Os professores perderam autoridade e os alunos fazem o que querem
Maria de Fátima Alves, Manuel Assunção e Maria Helena Fernandes são três dos sete professores e educadores aposentados que a Câmara de Alcanena escolheu distinguir com a medalha de mérito nos 105 anos da fundação do concelho. Dizem que, desde que iniciaram a carreira registaram-se mudanças substanciais tanto no ensino como na forma de estar dos alunos.
Maria de Fátima Alves, Manuel Assunção e Maria Helena Fernandes já não são do tempo em que se davam reguadas aos alunos na escola mas, de vez em quando, dizem que recorreram à técnica do castigo para colocar o aluno a pensar no que fez. Confessam ainda que chegaram a receber galinhas, pão, azeite, queijo e camisolas de lã como prendas, no início da sua carreira, e que hoje em dia os alunos têm falta de princípios e do sentido de família.
A educadora de infância e os dois professores de matemática e de físico-química são três dos sete docentes aposentados que a Câmara de Alcanena escolheu distinguir com a medalha de mérito – grau prata, nos 105 anos da fundação do concelho. Uma cerimónia que decorreu no dia 8 de Maio, na sede do município. O MIRANTE esteve à conversa com os docentes e foi conhecer algumas das suas histórias.
Manuel Assunção foi o único homem a receber a medalha de mérito do município. O professor de Matemática e Ciências da Natureza aposentado admite já ter saudades de leccionar, apesar de acreditar que saiu na altura certa. “Neste momento os professores perderam a autoridade para com os alunos e eles agora fazem o que querem”, refere. O professor, que leccionou durante 28 anos na Escola Secundária de Alcanena e coordenou os cursos nocturnos nesse estabelecimento, diz que nunca lhe tinham oferecido nada até há uns anos. Um emigrante ofereceu-lhe um presente que nem teve oportunidade de recusar.
Muitas reuniões e papelada
Maria de Fátima Alves esteve ligada ao pré-escolar mais de duas décadas e meia. No concelho de Alcanena exerceu funções no Jardim-de-Infância do Espinheiro e no Jardim-de-Infância de Monsanto. Aposentou-se antes de tempo, aos 61 anos, depois de lhe ser diagnosticado blefaroespasmo agudo, uma doença rara que causa espasmos musculares involuntários, que no seu caso afecta as pálpebras.
A educadora de infância reformada, que escolheu a profissão por vocação, diz que, neste momento, o maior problema que os profissionais que trabalham no pré-escolar enfrentam é o excesso de burocracia. “São reuniões, papéis, relatórios para fazer e depois aquela parte boa de estar com as crianças fica sempre um pouco mais colocada de lado”, adianta a O MIRANTE, recordando que teve muitas crianças que a marcaram, não tanto por serem rebeldes mas pela sua vida familiar. “As crianças, muitas vezes, apercebiam-se de situações que não deviam e isso marca”, adianta a educadora que nunca aplicou reguadas e chegou a receber pão, azeite e queijo dos alunos.
“Hoje os alunos têm falta de valores”
Também Maria Helena Fernandes contou com vários alunos que a marcaram pela especial ligação estabelecida. A ex-formadora do Centro de Novas Oportunidades da Escola Secundária de Alcanena admite que ainda não se habituou à reforma e continua a acordar às 06h30 como fazia antigamente. Conta ainda que o pior que os alunos já lhe chamaram foi ‘velha’ e confessa que, apesar de ter sido sempre muito exigente, foi presenteada pelos pais dos alunos com galinhas e até com camisolas de lã.
Para Maria Helena Fernandes, existem grandes diferenças no ensino e nos alunos desde que iniciou carreira até à actualidade. A maior, aponta, é a relação entre professor e aluno. Enquanto os alunos antigos fazem uma festa quando a vêem, com os mais jovens não acontece o mesmo. “Hoje os alunos têm falta de valores e de família”, defende a professora aposentada.