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Projecto Mira-Minde quer valorizar um território que já não vive da indústria
Movimento cívico quer dar nova vida ao polje entre Mira de Aire e Minde

Projecto Mira-Minde quer valorizar um território que já não vive da indústria

Transformar o vale comum aos territórios de Minde e Mira de Aire num lugar com mais vida e mais atractivo é o objectivo do projecto Mira-Minde dinamizado por um grupo de cidadãos de ambas as localidades. O MIRANTE esteve à conversa com Miguel Tristão, arquitecto de Mira de Aire e um dos dinamizadores do projecto.

A fase de pujança da indústria têxtil tirou as pessoas do campo, mas desde que entrou em declínio deixou um vazio na economia das localidades de Minde e Mira de Aire. A população envelheceu e os jovens vão estudar para fora e não regressam. Perdeu-se a tradição do cultivo das terras. É a este cenário negro que o projecto Mira-Minde quer dar algum colorido, ressuscitando o polje (depressão fechada, de fundo chato, no relevo cársico), um território “magnífico e cheio de potencialidades, que une as duas localidades e do qual ninguém cuida”, desabafa o arquitecto Miguel Tristão, um dos dinamizadores do movimento cívico Mira-Minde.
Apesar da agravante de fazer parte de dois concelhos e dois distritos diferentes – Mira de Aire é concelho de Porto de Mós, distrito de Leiria, e Minde pertence ao concelho de Alcanena, distrito de Santarém – o que se pretende fazer não é unir os territórios administrativamente, mas sim pôr as pessoas a pensar que há ali uma riqueza comum que pode ser valorizada.
Inserido na área do Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros (PNSAC) há 40 anos, desde a sua criação, o sentimento comum é de que este se tornou um entrave ao desenvolvimento da região, impondo as suas restrições por exemplo em termos de construção. Para o movimento Mira-Minde a questão não se prende com as restrições impostas pelo PNSAC, mas sim com o abandono generalizado da região.
“Estamos num momento histórico em que temos que dar o salto para uma existência mais sustentável e mais ecológica. A actividade industrial foi o motor da terra, mas desapareceu. Temos que seguir em frente e valorizar o vale” refere Miguel, acrescentando que por vezes é preciso dar uma pedrada no charco para acordar. “A qualidade de vida é óptima, não há violência, não há stress, não há muita poluição… como é que podemos atrair pessoas para virem para cá”, questiona o arquitecto.
Para encontrar resposta a esta questão o movimento Mira-Minde criou um portal na internet (https://mira-minde.pt/), onde aceita contributos, e tem dinamizado encontros como tertúlias. A primeira realizou-se em Mira de Aire, a 3 de Maio, e reuniu cerca de uma centena de interessados, entre os quais os presidentes de ambas as juntas de freguesia e a directora do PNSAC.
No final de Maio a tertúlia teve lugar em Minde, na Fábrica da Cultura, e foi pedido que os participantes contribuíssem com ideias concretas. Foram apresentadas ideias como a organização de workshops de permacultura e de construção sustentável, mas o enfoque foi dado ao cuidado, conservação e valorização do território. Limpar caminhos e lagoas, valorizá-los e identificá-los, é um dos objectivos.
Assim como reavivar as histórias populares a eles associadas. “Algumas são bastante interessantes como a de um depósito de água que se diz ter sido construído pelo filho de um taberneiro para ajudar o pai, que passou a vida toda a pôr água no vinho”, conta Miguel lembrando a urgência de ouvir a geração de pessoas que ainda se lembra ou que vivenciou estas histórias, sob pena de as perder para sempre.
Actualmente o movimento cívico é constituído por cerca de meia centena de pessoas. Um grupo heterogéneo que vai do reformado ao jovem universitário. “Até onde vamos, que mudanças vamos conseguir fazer não sei. Só sei que é preciso agir e espero daqui a uns anos ter uma história bonita para contar” desabafa o ‘agitador’.

Caminhos históricos

Um dos objectivos do movimento cívico Mira-Minde é recuperar e identificar os caminhos que estão ao abandono. Trata-se de caminhos históricos como o Caminho Real, que conduzia a Alvados pelo maciço calcário; o Caminho da Mala-posta, por onde chegava o correio, numa diagonal que sobe a serra de uma ponta à outra; ou, por exemplo, o caminho que unia a Capela de São Sebastião à capela de Nossa Senhora da Boa Morte, o único que consta de um mapa datado de 1866.

Rivalidade histórica

Mirenses e mindericos têm uma rivalidade histórica. Até 1709, Mira de Aire fazia parte da freguesia de Minde, depois emancipou-se como freguesia, mas continuou a fazer parte do concelho de Alcanena. Em finais do século XIX o concelho de Porto de Mós foi extinto e quando se formou novamente, Mira de Aire integrou-o. O desenvolvimento industrial colocou estas duas freguesias do maciço calcário, actualmente com pouco mais de sete mil habitantes, em competição.
“A sensação que temos quando falamos com um mindense ou com um minderico é de que somos iguais, mas habituámo-nos durante anos a afirmar e alimentar a diferença. Temos um território em comum e é uma estupidez estarmos de costas voltadas”, afirma Miguel Tristão.
De qualquer modo, e para não ferir susceptibilidades de parte a parte, todas as acções do projecto Mira-Minde feitas em Minde têm reflexo em Mira e vice-versa, naquilo a que Miguel chama de pingue-pongue.

Projecto Mira-Minde quer valorizar um território que já não vive da indústria

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