Última sexta-feira do mês é dia de carrilhão em Constância
Aula pública conduzida por Ana Elias tem mais afluência nos meses de Verão.
O som dos sinos ecoa por toda a vila de Constância. São 15h00 de sexta-feira, 25 de Janeiro, e o sol da tarde de Inverno convida ao passeio pela zona ribeirinha. Ao contrário do que alguns transeuntes pensam, não se trata do repique dos sinos da igreja. É o carrilhão itinerante LVSITANUS que saiu à rua como faz todas as últimas sextas-feiras de cada mês.
Junto ao Anfiteatro dos Rios já está estacionado o grande camião que transporta o conjunto de sinos que é também instrumento musical e é Adriana Martins quem produz os primeiros acordes na aula pública conduzida por Ana Elias. Adriana tem 17 anos e estuda carrilhão há quatro. Durante a semana pratica na escola de música de Constância, num teclado de estudo, mas são as aulas no carrilhão a sério que lhe dão maior gozo. “Adoro tocar aqui. A primeira vez que o fiz coincidiu com o meu dia de aniversário, nunca vou esquecer”, conta Adriana a O MIRANTE.
O pequeno João, de cinco anos, é um dos alunos que não faltam à aula pública. Vem com a mãe Alzira Garcia, de Praia do Ribatejo, que nos revela a fixação do filho desde tenra idade pelo som dos sinos. Teve aulas de canto em Montalvo, mas não era aquilo que queria. Um dia, em passeio por Constância, ouviram os sinos e não descansaram enquanto não descobriram do que se tratava. “Logo nessa semana começou a frequentar as aulas de carrilhão com Ana Elias, onde o João tem um sino só seu”, conta-nos a mãe orgulhosa.
O João vai distribuindo gomas pela assistência enquanto aguarda a sua vez de tocar. Há cerca de uma dezena de curiosos que ora se sentam para apreciar a música ora se levantam para ver de perto o conjunto de sinos de onde ela sai. Helena, do Entroncamento, é uma dessas curiosas, viu a notícia de que haveria aula pública na sexta-feira e não quis perder a oportunidade de ver e ouvir de perto.
Alberto Elias, pai da carrilhanista e professora Ana Elias, mentor do LVSITANVS e presidente da CICO - Centro Internacional do Carrilhão e do Órgão, explica a Helena, com visível agrado, cada pormenor da sua obra. Uma das suas missões é divulgar a arte a todos os curiosos que ali se juntam e que normalmente nos meses de Verão são em maior número. É também ele, ou a filha Ana, quem conduz o camião que transporta o LVSITANVS e que, quando não está em funções, fica estacionado num espaço cedido graciosamente pela Base Aérea de Tancos.
O sol já ia baixo no horizonte quando Sara Elias se juntou a Ana para tocar a anunciada peça em homenagem ao polaco Pawel Adamowicz, presidente de Gdansk, assassinado em Janeiro. Pawel era um apoiante da arte do carrilhão e foi o responsável pela aquisição de três carrilhões para aquela cidade polaca. Sara, irmã mais nova de Ana, trabalha no Canadá e está em Portugal de passagem. Afastada fisicamente do carrilhão, quando está em Portugal não perde uma oportunidade de tocar.
A 22 de Fevereiro, o carrilhão volta ao Anfiteatro dos Rios para encher de música as ruas de Constância. Até lá Ana, que vive em Constância, continua a dar aulas de carrilhão duas vezes por semana a sete alunos.
Uma família dedicada a uma paixão
Ana Elias estudou música no Instituto Gregoriano de Lisboa, onde, aos 16 anos se inscreveu num curso livre de carrilhão. Um dia, numa visita de estudo a Mafra apaixonou-se pelo carrilhão. Foi convidada a ir estudar para a Bélgica, onde fez três anos de bacharelato e quatro anos de mestrado com agregação ao ensino na vertente carrilhão.
Para o mestrado, sobre o carrilhão de Mafra, era necessário entregar os desenhos do mesmo e é aqui que entra em cena o pai, Alberto Elias, engenheiro mecânico de formação. Fez os desenhos e tomou-lhe o gosto sendo ele o criador do itinerante LVSITANVS e do carrilhão da Igreja dos Pastorinhos, em Alverca, onde reside.
Sara Elias, a filha mais nova, acompanhava a irmã às aulas de carrilhão. Levava o caderno de matemática para fazer os trabalhos de casa, mas o apelo do carrilhão era mais forte. Ana foi mãe há nove meses e Alberto já ofereceu uma marimba à neta. “Quis dar-lhe um instrumento a sério, não quero que ela estrague o ouvido”, diz o avô.
Uma história que pode dar um filme
No local esteve uma equipa da produtora de vídeo Até ao Fim do Mundo. Realizador, sonoplasta e operador de câmara acompanham a família Elias desde 2017. O objectivo, conta-nos Pedro Ramalho, realizador, é fazer um filme documental que deve entrar no circuito internacional e ser exibido em diversas salas de cinema. “A história desta família e do seu envolvimento com o carrilhão é tão sui generis que pensámos que merecia ser contada”, afirma Pedro Ramalho.
LVSITANVS pode actuar a pedido
O carrilhão itinerante é composto por 63 sinos, pesa 12 toneladas e mede seis metros de comprimento por três de altura. O LVSITANVS está disponível para actuar em festas populares, feiras medievais, conferências, casamentos, aniversários, ou outros eventos ao ar livre ou em grandes pavilhões. O reportório pode ir das músicas eruditas à música popular, passando pelo rock ou peças temáticas.