Alguns impactos fiscais na atividade agrícola*
Autores: Jorge Pires, Adriano Leitão e Bruno Santos - Técnicos do Grupo Moneris
Atividade agrícola
O setor agrícola apresenta caraterísticas e necessidades muito específicas e tem passado por uma contínua adaptação às novas práticas, novos mercados e novos paradigmas, forçando os agricultores a procurar uma melhoria e uma atualização contínua dos processos produtivos e implementar novas soluções de gestão.
Ainda assim, não existem fórmulas milagrosas para o sucesso do empresário agrícola, mas encontram-se soluções que poderão passar pela melhoria da qualidade da informação de apoio à gestão, pela otimização e adequada estruturação fiscal da atividade, pela gestão dos riscos do negócio e também por um melhor apoio no acesso a soluções de financiamento.
Neste sentido, destacam-se algumas áreas de intervenção tendo em vista a otimização do negócio agrícola.
Enquadramento de uma empresa agrícola em sede IRC
O montante de 200 000 € de rendimentos anuais representa a fronteira entre dois regimes contabilísticos e fiscais bem distintos, ou seja, caso o montante de rendimentos seja superior então cairá obrigatoriamente no regime de contabilidade organizada em que a tributação será efetuada com base no lucro tributável. Ao invés, caso os rendimentos anuais sejam inferiores a 200 000 €, terá a opção de ser tributado pelas regras do regime simplificado de IRC e essa opção deverá ser formalizada na declaração de início de atividade ou em declaração de alterações.
O regime simplificado de tributação em sede de IRC é opcional e poderá assumir-se como uma boa alternativa a ter em conta face à opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável. Releva-se que os sujeitos passivos devem cumprir determinados requisitos adicionais para que seja possível a opção pelo regime simplificado de determinação da matéria coletável.
As empresas que optem pelo regime simplificado, ficam dispensadas da realização de pagamentos especiais por conta e também não ficam sujeitas ao pagamento de tributação autónoma sobre os encargos com despesas de representação; ajudas de custo e compensação pela deslocação em viatura própria; lucros distribuídos por entidade isentas; e bónus e indemnizações pagas a órgãos diretivos.
No regime simplificado a matéria coletável que será sujeita a imposto, obtém-se através da aplicação dos coeficientes constantes artigo 86.º-B do Código do IRC, aplicando-se o coeficiente de 4 % nas vendas de mercadorias e produtos. Contudo a matéria colectável nunca poderá ser inferior a 60 % do valor anual da retribuição mensal mínima garantida, ou seja, 4.678,80 €.
Pedidos de reembolso de IVA nas empresas da atividade agrícola
A partir do ano 2013, com a alteração da tributação em IVA das prestações de serviços agrícolas para a taxa reduzida de 6%, as empresas do setor agrícola depararam-se com uma nova realidade para a qual não estavam eventualmente preparadas.
O empresário agrícola é quase sempre credor do Estado em sede de IVA, uma vez que liquida imposto a uma taxa inferior aquela que deduz nas suas aquisições. A solução para este crédito de IVA passa pelo pedido de reembolso, o que para muitos empresários é uma situação indesejada, algumas vezes por falta de esclarecimento adequado sobre as suas reais implicações.
Releva-se que através do sistema de comunicação da faturação por parte dos contribuintes, a Autoridade Tributária já tem na sua posse, praticamente, todos os elementos que necessita para validar os pedidos de reembolso de IVA. Assim, constitui um erro pensar que ao não efetuar pedidos de reembolso de IVA afasta eventuais fiscalizações por parte da Autoridade Tributária. Com efeito, os sujeitos passivos credores de IVA de valor significativo e que não solicitam o seu reembolso estarão igualmente expostos perante eventuais fiscalizações.
Quando o valor do crédito de IVA seja superior a 250 Euros e se mantenha há mais de 12 meses, o sujeito passivo poderá solicitar o seu reembolso, devendo assegurar que dispõe de uma correta organização contabilística. Se o crédito de IVA for superior a 3.000 €, o sujeito passivo poderá solicitar logo o seu reembolso, independentemente da sua antiguidade.
O reconhecimento e a relevância fiscal dos subsídios na atividade agrícola
No desenvolvimento normal da atividade agrícola, os sujeitos passivos podem solicitar a atribuição de subsídios ao Estado, sendo estes divididos em três grandes grupos:
Subsídios à exploração: são os que tem como objetivo principal cobrir défices de exploração, abate de bens ou compensar a empresa por incorporar determinados gastos.
Subsídios para compensação de preços: onde se inserem as indemnizações compensatórias destinadas a compensar a baixa dos preços de venda, por razões sociais ou derivadas de dificuldades de um setor económico.
Subsídios ao investimento: que se destinam ao investimento direto em ativos produtivos, intangíveis, entre outros.
Os subsídios à exploração e os subsídios para compensação de preços devem ser reconhecidos na contabilidade como rendimento após o seu recebimento, não descorando o cumprimento do regime do acréscimo ou da periodização económica, ou seja, devem ser reconhecidos os rendimentos à medida que determinados gastos decorrentes do contrato estabelecido com a entidade que concedente vão sendo incorridos.
Relativamente aos subsídios que visam financiar a aquisição ativos fixos tangíveis depreciáveis e intangíveis com vida útil definida, o reconhecimento como rendimento é efetuado numa base sistemática durante o tempo de vida útil que foi atribuído ao ativo subsidiado e na proporção das depreciações ou amortizações praticadas.
Quanto aos subsídios que se propõem a financiar a aquisição de ativos fixos tangíveis não depreciáveis ou ativos intangíveis com vida útil indefinida, o valor do subsídio recebido é mantido nos capitais próprios, exceto se a respetiva quantia for necessária para compensar qualquer perda por imparidade ou a atribuição do subsídio prever o cumprimento de certas obrigações, devendo então ser reconhecido como rendimento durante o período em que a empresa tem de suportar os custos para satisfazer o cumprimento de tais obrigações.
O Código do IRC apenas contém um artigo especificamente dedicado aos subsídios (artigo 22.º), que aborda apenas os subsídios relacionados ao investimento em ativos não correntes. Assim, no tratamento fiscal dos restantes tipos de subsídios deve-se ter em consideração o modelo de dependência parcial que determina que, a inexistência de regras próprias no código do IRC, implica que sejam seguidos os princípios de reconhecimento e de tratamento contabilístico decorrentes da aplicação das normas previstas no SNC, nomeadamente a NCRF 22 - Subsídios e Outros Apoios das Entidades Públicas.
Estabelece o artigo 22.º do Código do IRC que os subsídios relacionados com ativos não correntes, no que respeita à sua inclusão na determinação do lucro tributável, existem quatro regras distintas:
a) Se os subsídios respeitarem a ativos depreciáveis ou amortizáveis, então devem ser incluídos, para efeitos de determinação do lucro tributável, na proporção da depreciação ou amortização (com o limite da quota mínima de depreciação ou amortização) calculada sobre o custo de aquisição ou produção.
b) Se os subsídios respeitarem a ativos intangíveis sem vida útil definida, devem ser incluídos, para efeitos de determinação do lucro tributável, em partes iguais durante os primeiros 20 períodos de tributação, seguindo a regra de imputação do custo de aquisição desses ativos, prevista no artigo 45º-A.
c) Se os subsídios respeitarem a propriedades de investimento e ativos biológicos não consumíveis, mensurados pelo modelo do justo valor, devem ser incluídos no lucro tributável, em partes iguais, durante o período de vida útil (desses ativos não correntes) que se deduz da quota mínima de depreciação que seria fiscalmente aceite caso esses ativos permanecessem registados ao custo de aquisição, conforme também previsto no artigo 45º-A.
d) Se os subsídios respeitarem a ativos não depreciáveis ou não amortizáveis, como é o exemplo dos terrenos, devem ser incluídos no lucro tributável, em frações iguais, durante os períodos de tributação em que tais bens sejam inalienáveis nos termos da lei ou do contrato referente à atribuição do subsídio; ou nos restantes casos, durante 10 anos, sendo o primeiro o do reconhecimento do subsídio.
Salienta-se que as regras descritas nas alíneas b) e c) resultam das alterações introduzidas pela Reforma do Código do IRC, ocorrida no exercício de 2014, sendo portanto apenas aplicáveis aos períodos de tributação que se iniciem em, ou após, 1 de janeiro de 2014 e para ativos intangíveis adquiridos em, ou após, essa data.
Golegã, 29 de Março de 2017
* Este texto está escrito de acordo com o novo Acordo Ortográfico