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O músico da maratona

O músico da maratona

João Raquel dirige duas bandas filarmónicas, toca trompete noutra, é professor, estuda e farta-se de correr. Músico de Benavente tem uma vida agitada mas devidamente organizada. O atleta amador conta que as maratonas surgiram pelo desafio da superação. Este ano já bateu o seu recorde pessoal, mas confessa que é na música que é mais competitivo. Aí, gosta de fazer tudo bem.

O gosto pela música nasceu praticamente com ele e aos nove anos João Raquel entrou na Sociedade Filarmónica Benaventense para nunca mais largar o trompete. “Os meus pais estavam no café e eu subi as escadas da colectividade e disse que queria aprender música. Isto numa altura em que tudo era mais fácil e em que não tinha que se pagar inscrição”, conta, dizendo ter agido “à revelia” dos pais. Na adolescência, admite ter querido sair da música e foi por insistência familiar que concluiu o ensino musical. Hoje, com 39 anos, domina o trompete, seu instrumento de eleição.
Natural e residente em Benavente, aos 15-16 anos João Raquel foi para o conservatório da Academia dos Amadores de Música em Lisboa e aos 19 anos já dava aulas de música aos 5.º e 6.º anos. Entretanto licenciou-se em educação e há um ano que dá aulas ao primeiro ciclo numa escola do Agrupamento de Escolas de Benavente, mas já esteve noutras escolas.
Dá ainda aulas há 16 anos na secção de metais da Sociedade Filarmónica União Samorense (SFUS), banda onde toca trompete, e é maestro da banda da Academia Musical do Lumiar, em Lisboa, e da banda e orquestra juvenil de Óbidos. Como se não bastasse, faz maratonas, na categoria de amador, e ainda arranja tempo para tirar uma licenciatura online em direcção musical de uma universidade de Huelva (Espanha) - está no primeiro ano e já dirigiu bandas espanholas.
“Tento fazer uma gestão do tempo, vejo pouca televisão ou nenhuma e vou sabendo um pouco do que se passa com as notícias que ouço na rádio durante as viagens”, afirma, sublinhando que todas as semanas são diferentes. A actividade que mais o ocupa são as aulas em Benavente e depois tem escalados os ensaios com as três bandas filarmónicas, licenciatura, treinos e concertos.
João Raquel viu a agenda apertar há três anos, quando surgiu o convite para liderar a banda do Lumiar e entrou como maestro em Óbidos após um concurso. “Nunca procurei muito as coisas, elas vão aparecendo”, sublinha.
O músico consegue conciliar toda a sua actividade e refere que as bandas estão em patamares diferentes, sabendo que a de Óbidos, pelo estatuto, é mais exigente e pede mais dedicação: “este ano conseguimos vencer dois prémios no Concurso de bandas do Ateneu Vilafranquense, o prémio tauromaquia e segunda melhor banda na terceira categoria”.
Trompetista de formação, João Raquel já abraçou todos os espectros da música, da clássica à popular, revela já ter tocado ao vivo com o músico Mário Laginha, com a orquestra de Óbidos, e não esconde ter tocado com os cantores Luís Filipe Reis ou Ágata. Também esteve na orquestra de três musicais do encenador Filipe Lá Féria e afirma que todos os projectos lhe dão o mesmo prazer, embora agora se foque mais na direcção musical.

“Na música sou competitivo, na maratona não luto por lugares”
A prova olímpica de 42,195km surgiu há sete anos na vida de João Raquel que praticou andebol no ADCB - Associação Desportiva e Cultural de Benavente até ir para a universidade. Aí chegou aos 96 quilos e o peso não lhe trouxe conforto ao tocar trompete. Ao 22 anos decidiu voltar ao desporto e escolheu as corridas porque lhe permitiam fazer exercício a qualquer hora. “A primeira vez que corri foram apenas 200 metros e ia morrendo”, conta.
Sem desistir, João Raquel começou por provas locais, a primeira foi os 15km de Benavente, e daí a entrar nas meias-maratonas (21km) foi um passo. “A verdade é que fiz tantas meias maratonas que já fazia aquilo com uma perna às costas e o corpo pedia mais”, acrescenta.
Aos 32 anos começou os treinos para fazer uma maratona mas só em 2012 é que afinou os treinos. Entretanto teve uma lesão num pé e a corrida em pista de tartan cansava-o psicologicamente. Mudou-se para a estrada e nesse ano era para fazer a maratona do Porto, “mas o dia era o mesmo do meu casamento e do baptizado do meu filho e para não perder dois meses de treino inscrevi-me na maratona de Nice-Cannes, de França”.
O desejo era fazer cinco minutos por quilómetro, para um total de três horas e trinta minutos, que conseguiu acrescentando 11 segundos à marca, “o tempo dos 195 metros restantes”, diz entre risos. Quando faz as maratonas o músico leva a mulher, e às vezes o filho, e aproveita para conhecer os países. Em 2013 seguiu-se a maratona de Madrid, em 2014 a do Porto, em 2015 fez Praga (República Checa) e Lisboa, e este ano já foi a Sevilha, em Fevereiro, onde colocou o seu recorde pessoal em 3 horas 19 minutos e 42 segundos.
A preparação leva entre dois a três meses e nessa altura “é preciso um grande motivo para me baldar a um treino quer chova canivetes ou faça granizo”, afirma. O atleta apenas colecciona medalhas de participação e diz passar por várias sensações durante as provas: “euforia, desilusão, sentimos que somos uns super-heróis ou que não a conseguimos fazer. Fazemos uma retrospectiva da vida... e é gratificante. Já nos treinos organizo mentalmente o meu dia-a-dia”.
Em Outubro João Raquel irá realizar nova maratona, estando a decidir entre Munique (Alemanha) ou Budapeste (Hungria). “Na música sou competitivo e gosto de fazer tudo bem, alcançar os objectivos. Na maratona não luto por lugares. Faço-o porque gosto do ar livre, sem sofrimento e sem loucuras”, conclui.

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