Ficar com os pés em ferida por devoção à Nossa Senhora do Castelo
Muitos devotos continuam a manter a tradição, por promessa ou por mero agradecimento à padroeira de Coruche, num sacrifício que dura três horas.
Os pés doem, alguns até ficam em ferida, mas muitos fiéis continuam, ano após ano, a caminhar descalços durante três horas na procissão de Nossa Senhora do Castelo em Coruche. A procissão saiu à rua na quinta-feira, 15 de Agosto, feriado em honra de Nossa Senhora da Assunção. Uma tradição que já se realiza há mais de 500 anos em Coruche, numa manifestação religiosa que atrai milhares de visitantes à vila.
Há quem faça caminhadas um tempo antes para se preparar. Quem não o faz confessa que custa mais aguentar o percurso, como acontece com Natalina Ribeiro, 46 anos, que aguenta as dores pela fé. “Quando se tem vontade aguenta-se tudo”, vai dizendo enquanto caminha com as unhas pintadas e pés de quem vai à pedicure. Sofia Ferreira, que começou a fazer a procissão descalça com 27 anos, já lá vai uma década, para pagar uma promessa, nunca chegou a ficar com os pés em ferida talvez porque costuma fazer caminhadas para estar em forma no 15 de Agosto.
Bruno Silva, 41 anos, é dos poucos homens que faz questão de fazer a procissão sem calçado, já lá vão dez anos. Começou a fazê-lo quando o seu filho nasceu e fá-lo exclusivamente por agradecimento. Outros fazem-no para pagar promessas à Senhora do Castelo, como foi o caso de Sofia Ferreira, que continua a caminhar descalça como forma de agradecimento por tudo o que tem na vida. Sofia lembra-se de em criança acompanhar a avó e a mãe na procissão e agora leva o filho para lhe incutir a tradição. “Tentamos sempre incutir nos nossos filhos esta tradição para que se mantenha. É importante para todos”, confidencia.
Natalina Ribeiro fez a procissão descalça pelo sétimo ano por mero agradecimento à santa padroeira de Coruche e diz que se consegue superar o esforço e as dores quando se caminha por gosto. O que mais lhe custa não é a extensão do percurso e o tempo que demora, mas o facto de acabar a caminhada com os pés todos negros, confessando também que as pernas não estão habituadas a fazer tantos quilómetros. “Tenho pouco tempo de preparação e depois custa sempre um pouco, mas a vontade é tanta que ultrapassa tudo”, diz a devota da santa padroeira de Coruche.
Bruno Silva, garante que ao longo destes anos todos nunca pensou em desistir por dores ou por ficar com os pés em ferida. “Normalmente, não coloco nenhum produto”, salienta. No dia da procissão estava calor e o alcatrão quase queimava. Mas para Bruno se chovesse era pior porque faria mais feridas nos pés.