anos foram apenas duas situações de irregularidade. Em Santarém e Rio Maior.Num centro de cópias em Santarém foram encontradas largas dezenas de dobras científicas copiadas. O processo foi remetido ao Ministério Público. A cópia e posterior venda de fotocópias de obras literárias indicia a prática de um crime de usurpação ou aproveitamento da obra previsto no código de direito de autor que é punível com pena de prisão até três anos e multa de 150 a 220 dias.Ricardo Hipólito acredita que as pessoas estão conscientes de que se trata de uma ilegalidade, até porque os livros já trazem esse aviso, mas “não dão relevância ao acto ilícito que estão a praticar”. O presidente da Associação de Estudantes da Escola Superior de Desporto de Rio Maior, José Moules, admite que o recurso à fotocópia é utilizado, como em outras escolas, mas não é apologista das cópias integrais. “Uma coisa é fotocopiar um artigo e outra coisa é a fotocópia integral da obra”, esclarece.Muitos estudantes optam por comprar livros porque se trata de “um investimento para sempre”, mas em alguns casos os preços são condicionantes. O preço de alguns livros atinge os 100 ou 150 euros, o que para muitos representa o valor do alojamento.Tal como José Moules, o presidente do Instituto Politécnico de Tomar (IPT), Jorge Ferreira, também prefere ter os livros. “Mas se o estudante fosse adquirir os livros para cada uma das cadeiras isso seria um balúrdio”, calcula Jorge Ferreira, adiantando que os professores facultam uma lista bibliográfica para cada disciplina. O responsável da associação de Tomar compreende a posição dos editores, mas lembra que não se verifica qualquer apoio para a aquisição de material de estudo. “Não acredito que um estudante prefira uma fotocópia a um livro”.Na Escola Superior de Educação de Santarém não são tiradas cópias de obras integrais. A presidente da Associação de Estudantes, Célia Peneireiro, adianta que fotocopiam apenas pequenos excertos até porque quem escreve também precisa de ter lucro. “Muitos preferiam os livros, mas não podem comprar”.A CONSTITUIÇÃO EM FOLHAS SOLTASRicardo Hipólito considera que se trata de uma questão social. “Os estudantes queixam-se que não têm meios para adquirir ou os livros têm preços elevados, os editores dizem que não vale a pena apostar na tradução porque não há mercado e os livreiros não vêem vantagem em fornecer os livros”.Reconhece que o livro é encarado por alguns alunos, como algo efémero, que depois do curso deixará de ter uso. Só assim se justifica que um estudante de Direito fotocopie as páginas da Constituição da República Portuguesa. Em muitos casos o preço de um conjunto de fotocópias atinge quase o valor do livro. Em alguns casos existem “autênticas tipografias” com centenas de livros já duplicados e registos informáticos com ordem para que o computador imprima as páginas de um livro. Para o responsável deve prevalecer sobretudo “o bom senso”.Autores, editores e livreiros são quem mais se sente lesado com o “assassinato dos livros”. O presidente da direcção da Apel - Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, António Baptista Lopes, não consegue quantificar o prejuízo que significa “a praga das fotocópias”.Se avançar o projecto para a descriminalização da fotocópia (ver caixa) o responsável teme que possa ficar em causa a continuidade de algumas edições. A fotocópia, “um roubo relativamente ao livro, funcionaria como uma segunda actividade editorial à margem do mercado. Para a Apel, a fotocópia só se admite quando o livro não está disponível no mercado. António Baptista Lopes rejeita o argumento dos estudantes, lembrando que um livro implica custos e que é mais acessível que outros produtos. “Os livros devem ser encarados como um bem fundamental para a formação académica e cívica”, afirma.Não é só uma questão económica, mas de uma questão cultural. “Mal do país se vai formando as suas elites apenas pela leitura das fotocópias”.Descriminalização das fotocópias em estudoO Ministério da Cultura (MC) está a analisar uma proposta de Decreto-Lei que prevê a descriminalização das fotocópias de livros e a aplicação sobre os equipamentos de reprodução de uma nova taxa que reverterá para autores e editores.No final de Novembro, o Gabinete de Direitos de Autor (GDA) do Ministério da Cultura entregou à tutela o Projecto de Decreto Lei para Transposição da Directiva Comunitária 2001/29/CE, de 22 de Maio, relativa à harmonização dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos na Sociedade de Informação.O anteprojecto estabelece, nomeadamente, que é lícita e não carece de consentimento do autor a reprodução de uma obra para fins privados, realizada através de qualquer tipo de técnica fotográfica ou processo com resultados semelhantes.Em contrapartida, no preço de venda ao público de todos os aparelhos mecânicos, químicos, electrónicos ou outros que permitam a fixação e reprodução de obras - com excepção do papel - será incluída uma quantia destinada a beneficiar autores e editores visados.De acordo com um porta-voz do ministro da Cultura, Pedro Roseta, contactado pela Agência Lusa, trata-se de assumir na lei uma realidade que todos conhecem e que parece difícil de travar, já que, nomeadamente no meio universitário, o recurso à fotocópia surge como hábito enraizado.Por outro lado, o legislador toma como fundamento o acesso cada vez mais generalizado à Internet, que acaba por agir no sentido contrário a qualquer proibição, anulando fronteiras e favorecendo uma maior liberdade na reprodução de obras. Ana Santiago
Nos últimos dois anos foram detectadas no distrito de Santarém apenas duas situações de ile3galidade

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