Ex-director do urbanismo da Câmara de Santarém nega ter favorecido a filha
António Duarte começou a ser julgado no Tribunal de Santarém, num processo em que é acusado de três crimes de abuso de poder e um crime de recebimento indevido de vantagens.
O ex-director do urbanismo da Câmara de Santarém admitiu em tribunal ter participado em processos que envolviam o gabinete de arquitectura da filha, mas assegurou que o fez apenas em actos administrativos e nunca no processo decisório.
António Duarte começou a ser julgado pelo Tribunal de Santarém, no dia 18 de Junho, num processo em que é acusado de três crimes de abuso de poder e um crime de recebimento indevido de vantagens, por alegadamente ter feito depender o andamento de processos da contratação do gabinete de arquitectura da filha ou da concessão de apoios a um centro social que dirigia.
Convidado em 2006 pelo antigo presidente da Câmara de Santarém, Francisco Moita Flores, para trabalhar inicialmente como seu consultor, António Duarte passou a dirigir o Departamento de Planeamento e Gestão Urbanística (DPGU) em Novembro de 2009, onde permaneceu até Dezembro de 2011, altura em que foi constituído arguido neste processo.
O arquitecto negou alguma vez ter feito depender o andamento de processos quer da contratação do gabinete da filha quer da entrega de donativos para o Centro Social, Recreativo e Cultural de Vila Verde (Alijó), que dirigiu entre 2008 e 2012.
Colegas e inimigos
Questionado pela juiz presidente sobre o que explica as denúncias anónimas que estão na origem do processo, o arguido fez referência a situações menos claras, acabando por afirmar, quando confrontado pela Procuradora do Ministério Público com documentos encontrados numa sala do seu departamento situada no sótão, que “alguém andou afanosamente a reunir dados” para o levar à situação em que se encontra.
António Duarte admitiu que tinha inimizades no seio do seu departamento, apontando em concreto dois arquitectos que a sua antecessora teria “aconselhado” para assumirem a direcção e a chefia do DPGU, tendo demitido o primeiro de chefe de divisão e vindo a saber que o segundo tinha feito 4.000 cópias de processos alguns meses antes de saber que estava a ser investigado.
Sobre os projectos desenvolvidos pela filha no concelho de Santarém, sensivelmente a partir da sua entrada para o município como consultor do presidente, o arguido afirmou não conseguir explicar, num dos casos, como acabou entregue ao gabinete de arquitectura daquela, noutro disse ter ocorrido porque o promotor é seu amigo de longa data e sabia que ela é arquitecta e que noutros era o próprio Moita Flores a dizer que “ele até tem uma filha arquitecta que pode resolver”.
Empreiteiros de Santarém ajudaram instituição de Alijó
António Duarte procurou ainda explicar as circunstâncias em que dois promotores imobiliários de Santarém deram donativos para o centro social de Alijó, explicando que um deles, no valor de 5.000 euros, ocorreu na sequência de um desabafo feito durante uma reunião em que o empreiteiro estava presente, depois de ter recebido um telefonema dando conta da suspensão do fornecimento de frutas e legumes.
O outro donativo foi feito pelo empresário de quem já era amigo e que aceitou assumir o pagamento trimestral da verba que permitia à instituição apoiar uma família que havia sido encaminhada pela Segurança Social, disse, acrescentando que as transferências cessaram quando a família deixou de ser apoiada e não com a sua saída do município como refere a acusação.
Afirmando que a instituição se situa numa zona muito pobre do concelho, onde apenas existe uma fábrica que dá algum apoio, o arquitecto assumiu que pedia donativos para angariar fundos, assegurando que de todos era emitido recibo.
O tribunal ouviu ainda o testemunho de João Leite, vereador com o pelouro do urbanismo entre 2009 e 2013, que referiu ter começado a haver, no final de 2010, “ruído de corredor” sobre alegadas situações menos claras, como ligações ao gabinete da filha de António Duarte e sobre uma instituição de que este era dirigente, mas sempre suposições muito genéricas.