Cantor Pedro Barroso confessa que não consegue ser “gay” mas que se sente bem assim
Afastado dos palcos deu prova que a quimioterapia não lhe afectou o sentido de humor
O cantor, compositor e poeta, Pedro Barroso, que se encontra temporariamente afastado dos palcos, devido a doença, deu prova em verso, na passada quinta-feira, 12 de Maio, na sua página do Facebook, que a quimioterapia não lhe afectou minimamente o seu conhecido sentido de humor, nem a inspiração. Num poema ligeiro, Pedro Barroso, provocou as mais diversas reacções ao declarar de forma irónica que não consegue ser “gay” mas que, apesar disso, não se sente mal.
Numa breve conversa telefónica com O MIRANTE, o conhecido “trovador” de Riachos diz que tem imensos amigos com outras preferências sexuais e que nunca gostaria menos de alguém por isso e lembrou, a propósito, que foi amigo do poeta José Carlos Ary dos Santos e do actor e encenador escalabitano Mário Viegas, homossexuais assumidos.
Os versos irónicos que escreveu diz, são a propósito da pressão que leva a que certos temas como o casamento gay ou como a adopção por casais do mesmo sexo sejam prioritários em termos de agenda política, em relação a matérias ultra preocupantes como o desemprego, a injustiça fiscal gritante, o terrorismo, o colapso do sistema bancário. “Sou belenenses e não gosto que me pressionem com a superioridade e o orgulho benfiquista, por exemplo. Sejamos todos felizes dentro da nossa condenada condição humana. Mas não me chateiem; não me rodeiem; não me obriguem; não me cerquem. Pim!”.
E ainda a propósito da “nossa condenada condição humana”, sem se alargar muito em explicações, disse que, como muitos milhares de pessoas luta contra o cancro para tentar voltar a estar em palco com os seus músicos, junto ao seu público.
POEMA
O cerco
Venho aqui pedir desculpa
de não ser evoluído,
apesar destas campanhas
na rádio, na televisão,
em toda a parte, insistindo
na urgência do assunto…
Eu não consigo gostar;
- não consigo mesmo, pronto.
Sei que pertence ser gay,
toda a gente deve ser.
Mas eu, lamentavelmente
não sou como toda a gente;
Como aconteceu... não sei,
peço desculpa por isso,
mas confesso: sou… diferente.
Sei que vos pode ofender
esta minha enfermidade,
pois um gajo que assim pensa
hoje em dia, não tem nexo;
deveria ser banido,
expulso da comunidade.
É uma vergonha indecente
Gostar de mulher, ter filhos
Casar, afagar, perder-se
Com pessoa doutro sexo!
Uma nojeira repelente;
Dar-lhe, até, beijos na boca
em público! E declarar
Esta sua preferência
Que eu nem sei classificar!
Tenho uma vergonha louca
E desejo penitência
por tal desconformidade,
retardamento, machismo,
doença, fatalidade!
Já tentei tudo: - inscrevi-me
em saunas, aulas de dança
cursos de perfumaria
origami, greco romana,
ioga - para ter ousadia
boxe - p’ra ganhar confiança...
Mas quando chega o momento
De optar… sou… decadente,
Recorrente e insistente.
Opróbrio raro e demente,
Ver uma mulher seduz-me,
Faz-me vibrar, deslumbro.
Vê-la falar, elegante;
Vê-la deslizar, sensual
Como vestal, deslumbrante
Seu peito assim, saltitante
Sua graça embriagante
olho com gosto, caramba,
lamento ser tão ...normal.
Mas eu confesso que sinto
- neste corpo tão cansado
Que da vida já viu tanto...
Ainda sinto um desejo
Que m’ envergonha bastante
Por ser já tão deslocado
tão antigo, assim tão fora
do mais moderno critério.
Valia mais estar calado
Mas amigos, já agora
Assumo completamente:
- Tenho esse problema sério.
Nunca integrarei partidos
Onde não sou desejado.
No planeta das tais cores
não tenho dia aprazado,
nem bandeira, nem veado,
nem “orgulho” especial!
Sou mesmo do “outro lado”
dito “heterossexual”
e já me chateia um bocado
Ter que dizer, embaçado,
que me atrai o feminino
e sou apenas “normal”!
- e, portanto, avariado.
Mas… mesmo assim, - saudosista,
imensamente atrasado,
terrivelmente cercado,
conservador nesse ponto,
foleiro, desajustado...
perdoai-me tal pecado
- Não me sinto ...assim tão mal!