Novas escavações para desvendar origens do castro de Vila Nova de São Pedro
Proprietária do terreno onde se encontra o sítio arqueológico está em negociações com a Câmara de Azambuja para o seu arrendamento. A intenção da autarquia é valorizar aquele património que remonta ao terceiro milénio antes de Cristo.
A segunda campanha de escavações arqueológicas no castro de Vila Nova de São Pedro, concelho de Azambuja, encontra-se a decorrer até 27 de Julho e abre novas áreas de escavação com vista à datação precisa do sítio arqueológico, que se julga ter tido origem cerca de três mil anos antes de Cristo.
A campanha em curso tem como objectivos fundamentais “limpar o mato que foi cobrindo as muralhas de pedra para que se possa registar o local e ao mesmo tempo abrir novas áreas de escavação”, explicou Mariana Diniz, professora na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e dirigente dos trabalhos.
Através de edificações e materiais descobertos em campanhas anteriores conclui-se que o povo que ali habitou era “auto-suficiente do ponto de vista da água”, provando-o a presença de uma cisterna no interior de uma das muralhas, com terra húmida e uma zona de mina. Segundo Mariana Diniz, quem ali viveu foi uma comunidade próspera do ponto de vista agrícola e da pastorícia. Há também testemunhos de que se enquadram na primeira fase em que o homem começa a trabalhar os metais, através de vestígios de pingos de fundição de cobre.
Apesar das várias campanhas de escavações, o mistério em torno do castro de Vila Nova de São Pedro continua por desvendar. Sabe-se que se trata de um povoado do período Calcolítico, que ocupou aquelas terras no terceiro milénio antes de Cristo. Pensa-se que foram “momentos de grande instabilidade e conflitos sociais” que levou este povoado a construir as várias linhas de muralhas, para dificultar o acesso a outras comunidades. De acordo com a professora, construir fortificações era típico de comunidades do Mediterrâneo, o que significa que a comunidade do castro de Vila Nova estava “em rede com comunidades do Mediterrâneo”.
Os trabalhos em curso são dirigidos por uma equipa de arqueólogos da Associação dos Arqueólogos Portugueses e da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (FLUL), com a colaboração de 17 alunos do curso de Arqueologia da FLUL e da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa, com o apoio da Câmara de Azambuja e da União de Freguesias de Manique do Intendente, Vila Nova de São Pedro e Maçussa. A primeira campanha do projecto realizou-se em 2017, ao longo de três semanas.
Proprietária recusa-se a vender o terreno
Maria Lila Ferreira Botelho, 68 anos, natural de Vila Nova de São Pedro, herdou o terreno dos pais e recusa-se a vendê-lo, por promessa que fez à sua mãe Felismina Ferreira. A área corresponde à parcela onde se encontram as estruturas edificadas que comprovam a existência do povoado do período Calcolítico.
“A época antiga foi difícil de atravessar e ela [Felismina Ferreira, sua mãe] nunca quis vender o terreno, porque o tinha herdado da mãe [avó de Maria Lila]. Já na altura lhe fizeram a proposta para venda e ela nunca aceitou”, explica Maria Lila, que prometeu à sua mãe que também não venderia o terreno. “Aos meus filhos não vou pedir o mesmo”, continua.
O MIRANTE noticiou em Maio passado que a Câmara Municipal de Azambuja já tentou, por diversas vezes, avançar para a aquisição e conservação do terreno onde se situa o castro, mas até à data não conseguiu chegar a acordo com a proprietária. Situação que levou o presidente da câmara, Luís de Sousa (PS), a equacionar a expropriação do terreno, usando a figura da declaração de utilidade pública, caso a proprietária mantenha a sua posição. O autarca falou nessa possibilidade durante a sessão da Assembleia Municipal de Azambuja de Maio.
A câmara tem intenção de adquirir mais duas parcelas de terreno junto ao sítio e os dois proprietários mostraram-se receptivos à proposta. António Matos (PS), vereador da cultura, informou na última reunião de câmara que no que respeita à propriedade de Maria Lila, para já, o acordo vai passar pelo arrendamento do terreno. A proprietária confirma que decorrem negociações para o efeito. “Sou natural daqui e quero que a freguesia tenha êxito”, justifica.
Relações com o norte de África
O tenente-coronel do Exército Português e arqueólogo conceituado, Manuel Afonso do Paço, realizou uma série de campanhas ao longo dos anos 30 e 60 do século XX, pondo a descoberto parte das estruturas que hoje ali podem ser vistas. A recolha de material em marfim, durante as escavações lideradas pelo tenente-coronel, permite concluir que a comunidade tinha relações com o norte de África. No entanto, conclui Mariana Diniz, “a informação não é suficiente para os padrões e perguntas que hoje temos. Continuamos sem ter datações absolutas para o sítio, porque as amostras não tinham uma origem certa”.