Voluntária de Vila Franca de Xira é a primeira portuguesa a chegar ao Pólo Sul
Maria do Céu da Conceição submete-se a desafios difíceis para angariar dinheiro para pagar os estudos de crianças do Bangladesh. Depois de atingir o cume do Everest e de estar no Pólo Norte superou mais um objectivo e já tem outro no horizonte.
Maria do Céu da Conceição nasceu em Vila Franca de Xira há 40 anos. Aos 20 anos viajou para o Rio de Janeiro onde fez a sua primeira missão de voluntariado nas favelas brasileiras. Diz que não estava preparada para as adversidades que encontrou mas o “bichinho” do voluntariado ficou. Até ao dia em que aterrou pela primeira vez em Dhaka, capital do Bangladesh. Três meses depois já o Dhaka Project dava os primeiros passos. Já escalou o Evereste, tornando-se a primeira portuguesa a atingir o pico mais alto do mundo, e participou em várias maratonas. Aprendeu a nadar e a andar de bicicleta para participar numa prova do Ironman. Agora tornou-se a primeira portuguesa a chegar ao Pólo Sul e pretende escalar por estes dias os 4.892 metros do Monte Vinson, o mais alto da Antártida.
A ribatejana chegou ao Pólo Sul no dia 11 de Janeiro, tornando-se a primeira portuguesa a atingir esse ponto, no âmbito de uma campanha para pagar os estudos de um grupo de crianças bengalis pobres. Após a partida, a 3 de Janeiro, o grupo da portuguesa fez o trajecto de cerca de 111 quilómetros desde o campo de base Union Glacer sob ventos fortes e temperaturas que desceram aos 30 graus negativos. “Foi uma expedição difícil de sete longos dias a puxar equipamento pesado em temperaturas geladas e ventos intensos, exposta às condições atmosféricas 24 horas por dia durante sete dias com apenas as roupas e tendas como abrigo”, refere um relato da sua equipa enviado à agência Lusa.
Maria Conceição, uma antiga assistente de bordo, já tinha sido a primeira portuguesa a chegar ao cume do Evereste, em 2013, dois anos depois de ter caminhado até ao Pólo Norte. Em 2016, somou uma sétima entrada no Livro de Recordes Mundiais do Guinness ao completar seis triatlos Ironman em seis continentes diferentes no mais curto espaço de tempo registado, 56 dias. No ano passado tentou atravessar a nado o Canal da Mancha apenas meses depois de aprender a nadar mas acabou por desistir após sete horas devido à força das correntes.
Em todos estes desafios físicos transporta e exibe a bandeira nacional mas o objectivo principal é divulgar o trabalho da Fundação Maria Cristina (FMC) que criou em 2005 para ajudar crianças bengalis pobres. “A Maria faz isso para mostrar que está determinada em garantir que as suas crianças no Bangladesh completem os estudos - para cumprir a promessa que fez às crianças, às suas famílias e aos muitos doadores que apoiaram a FMC”, refere a nota enviada à Lusa.
Até agora, a campanha de angariação de fundos na Internet “Maria goes to South Pole” recolheu cerca de 1.400 euros. Maria Conceição tem como objectivo angariar dinheiro que pague as propinas e refeições de 40 das 124 crianças que tem a cargo para começarem as aulas este mês numa escola em Dhaka. A meta final é conseguir 318 mil dólares (265 mil euros) que vão assegurar que todas as crianças no programa da FMC chegam ao fim dos seus estudos.
Ajudar crianças pobres é a sua missão de vida
Em entrevista a O MIRANTE (ver edição 10 Fevereiro 2010) Maria Conceição contava que no Bangladesh os filhos são uma fonte de rendimento para os pais. Começam a trabalhar aos quatro anos na construção civil para ajudarem a pagar as contas e colocarem comida na mesa. “É um choque muito violento chegar a Dhaka (capital do Bangladesh) e depararmo-nos com uma realidade tão diferente da nossa onde as crianças não têm tempo de brincar nem de serem livres”, afirmava.
O MIRANTE entrevistou Maria Conceição depois desta ter sido distinguida com o prémio de Mulher do Ano atribuído pela revista Emirates Woman Magazine, sendo a primeira mulher estrangeira a vencer um prémio votado exclusivamente por países árabes.
O Dhaka Project é uma missão de vida para a antiga comissária de bordo da Emirates Airlines do Dubai, que criou esta Organização Não Governamental (ONG) há cerca de 13 anos. O Dhaka Project dá apoio a mais de 650 crianças e jovens entre os seis meses e os 16 anos de idade. A partir dos seis anos as crianças começam a estudar na escola criada por Maria da Conceição. Convencer os pais a deixar os filhos frequentar a escola é a tarefa mais complicada para a mentora do projecto.
A antiga comissária de bordo nasceu em Vila Franca de Xira onde viveu até aos dois anos de idade, altura em que se mudou com a família para Avanca, distrito de Aveiro. Decidiu começar a trabalhar aos 18 anos. Convicta de que em Portugal não conseguiria um bom emprego rumou a Inglaterra onde trabalhou no ramo da hotelaria. Um dia surgiu a oportunidade no mundo da aviação e não pensou duas vezes.
Maria da Conceição não sabe se algum dia voltará definitivamente para Portugal. Pensaria regressar se fosse para desenvolver um trabalho humanitário. Que seria diferente daquele que faz actualmente em Dhaka. “Em Portugal trabalharia com pessoas idosas. Foram pessoas que trabalharam tanto durante uma vida inteira e chegam à última etapa da vida e são abandonadas à sua sorte”, afirmava na entrevista a O MIRANTE.