Dar sangue é pensar no próximo e não nos benefícios que se obtêm
Quatro dezenas de pessoas deram sangue nas instalações de O MIRANTE em Santarém. Quem dá sangue fá-lo com sentido solidário e não para usufruir das regalias concedidas aos dadores, que até já foram mais do que na actualidade. Essa foi a opinião da maioria dos dadores ouvidos pelo nosso jornal.
Não é o facto dos dadores terem ou não compensações - como o não pagamento das taxas moderadoras nos hospitais, por exemplo - que levam as pessoas a dar o seu sangue. O prazer de saber que se está a contribuir para salvar vidas sobrepõe-se às regalias que poderão advir desse generoso acto. A opinião foi avançada pela maioria das pessoas escutadas por O MIRANTE na manhã de quinta-feira, 23 de Junho, dia em que este jornal, em parceria com o Grupo de Dadores de Sangue de Pernes, promoveu uma recolha de sangue nas suas instalações em Santarém.
“Não é pelo facto de haver incentivos que as pessoas dão mais ou menos sangue. As pessoas têm de entender que é algo necessário, é uma questão de mentalidade. Dar sem com isso ganhar alguma coisa em troca”, refere Dulce Mota, 39 anos, que foi a primeira pessoa a dar sangue nesse dia. Foi também a primeira vez que deu sangue e não se arrependeu da experiência. Dulce quis continuar o legado do pai que foi muitos anos dador e que, por causa de um problema de saúde, já não pode fazê-lo.
“Dar sangue é uma causa humanitária. Se as pessoas são ou não compensadas por isso acho positivo que assim seja, mas não me parece é que as pessoas devam dar sangue apenas para usufruir dos benefícios”, defende Carina João, 38 anos, engenheira civil. É dadora de sangue mas não faz parte de nenhum grupo. “Dou de forma sistemática nestas campanhas e gosto de responder ao apelo dos que precisam. Os portugueses não são egoístas, somos um povo solidário nestas coisas”, defende.
Gisele Janeiro e Domingos Durães, duas pessoas que foram dar sangue pela primeira vez, têm uma opinião diferente sobre os benefícios. Acreditam que podem ser positivos para motivar mais as pessoas a dar sangue e até nem se importariam de ter uma manhã ou tarde livre depois da dádiva para repor energias.
“Quando fui dar sangue a primeira vez nem fazia ideia que existiam benefícios, só fiquei a saber deles depois. Não é o terem as regalias ou não que faz com que as pessoas dêem sangue. A importância é salvar vidas e isso não nos custa nada. Para mim é um gosto vir aqui e contribuir”, conta António Matos, 51 anos, empresário e presidente da Assembleia Municipal de Azambuja.
Quem também é dador frequente de sangue é Tiago Leite, 45 anos, director distrital da Segurança Social de Santarém. Pertence ao Grupo de Dadores de Pernes. “A regalia que levamos disto é saber que estamos a ajudar alguém. As coisas não devem ser vistas numa lógica da pessoa ir porque tem direito à febra, ao lanche ou a um dia de folga. O incentivo deve ser a importância de ajudar o próximo”, defende.
Carlos Catalão, 54 anos, vogal da União de Freguesias da cidade de Santarém, explica a O MIRANTE que a única coisa que as regalias têm de positivo é “premiar este acto de solidariedade”, mas também acha que não são fundamentais. Jorge Gaspar, jurista, já deu sangue várias vezes e não conhece as regalias porque nunca usufruiu delas. “Não diria que somos um povo egoísta para dar sangue mas antes comodista demais para o fazer”, opina.
Na recolha de sangue de
O MIRANTE participaram também Ricardo Gonçalves, presidente da Câmara de Santarém, e Isaura Morais, presidente da Câmara de Rio Maior, embora ambos não tenham doado. “Os dadores são heróis anónimos e temos a felicidade de sermos o concelho que maior número de grupos tem e onde estão o maior número de dadores. Somos sem dúvida um distrito solidário”, refere Ricardo Gonçalves.
Para Isaura Morais as dádivas de sangue são eventos “da maior importância” que provam a solidariedade das pessoas do distrito. “As regalias concedidas aos dadores de sangue são também o reconhecimento de quem tem na sua génese a benevolência de ajudar o próximo”, conclui.
Quatro dezenas de dadores
A recolha de sangue promovida nas instalações de O MIRANTE pelo jornal e pelo Grupo de Dadores de Sangue de Pernes na manhã de 23 de Junho contou com a presença de quatro dezenas de dadores de toda a região que se quiseram associar ao evento solidário. A recolha contou com a colaboração do Instituto Português do Sangue e da Transplantação, que deslocou uma equipa para o local. Ao todo, o Grupo de Dadores de Sangue de Pernes já conta com 1395 pessoas inscritas, 1019 das quais dadores efectivos.
Nos hospitais portugueses são gastos cerca de mil unidades de sangue todos os dias (cada unidade ronda o meio litro). Praticamente o mesmo que o grupo de Pernes recolhe num ano. “Fazemos mais de 40 colheitas ao longo do ano, o suficiente para saber que, durante um dia inteiro, o nosso sangue abastece todos os hospitais do país”, conta Mário Gomes, responsável do grupo.
Os dadores de Pernes vivem exclusivamente dos apoios que recebem do Instituto Português do Sangue e Transplantação, mas mesmo assim esse dinheiro não chega. “Recebemos 5600 euros e gastamos perto de 12 mil euros por ano, o resto do dinheiro que precisamos angariamos em diversos eventos que vamos fazendo”, explica. Ao todo a associação tem 20 voluntários. Actualmente podem dar sangue todas as pessoas em boas condições de saúde, com peso igual ou superior a 50 quilos e idades compreendidas entre os 18 e os 65 anos.