Banda do Centro Cultural Azambujense é a escola de música do povo
Dirigida pelo maestro Luís Balão, a filarmónica é um berçário de músicos, onde cabem os mais variados estilos musicais. Do rock ao funk, passando pelo pasodoble, toca-se um pouco de tudo.
Francisco Carniça tem 74 anos e é músico desde os 11. Sentado numa cadeira à porta do Centro Cultural Azambujense aguarda pelo início de mais um ensaio da banda, rotina que mantém há 21 anos, duas vezes por semana.
Lembra-se de ser miúdo e de a música ser o seu principal entretenimento. Começou por pertencer à Filarmónica de Vale da Pinta, do Cartaxo, cidade de onde é natural e passou pela Filarmónica Ereirense, até chegar à Banda do Centro Cultural Azambujense. “Antigamente não havia tantas distracções como agora e éramos incentivados pelos nossos pais a pertencer às filarmónicas. Agora não é assim. Os mais novos têm tantas coisas com que se entreter que deixou de ser apelativo vir para a banda”, diz o saxofonista. O maestro Luís Balão, concorda: “A música virou parente pobre na educação das crianças. Têm tantas actividades por onde escolher que esta deixou de os cativar”.
A contrariar a tendência estão os 42 elementos que compõem a Banda do Centro Cultural Azambujense, com idades que vão dos cinco aos 80 anos. E onde há estudantes, professores, carteiros, agricultores, soldadores, engenheiros e historiadores. “Temos um pouco de tudo e de todas as idades, o que considero extremamente positivo quer para a música, quer para a relação familiar que existe na banda”, diz o maestro que tem na banda os seus pais e as duas filhas.
Combate ao preconceito musical
E desengane-se quem achar que ali só se toca música popular. “Numa filarmónica cabe todo o tipo de música, desde o rock, jazz, metal, funk, à música cabo-verdiana. Temos músicos que tocam em bandas de animação de rua, bandas de música pop e em bandas de garagem”, diz.
O que existe é um preconceito em relação às filarmónicas. “Quem não conhece o trabalho destas bandas acha que são caretas. Cabe-nos a nós, mudar essa visão, e para isso há que tocar bem e inovar no repertório”, acrescenta o maestro que todos os anos introduz músicas novas para “motivar a banda e captar a atenção do público”.
Para o jovem músico de 26 anos, Bruno Brito, são os arranjos que fogem à norma que cativam os mais novos, mas “para os mais velhos é difícil a adaptação”. Estudante de doutoramento em História Moderna e Contemporânea, estreou-se na Filarmónica de Aveiras de Cima aos 11 anos por iniciativa própria, e desde 2013 que toca percussão e baixo eléctrico na Banda Azambujense. “Para mim a música funciona como uma terapia, não vivo sem ela”, diz o músico que também toca em bandas de rock e funk.
Desta banda nascem com frequência projectos que põem à prova os seus músicos. “Na Feira de Maio deste ano abrimos o concerto da Aurea, numa actuação conjunta com os Mr Fortez Trio Plus, e perante um público com milhares de pessoas. Abrimos com um pasodoble, mas depois seguiu-se muita música cabo-verdiana, para mostrarmos que enquanto grupo de sopros e percussão não servimos só para tocar em desfiles e corridas de toiros, isso para nós é chapa cinco”, afirma o maestro.
Preocupados com a falta de alunos
O Centro Cultural Azambujense celebrou este ano o seu 118º aniversário, com a música a ser o seu foco principal. Para além da banda, têm uma escola de música, onde se aprende a tocar instrumentos de sopro, cordas e percussão. “No fundo a escola deveria trabalhar para a banda, uma vez que os alunos que têm intenção de se juntar a nós têm formação musical e aprendem a tocar um instrumento de forma gratuita”, explica. O problema é que a adesão é fraca. “Em dez alunos que entram para a escola de música, apenas dois vêm para a banda”, lamenta.
Luís Balão salienta que a fraca adesão está relacionada com “o nível cultural do país”, onde a população não está “enraizada com a música”. Neste processo tem a sua dose de culpa o ensino português que desvirtuou o ensino musical, considera o maestro que vive “preocupado com a falta de alunos”. Em média entram apenas três alunos por ano. Não é um número que satisfaça. “Tem sido uma luta difícil, mas é nas dificuldades que se vê o que a união da Banda consegue fazer. Sei que vamos sobreviver, continuar a lutar e construir aos poucos um futuro melhor”, conclui.
Apoios e cachês são os mínimos
A aposta de realizar vários concertos ao longo do ano é uma forma de a banda se promover, mas é também a única de conseguir algum financiamento por parte da autarquia. “Agora as autarquias têm de justificar cada cêntimo que dão de apoio e para receberemos a nossa parte temos de apresentar um plano anual de actividades”, diz o maestro que deixa um lamento: “Somos a escola de música do povo que ensina de forma gratuita, mas depois os apoios que nos dão são os mínimos. Uma autarquia é capaz de pagar 12 mil euros a um artista, ou 400 a um DJ para passar duas horas de música, e a nós pagam 120 euros para fazer um desfile”.