uma parceria com o Jornal Expresso

Edição Diária >

Edição Semanal >

Assine O Mirante e receba o jornal em casa
31 anos do jornal o Mirante
A leveza de uma conversa a sério sobre assuntos importantes

A leveza de uma conversa a sério sobre assuntos importantes

Presidente Carlos Coutinho de Benavente e Isaura Morais de Rio Maior. A social-democrata Isaura Morais levou a sério a indicação de O MIRANTE e preparou-se para uma conversa leve. O comunista Carlos Coutinho teve engenho e arte para subverter o sugerido e conquistou a sua interlocutora para a discussão de questões “mais substanciais”

Para o presidente da Câmara Municipal de Benavente, Carlos Coutinho (CDU), trabalhar com mulheres é fácil. E se assim não fosse ele teria uma vida complicada uma vez que no executivo municipal há três vereadoras e em casa, para além da esposa, o autarca tem que lidar com três filhas. Já não falando dos animais de companhia que também são todos do sexo feminino. A confissão foi feita no decorrer de mais uma conversa da série “Duetos entre pessoas que tocam habitualmente a mesma música”, organizada por O MIRANTE. A interlocutora de Carlos Coutinho, Isaura Morais (PSD), presidente da Câmara Municipal de Rio Maior diz que também não tem problemas em trabalhar com homens e que sempre se sentiu respeitada com excepção de uma única vez (ver caixa). Mas a declaração de Carlos Coutinho tem um mas. “...com as mulheres as coisas são complicadas quando estão todas juntas. Há ali determinados comportamentos...”.
A disponibilidade das mulheres para a política também não é a mesma, reconhece o autarca. “Há alguns problemas que ainda não estão ultrapassados. Uma das minhas vereadoras é mãe e eu vejo a dificuldade dela em ter a mesma disponibilidade. Tem compromissos com o marido, os filhos...não é fácil”, acrescenta. Tanto Carlos Coutinho como Isaura Morais têm as vidas facilitadas. No caso da presidente da Câmara de Benavente o facto de a esposa, Dora Coutinho, ter deixado de trabalhar para tratar das filhas dá-lhe alguma folga, embora ele goste de ter tempo para a família. Quanto a Isaura Morais, o facto de ser viúva e a única filha ser maior de idade, também lhe dá uma disponibilidade que muitas outras mulheres não têm.
A conversa entre os dois autarcas de partidos diferentes foi animada e cordial mas tirando os primeiros minutos, durante os quais a presidente da Câmara de Rio Maior contou a sua ida à praia de S. Marinho do Porto, centrou-se toda em questões políticas. “Ontem fui ao almoço de uma associação e não corria uma aragem, pensei que me ia dar uma coisa má. Era um almoço solidário. Cozido à portuguesa, ainda por cima. No fim resolvi ir a S. Martinho do Porto. Tinha que ir lá levar umas roupas e pensei ir à praia. Saí de Rio Maior com 36 graus e quando lá cheguei estavam 21 graus. Ainda fui à praia mas tive que me vir embora. Era cá um frio!”. Carlos Coutinho ainda comentou que tinha estado nas Festas do Porto Alto, na hora de maior calor. Depois perguntou se não era melhor começarem. Isaura Morais disse que se tinha preparado para questões ligeiras como lhe tinha sido sugerido por O MIRANTE. O seu colega mostrou ao que vinha. “Eu queria questões mais substanciais”.
A primeira foi sobre o facto do Partido Ecologista Os Verdes (PEV), que integra a coligação CDU pela qual Carlos Coutinho foi eleito, ter tomado posições a favor da limitação da participação de menores de 18 anos nas touradas. Sendo presidente de um município com actividade taurina e com fortes tradições naquela área, Carlos Coutinho teve que usar toda a sua diplomacia para encontrar uma resposta adequada. “Esta nossa região tem uma identidade muito própria, assente nas nossas tradições e nos nossos costumes e a tauromaquia tem aqui um peso muito importante. Eu posso entender algumas posições contra a tauromaquia embora considere que certas organizações são intolerantes mas é evidente que não nos sentimos bem quando uma força política como o Partido Ecologista Os Verdes (PEV), que integra a coligação CDU à qual pertencemos, tem uma posição dessas”, desabafa.
Os dois presidentes de câmara têm opiniões diferentes sobre a lei de limitação de mandatos. Carlos Coutinho é contra e lembra que na Lezíria do Tejo foram impedidos de se recandidatar a maioria dos presidentes de câmara. “Não é por força de uma lei de limitação de mandatos que as pessoas deixam de ser válidas. Grande parte desses autarcas são referências do poder local e com contributos decisivos no processo de desenvolvimento dos seus municípios. Em democracia cumpre ao povo avaliar o desempenho de cada presidente de câmara. É ao povo que é dado o poder supremo de escolher quem quer que o represente”.
Isaura Morais é a favor da lei. “Reconheço o trabalho feito pelos anteriores autarcas, alguns dos quais estiveram quase trinta anos nos cargos mas concordo com a lei de limitação de mandatos. Acho que, a partir de determinada altura, deixa de haver iniciativa e deixa de haver algum sentido mais crítico. É preciso evoluir e muitas vezes mudar as orientações de uma região”. defende.
E vai mais longe. “Se alguns presidentes de câmara que não se puderam recandidatar em 2013 por causa da lei de limitação de mandatos tiverem a tentação de subverter o espírito da lei voltando a candidatar-se, é bom que percebam que a realidade da gestão municipal mudou imenso. Acredito que muitos não se adaptariam às novas limitações e às novas responsabilidades”. Os dois estão de acordo numa coisa. A lei deveria ter abrangido também os deputados.
A necessidade da aprovação de um Estatuto do Dirigente Desportivo, defendido pelo presidente da Câmara de Benavente, a aposta de Rio Maior no desporto com o Centro de Estágios para atletas de Alto Rendimento que lhe permite a obtenção de receitas para apoiar as modalidades amadoras e a incrível história da revisão do PDM (Plano Director Municipal) de Rio Maior que apesar de concluído, ao fim de 16 anos, ainda anda à procura de assinaturas nos gabinetes do Governo, foram outros temas abordados numa conversa séria e “substancial” como pretendia Carlos Coutinho e foi aceite por Isaura Morais.

O mistério do “truz-truz”

Subitamente, sem qualquer explicação, alguém começou a bater à porta de Carlos Coutinho que, na altura era vereador a tempo inteiro, às mais diversas horas da noite e sempre que ele estava ausente...e estava muitas vezes ausente por força da sua actividade política. Quem quer que fosse batia e desaparecia.
A esposa, Dora Coutinho, que estava normalmente em casa com as três filhas do casal, começou a ficar assustada por nunca encontrar ninguém quando abria a porta. Ouvia-se o som do batente, truz...truz...mas não havia ninguém. O autarca também não andava tranquilo.
Certa noite, quando estava numa reunião da assembleia municipal, recebeu um telefonema da mulher a relatar-lhe mais uma ocorrência do “toca e foge”. Decidido a apanhar quem andava a fazer tal coisa e a resolver o assunto de uma vez por todas, ligou de imediato para a GNR e foi para casa.
Os elementos da guarda fizeram uma busca nas imediações, investigaram como puderam mas não chegaram a nenhuma conclusão. O mistério acabaria por ser solucionado e o culpado apanhado em flagrante. Quem batia à porta era uma das gatas do casal que com a pata levantava o batente e o deixava cair, esgueirando-se para longe antes que a dona aparecesse.

Um ditador de gabinete

Por vezes, a caminho de casa, a presidente da Câmara Municipal de Rio Maior faz um desvio para ver a Loja do Cidadão. Segundo explica aquele foi, dos projectos que concretizou, o que lhe deu mais trabalho e aborrecimentos e foi também aquele que lhe deu mais prazer ver concretizado.
O projecto vinha do seu antecessor no cargo. Isaura Morais apostou nele e decidiu que a Loja do Cidadão iria para a parte velha da cidade, contribuindo para a sua revitalização mas encontrou resistências que nunca tinha imaginado encontrar.
Foram quase cinco anos de reuniões, discussões, obstáculos. Na CCDR (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional) enfrentou resistências e aconteceu-lhe o mesmo a nível dos dois governos por onde o projecto passou. No governo de coligação (PSD/CDS-PP) enfrentou dois ministros e dois secretários de Estado. Foi também apanhada em conflitos vários entre entidades do Estado e o Governo. Pessoas da confiança da autarca diziam-lhe para desistir mas ela, que se considera teimosa, nunca se deu por vencida.
Logo numa das primeiras reuniões com um secretário de Estado aconteceu-lhe algo que nunca lhe tinha acontecido nem voltou a acontecer. A certa altura o governante irritado com tanta insistência começou a berrar. Isaura Morais nada disse mas o vereador Nuno Malta que a acompanhava não se conteve e disse ao descontrolado secretário de Estado que não era preciso gritar porque ele e a presidente não eram surdos. Foi pior a emenda que o soneto. O homem deu um violento murro na mesa e declarou solenemente. “Aqui no meu gabinete eu falo como eu quiser”.

A leveza de uma conversa a sério sobre assuntos importantes

Mais Notícias

    A carregar...