Reanimar o centro histórico de Abrantes com dois novos museus e mais habitação e comércio
Maria do Céu Albuquerque recandidata-se a um último mandato à frente da câmara. Não afasta a hipótese de poder vir a ser deputada mas só depois de sair da Câmara Municipal de Abrantes. Explica que integrou a lista de António Gameiro à Federação Distrital do PS Santarém abdicando de uma candidatura própria para não perturbar o partido numa altura em que o mesmo é governo em condições “muito exigentes”. O maior projecto que tem em mãos é o de dar vida ao centro histórico da cidade.
O concelho de Abrantes não está disponível para receber refugiados e o argumento é a falta de habitação social. Um concelho que tem vindo a perder população e a ver aumentar o índice de envelhecimento e que tem uma maternidade onde há cada vez menos partos não deveria fazer um esforço para receber refugiados? Neste momento não podemos porque temos esse problema. Temos falta de alojamento.
A falta de habitação social é comum a quase todos os municípios, nomeadamente do interior. No entanto Portugal tem vindo a manifestar a intenção de receber ainda mais refugiados do que estava inicialmente previsto. O primeiro-ministro não conhece bem a realidade do país? Há municípios que estão preparados para poder receber essas pessoas. Não cabe ao primeiro-ministro olhar para a árvore. Cabe-lhe olhar para a floresta e lançar as oportunidades para quem tiver capacidade aproveitar.
Abrantes precisa de mais população mas não pode aproveitar. Neste momento não mas estamos a alterar essa situação. A Câmara de Abrantes tem dois módulos de apartamentos que comprámos à Caixa Geral de Depósitos, que tinham sido entregues pelo promotor e que queremos terminar e tem, no centro histórico, um conjunto de casas que vai recuperar para poder aumentar o número de habitantes, seja por via da fixação de quadros que dão apoio às empresas ou aos projectos empresariais que já cá existem e aos que se venham a fixar, seja também por via, por exemplo, dos refugiados.
A câmara já comparticipou no alojamento de médicos, por exemplo, e há dois anos criou um incentivo de nove mil euros por ano para cada médico que aceitasse trabalhar no concelho. Quais os resultados? Já temos uma equipa de cinco médicos constituída, que já apresentou uma candidatura para a criação da USF (Unidade de Saúde Familiar).
Eram médicos que já estavam aqui ou que vieram para aqui? Dois deles já cá estavam. Esses ficam fora desse pacote de incentivos. Os outros três são médicos que vêm de novo para cá.
Por falar em médicos. Vai levar a mal que a sua filha mais velha, quando acabar Medicina, não queira trabalhar em Abrantes? A minha filha está no segundo ano e quando ela terminar o curso eu já não serei presidente da câmara. Essa decisão será dela.
Abrantes vai investir vários milhões de euros, com apoio comunitário, num Museu de Arte Contemporânea e num Museu Ibérico de Arqueologia e Arte. Acha que se decidisse referendar estes investimentos os munícipes iriam aprová-los? Há decisões que têm que ver com questões estratégicas. Estamos a falar de incentivos comunitários disponíveis para o país se tornar mais competitivo e diferenciador. A nossa aposta é na regeneração urbana do centro histórico de Abrantes e tem enfoque no comércio tradicional, no condomínio residencial e na dimensão cultural.
A decisão está tomada e vai avançar. Está já a ser concretizada. Queremos um centro histórico com comércio tradicional e serviços de proximidade. Daí termos levado para dentro do centro histórico o Centro de Saúde/Unidade de Saúde Familiar e estarmos a criar condições para a instalação da Loja do Cidadão e daí termos reabilitado o mercado diário e termos um programa de incentivo ao comércio tradicional, nomeadamente ajudando financeiramente os novos promotores a desenvolverem as suas ideias. Por outro lado estamos a preparar-nos para recuperar edifícios municipais devolutos e degradados para o mercado de arrendamento, com um arrendamento a custos controlados.
E daí o investimento nos museus. Estamos a assumir uma dimensão cultural que entendemos essencial para podermos competir e acrescentar valor às estratégias do Médio Tejo e do país para o desenvolvimento do turismo. Não queremos competir com Tomar, que tem o Convento de Cristo, ou com a Barquinha, que tem o Castelo de Almourol, mas sabemos que podemos contribuir com o nosso património existente, seja a fortaleza, sejam as igrejas património nacional, sejam esses museus.
A estratégia de investimento mudou nos últimos anos. Ainda no âmbito do QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional), vimos chumbada a hipótese de avançar com a recuperação do Convento de S. Domingos e a construção de uma parte nova. Era um investimento de 14 milhões de euros para fazer um único projecto. Agora a nossa estratégia é diferente. Em vez de estarmos a fazer um investimento de 14 milhões de euros num grande museu, aquilo que estamos a fazer é dotar o nosso centro histórico de pólos que levem o turista a visitar todo o centro histórico.
Um percurso pedonal por um centro histórico habitado, com comércio tradicional e motivos de interesse. Queremos que os visitantes vão ao convento de S. Domingos e que usufruam da colecção de arqueologia da Fundação Estrada e da própria câmara; que possam visitar a colecção Maria Lucília Moita, que possam ir ao edifício Carneiro visitar a colecção Charters de Almeida e que depois, através do Jardim do Castelo, possam fazer um percurso onde estarão também obras desse escultor, entrando na fortaleza através da porta da traição. Aí podem ir até à Igreja de Santa Maria do Castelo e à galeria municipal ver as exposições que ali estejam a ser apresentadas.
Resta saber se os privados também irão tratar do seu património, mesmo com os incentivos que possam vir a ser criados. Precisamos de mais investimento privado, mais empresas, mais emprego, para podermos, efectivamente, aumentar essa massa crítica, para que essas operações de regeneração urbana tenham sucesso. Os privados viram as operações de financiamento vedadas no quadro comunitário anterior o que não acontece neste. E agora há maiores incentivos fiscais.
Como avalia os resultados do investimento no Tagusvalley - Tecnopólo do Médio Tejo? As coisas têm corrido bem embora a evolução não tenha sido propriamente rápida. Eu costumo dizer que é sempre motivo de satisfação o aparecimento de uma empresa que se instale no nosso concelho ou em qualquer ponto do país e que crie 50 postos de trabalho. Ora, um projecto como este, que cria 50 postos de trabalho mas através de várias pequenas e micro empresas em incubação, é uma projecto que também deve ser motivo de satisfação. Ele permite a fixação, nomeadamente de quadros jovens que estudam no Politécnico de Tomar, que estudam na Escola Superior de Tecnologia de Abrantes e outros que escolhem o nosso parque para se instalar. O Tagusvalley é claramente um bom investimento.
A IBM vai sair de Tomar para Abrantes como se diz? Não é verdade que a IBM vá sair de Tomar para Abrantes. A Compta já está instalada no parque através da plataforma Luzídeia e a IBM está a ponderar também fazer mais um investimento no Médio Tejo e em concreto em Abrantes para reforçar a sua capacidade de intervenção, não só no Médio Tejo mas também no país. Repito, não é para retirar de Tomar, antes pelo contrário. É para dar corpo à estratégia da IBM que se iniciou e que se vai continuar a desenvolver.
Há um ano morreram milhares de peixes na zona do açude insuflável, na chamada escada passa-peixes. Na altura falou-se em evitar nova situação e na implementação de um sistema de monitorização dos peixes. O que foi feito de então para cá? O problema da mortandade dos peixes na escada passa-peixes teve a ver, primariamente com os caudais diminutos que chegam a Portugal e foi agravado pela qualidade da água. Houve um problema aqui na escada passa-opeixe e logo a seguir houve na Ortiga (Mação) onde morreram milhares de peixes. Estamos a falar de situações que não podemos separar umas das outras.
Já estão a monitorizar os peixes? O açude foi construído e era um processo inovador em Portugal. A sua concepção e construção foram acompanhados por uma equipa pluridisciplinar com pessoas que representavam as instituições que tutelam estas matérias, nomeadamente ao nível do ambiente e dos recursos hídricos. Só na fase de licenciamento foi exigido pelo Instituto de Conservação de Natureza e Florestas que fosse instalado um sistema de monitorização da passagem dos peixes. É nesse sentido que a Câmara de Abrantes, neste momento, está a trabalhar com dois investigadores, para que possa instalar esse processo.
A responsabilidade da monitorização dos peixes não tinha passado para outra entidade? Nós propusemos em 2010 à Administração Regional Hidrográfica que nos permitisse a instalação de uma mini-hídrica na zona do açude para aproveitar aquela infra-estrutura. A ARH lançou um concurso público, dado que é assunto da sua competência, fez a selecção da empresa, assinou o contrato. As condições por nós colocadas eram que o licenciamento implicasse a instalação do tal sistema de monitorização dos peixes. O que é facto é que esse processo tem estado parado, pese embora as diligências que a Câmara de Abrantes tem vindo a fazer e avançámos a expensas próprias com o sistema de monitorização.
A escada passa-peixes não devia desaparecer? Não. Eu acho que é uma mais valia. Nós não desistimos dela. Os peixes não morreram por causa daquela estrutura. Foi pelo baixo caudal do rio e pela má qualidade da água. O Estado tem a obrigação para criar condições para que os caudais que chegam ao Tejo permitam manter um ecossistema e tem a responsabilidade de verificar todos os focos de poluição e de os combater.
E a câmara vai monitorizar... Para nós, neste momento, a monitorização da passagem dos peixes tem outra particularidade. Vai-nos permitir mostrar às pessoas que os peixes passam, acabando com alguma celeuma à volta desta questão, e por outro lado vai ser um factor de atracção adicional do ponto de vista do turismo de natureza e científico. Se os peixes não passassem de todo não havia pesca ilegal que tem levado a intervenções do SEPNA naquele local.
Já há alguma decisão do tribunal relativamente à reversão do terreno da RPP Solar que foi vendido ao empresário para a câmara? Ainda não.
E como está a situação do terreno no Barro Vermelho também vendido para um hotel que não avançou? Já há decisão do tribunal e estamos em condições de reaver o terreno. A escritura já está marcada. Neste caso, o que aconteceu foi que o processo de licenciamento não tinha sido concluído e enquanto o mesmo não estivesse encerrado nós não podíamos fazer a reversão do terreno. Isso decorre do código dos procedimentos administrativos.
A região não tem transportes públicos satisfatórios. A Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo chegou a fazer um estudo de mobilidade para negociar com o concessionário, que é a Rodoviária do Tejo, novos percursos e horários. Isso não avançou. Há alguma possibilidade de voltar a essa negociação? Têm sido feitos alguns ajustes por acordo com a concessionária mas há uma legislação que diz que até 2019, os municípios ou as comunidades intermunicipais têm a responsabilidade de assumir a gestão dos transportes. Temos trabalhado para assumir esta responsabilidade.
Contratar percursos e horários e preços a empresas de transportes, por exemplo? Aquilo que melhor responder à estratégia da região para podermos ter uma boa rede de transportes que articule o transportes rodoviário com o ferroviário e que articule também o transporte dentro de cada município, com as carreiras supra-municipais. Para já estamos a alargar o transporte a pedido a todos os municípios do Médio Tejo.
Esse é um tipo de transporte que apenas resolve pequenos problemas pontuais. O que eu gostava é que, também em política nacional de transportes, a mesma fosse pensada dentro de uma política de coesão territorial e social efectiva. Que não seja o interior do país a financiar os transportes nas áreas metropolitanas.
“Não me sinto derrotada dentro da Federação de Santarém do PS”
Para além de presidente da câmara é militante do Partido Socialista. Há dois anos candidatou-se à presidência da Federação Distrital de Santarém contra António Gameiro e perdeu. Este ano integrou a lista de António Gameiro. Se não o podes vencer junta-te a ele? Não desisti de lutar por poder contribuir para que o Partido Socialista seja um partido plural, onde as opiniões e diferenças se possam assumir. O que está na génese da minha decisão foi o facto de voltar a ser candidata à Câmara de Abrantes em 2017 e o meu foco político estar, por esse motivo, na minha concelhia, onde estamos a trabalhar para a minha reeleição bem como para a reeleição da equipa e dos presidentes de junta...
Podia ter-se afastado mas acabou por integrar a lista de quem antes combatia por não representar a melhor solução para o PS distrital. O PS é actualmente governo e em condições particularmente exigentes. Isso carece da nossa parte, enquanto militantes, de um esforço para podermos trabalhar todos para a consolidação deste processo político e para que o PS possa governar bem. Não me candidatei mas disse presente. Fiz parte das listas. Apresentei a minha candidatura para presidir à comissão política afirmando a diferença em relação ao António Gameiro mas podendo trabalhar para podermos afirmar o distrito de Santarém como capaz de fazer face aos desígnios que estão em cima da mesa.
O presidente da Distrital de Santarém é António Gameiro. Não se sente derrotada? Não me sinto derrotada. Nem agora nem quando perdi as eleições há dois anos. Nessa altura saí ganhadora porque quem não me conhecia ficou a perceber porque estou em política e o que quero fazer em política. Isso coloca-me em vantagem em relação àquilo que era anteriormente a essa candidatura. Claramente saio reforçada do ponto de vista pessoal, que é o que me interessa. E dentro da federação não respondo por nada nem por ninguém se não estiver convicta de que estão em causa os valores e os princípios em que eu acredito.
Se o PS permitir a candidatura a deputados de presidentes de câmara, gostaria de ser candidata? Eu não faço planos para o futuro. Não fiz carreira política. Não estive nas jotas, com todo o respeito por todos os que fizeram. Não fazia parte da minha ambição pessoal e política ser vereadora nem ser presidente de câmara. Tenho aceitado os desafios à medida que me são colocados. E é nesse sentido que tenho toda a abertura para poder continuar a servir, em primeiro lugar os cidadãos do concelho de Abrantes, do Médio Tejo, do Distrito de Santarém e de Portugal. Entendo o ser presidente de câmara enquanto serviço público. Depois de encerrar este capítulo da minha vida estarei disponível para outros desafios de serviço público.
“Sempre fomos exigentes com a concessionária Abrantáqua”
A Abrantáqua, empresa que tem a concessão do sistema de recolha e tratamento das águas residuais do Município de Abrantes tem beneficiado de alguma tolerância em matéria de atrasos no cumprimento do calendário de investimentos. Porquê? Foi feito um contrato com o objectivo de uma cobertura com redes de recolha e tratamento de águas residuais em 92 por cento do território. Esse contrato englobava uma parte de investimento e uma parte de manutenção. O que acontece é que aumentámos a quantidade de investimentos inicialmente previstos e daí também haver uma derrapagem no tempo em relação à sua concretização.
Isso é compreensível mas a inclusão de novos investimentos implicou novos prazos que não foram cumpridos. Houve situações que vieram impedir que o processo pudesse andar mais rápido, nomeadamente as aquisições dos terrenos necessárias para a instalação de alguns pólos novos, nomeadamente Estações de Tratamento de Esgotos (ETAR), estações elevatórias, passagem de condutas... Tudo isso tem, por vezes, vicissitudes. Da nossa parte não houve nunca, aqui, alguma beneficiação da entidade. Temos vários relatórios que atestam que houve da nossa parte uma grande exigência para o cumprimento dos prazos contratuais e das condições. O que houve efectivamente foi um acompanhamento deste processo de maneira a não o deitar abaixo. A Câmara de Abrantes não tinha interesse nisso.
Aceitaram a situação para não haver ruptura? Era bem pior haver uma ruptura da concessão do que continuar a trabalhar. Mas não há benefício da entidade, antes pelo contrário.